[img align=left width=300]https://static.noticiasaominuto.com.br/stockimages/1370×587/naom_59274a3d6422e.jpg[/img]

Crescei e multiplicai-vos, como diz a passagem bíblica, serve também para ilustrar as ambições da bancada evangélica na Câmara em 2018. E o “distritão” pode catalisar os planos de expansão do bloco.

Nos bastidores, igrejas e parlamentares ligados a elas já vislumbram esse possível efeito colateral do novo modelo para eleger deputados embutido na reforma política que o Congresso começou a discutir na quarta-feira (16).

O bloco evangélico, que em 1994 tinha 21 membros, quadruplicou para cerca de 85 (16,5%) dos 513 deputados atuais. Com ou sem “distritão”, um aumento já era esperado para o ano que vem, na esteira do agigantamento dessa fé na população brasileira (menos de 10% no começo dos anos 1990 para 30% hoje).

A meta é superar os 20% da Casa, diz o presidente da bancada evangélica, pastor Hidekazu Takayama (PSC-PR).

Se o Congresso aprovar regras que suprimam o sistema proporcional vigente, a bancada pode sair no lucro.

Professor de sociologia da USP especializado no segmento, Ricardo Mariano aponta o pressuposto “de que que os evangélicos levariam vantagem por serem conhecidos –incluindo aí as celebridades gospel e os televangelistas–, disporem de muitos recursos financeiros, de acesso facilitado a mídias eletrônicas”, fora que não são poucos os pastores capazes de “influenciar o voto de parte de seus adeptos”.

“A maior parcela [dos deputados evangélicos] prefere o ‘distritão'”, diz Takayama, líder da bancada que, em abril, foi orar com Michel Temer no Planalto e aproveitou para reforçar algumas de suas bandeiras: contra o debate da ideologia de gênero nas escolas, o aborto, a legalização das drogas e a permissão que o aluno transgênero use o banheiro que preferir, feminino ou masculino.

Hoje o pleito funciona assim: se você escolheu candidato ‘x’, seu voto também conta para o partido ou a coligação. A nova fórmula prevê que se elege simplesmente quem for melhor nas urnas.

Sem a figura do “puxador de votos”, pouco adiantaria lançar nomes sem chances reais na disputa. Em tese, é um estímulo a quem já está no Congresso (ajudado pela máquina pública) e personalidades.

[b]BONS DE VOTO
[/b]
Líderes evangélicos costumam ser bons de voto. Eduardo Bolsonaro, por exemplo, entrou no Congresso na aba do pastor Marco Feliciano, colega do PSC-SP que teve 398 mil eleitores em 2014. Fosse o “distritão”, o filho do também deputado Jair Bolsonaro teria ficado de fora –com 82 mil votos, ele “roubou” a cadeira de rivais mais bem votados, como o tucano Thame (107 mil).

O ex-deputado Robson Rodovalho, bispo da Sara Nossa Terra (ex-igreja de Eduardo Cunha), é favorável à mudança de modelo, pois no atual “a galera suja entra com pouco voto”. Pensamento similar ao do presidente da Frente Parlamentar em Defesa da Vida e da Família, pastor Alan Rick (PRB-AC), para quem a proposta “favorece o fortalecimento da representatividade popular”.

Mas há divergências no meio. O deputado Ronaldo Fonseca (Pros-DF), que capitaneia a criação do Partido Republicano Cristão, e o pastor Everaldo, presidente do Partido Social Cristão, acham que o “distritão” terá impacto reduzido no bloco evangélico.

Seguem o raciocínio do pastor Silas Malafaia: “O evangélico que é popular não depende do ‘distritão’. Para ele tanto faz, vai entrar de qualquer jeito”. Dá seu irmão de exemplo: Samuel Malafaia (PSD) foi o quarto deputado estadual mais votado no Rio.

Em março, o presidente do Superior Tribunal Eleitoral, Gilmar Mendes, disse que a corte estuda uma cláusula contra o [url=https://folhagospel.com/modules/news/article.php?storyid=33541]uso do poder econômico e a influência das igrejas nas eleições[/url].

Após o Supremo Tribunal Federal vetar doações empresariais, afirmou à agência de notícias Reuters, “hoje quem tem dinheiro? As igrejas. Além do poder de persuasão. O cidadão reúne 100 mil pessoas num lugar e diz ‘meu candidato é esse’. […] Se disser que agora o caminho para o céu passa pela doação de R$ 100?”.

A fala deixou evangélicos em alerta. “Isso é um preconceito desgraçado”, diz Malafaia, que em pleitos apoia em média uma dezena de candidatos. “Veja quantos evangélicos estão na Lava Jato. Gosto muito [de Mendes], mas ele está falando bobagem”.

Via assessoria, Mendes afirma que por ora prefere não voltar ao assunto.

[b]Entenda o que é o voto distritão[/b]

Há meses adormecida nas gavetas do Congresso, uma reforma política pode ser aprovada antes de setembro – em tempo hábil para que seja implementada na eleição do ano que vem – a toque de caixa. Uma das principais mudanças a serem sentidas pelos eleitores é a adoção do voto distritão, que põe fim à eleição proporcional. Nesse modelo, os mais votados são eleitos, sem chance de perderem os assentos para candidatos com menos votos beneficiados pelos “puxadores de votos”.

A mudança, agora, tem apoio de grande parte do Congresso, embora tenha sido rejeitada em 2015, quando o então presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ) incentivava o projeto. A justificativa é a de que o distritão é mais justo do que o sistema proporcional vigente, uma vez que com ele “quem ganha, leva”.

Nessa mudança, porém, está uma casca de banana, segundo especialistas: o voto distritão é mais vantajoso para aqueles políticos mais conhecidos, com influência nas regiões, verbas e grandes estruturas. De acordo com esse raciocínio, novas lideranças e não políticos estariam em desvantagem. Portanto, na avaliação dos especialistas, os congressistas, prevendo dificuldades em virtude dos desgastes da classe política, preocupam-se apenas com a autopreservação. É o que os analistas chamam de “empreendedorismo político”.

“Com a criação do distritão, os candidatos já existentes se eternizam e dificultam a renovação. A mudança, como está sendo feita, é mudança para permanecer tudo como está”, afirma o cientista político da Universidade Mackenzie, de São Paulo, Rogério Baptistini.

Outra crítica ao distritão diz respeito ao incentivo ao personalismo. Para o cientista político Fernando Pignaton, o voto distritão apresenta risco à representação partidária. Por mais que as legendas precisem de oxigenação, elas são as responsáveis por organizar o pensamento político no país.

“Acabar com o painel de partidos é desorientar completamente a discussão política e eleitoral. Não existe democracia sem partidos. O eleitor entende quem está de cada lado. Nesse sistema que estão propondo, os eleitores vão votar em pessoas, e não em ideias”, disse.

Para as mudanças passarem a valer já nas eleições de 2018, precisam ser aprovadas nas duas Casas até 7 de outubro. Por isso, o Congresso corre contra o tempo. Mas vale entender como funciona o sistema atual e quais são as mudanças discutidas.

[b]Fonte: Folha de São Paulo e Gazeta online[/b]

Comentários