O indiciamento do cardeal australiano George Pell, acusado de abuso sexual de menores, foi comemorado pelas vítimas e representa um duro golpe à Cúria, onde o religioso, apesar da suspeita de envolvimento com escândalos, gozava de plena confiança do Papa Francisco. Admirado pela ala tradicionalista da Igreja, o chefe de Finanças do Vaticano alegou inocência ontem, mas, para especialistas, dificilmente voltará a ter um papel proeminente na cúpula católica.

[img align=left width=300]http://news.portalbraganca.com.br/wp-content/uploads/2017/06/Cardeal-australiano-George-Pell.jpg[/img]Em uma declaração forte de apoio, o Vaticano disse que a equipe de Pell continuaria o trabalho do cardeal na sua ausência e observou o respeito do Papa em relação à honestidade do australiano e a sua dedicação enérgica à reforma financeira da Igreja.

— Estou ansioso para finalmente ter o meu dia no tribunal — declarou Pell, em uma entrevista coletiva. — As acusações são falsas. A ideia de abuso sexual é abominável para mim.

Além de comandar a economia da Santa Sé, posto que o tornou o terceiro homem mais importante na hierarquia da Igreja, Pell integra uma comissão de nove cardeais formada por Francisco para ampliar a penetração do catolicismo no mundo.

Já a advogada Ingrid Irwin, que representa dois homens que teriam sido vítimas de assédio de Pell, comemorou o indiciamento do religioso.

— Por muito tempo eles tiveram medo de levar o caso à frente por causa do poder da Igreja Católica, mas isso mostra que George Pell não está acima da lei — avaliou Ingrid ao jornal “Sydney Morning Herald”. — Ambos estão se sentindo vingados. Viveram numa zona cinza por dois anos, o risco de virem a público era muito grande.

Sociólogo e coordenador do Núcleo de Fé e Cultura da PUC-SP, Francisco Borba Ribeiro Neto acredita que, com o episódio, a Igreja e o Papa saem enfraquecidos.

— Não foi uma omissão calculada, mas houve um erro de avaliação e perda moral — julga. — As consequências para a Igreja dependerão de sua reação. Se ela tentar contemporizar, vai se desgastar mais ainda. Se reconhecer sua falha e procurar sinais concretos de que evitará novos casos, pode tornar-se um modelo para qualquer instituição.

[b]POLÍTICA DE TOLERÂNCIA ZERO[/b]

Ribeiro Neto defende o Pontífice, que definia as denúncias contra Pell como “fofocas”.

— A seleção dos auxiliares é muito difícil para um Papa. O critério principal é um histórico de bons serviços administrativos. Francisco não estava na Austrália para saber o que acontecia com Pell — justifica o sociólogo, que descarta o surgimento de uma nova onda de escândalos de assédio sexual na Igreja. — A maioria dos problemas, que já se acumulavam há 50 anos, caiu sobre o pontificado de Bento XVI. Agora já existe uma política de tolerância zero, e Francisco tem força para implementá-la.

Maria Clara Bingemer, professora do Departamento de Teologia da PUC-Rio, assinala que Francisco é “implacável” na punição a crimes contra a Igreja, mesmo quando os autores integram o núcleo de seu pontificado.

— Francisco tem histórico de punir religiosos, inclusive figuras próximas a ele — destaca. — Se nada fez contra Pell, é porque respeita o princípio jurídico, segundo o qual todo réu tem direito à defesa enquanto não houver provas concretas. Os crimes de pedofilia na Igreja estão longe da solução, mas as novas gerações de religiosos sabem que precisam tomar cuidado e, por isso, não acredito que o Vaticano precisará lidar com muitos casos.

Em fevereiro, um relatório da Comissão Real para Respostas Institucionais a Casos de Abuso Sexual Infantil identificou a ocorrência de 4.444 casos de assédio a menores na Austrália entre 1980 e 2015. Os episódios teriam ocorrido em mais de mil instituições, e a média da idade das vítimas era de 10,5 anos (meninas) e 11,6 (meninos).

[b]Fonte: O Globo[/b]

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