O biólogo britânico Richard Dawkins (foto), da Universidade de Oxford, tomou para si uma missão: pregar a descrença em Deus. Para ele, as religiões têm uma tendência a fazer os fiéis cometer atos condenáveis e só sobrevivem porque ainda existe ignorância no planeta. Dawkins afirma que, para o bem do planeta, os ateus devem deixar a timidez de lado.

Ele compara sua campanha com o movimento organizado dos judeus nos Estados Unidos. Desde o lançamento do best-seller internacional Deus – Um Delírio, em 2006, Dawkins tem viajado pelo mundo em uma incansável cruzada a favor do ateísmo. Diz que um dia gostaria de levar sua pregação para o Brasil. Confira entrevista abaixo concedida à revista Época:

Desde que “Deus – Um Delírio” foi publicado, o senhor tem feito uma turnê mundial para disseminar a palavra contra a religião e a favor do ateísmo. O senhor acredita que tem tido sucesso em sua missão?

Eu acho que tenho sido consideravelmente bem-sucedido. Se você olhar em meu website, vai ver que ele reflete uma grande dose de entusiasmo por minha mensagem.

Mas o senhor tem conseguido atingir o público que necessita ser atingido? As pessoas que acreditam em Deus?

Sobre isso já não tenho certeza. Sei que conseguimos fazer conversões. Por exemplo, ontem à noite em Chicago, havia uma quantidade significativa de pessoas na fila de autógrafos de meu livro que disseram que ele as ajudou a firmar suas opiniões a respeito de religião. O website e o livro estão atingindo principalmente as que estão indecisas e precisam de um pouco de encorajamento.

Com base no que o senhor tem visto em suas viagens, qual é a melhor maneira de motivar os ateus em potencial a assumir sua descrença em Deus?

Eu acredito que, quando vêem que há argumentos fortes em seu favor, e que outras pessoas estão saindo do armário, eles se sentem mais confiantes. Por exemplo, quando notam em minhas palestras que uma grande quantidade de gente está defendendo suas opiniões, ganham coragem para se revelar também.

O senhor vem dizendo que, se os ateus se organizassem politicamente, eles poderiam exercer grande influência em um país como os Estados Unidos. O senhor acredita que isso um dia poderá acontecer?

Sim, acho que sim. Tome como exemplo o movimento judaico, que é imensamente influente nos Estados Unidos. Existem menos judeus praticantes que ateus na América. Então, se você considerar o poder do lobby judaico, terá um forte argumento a favor da organização dos ateus.

Por outro lado, acreditar em Deus parece algo mais poderoso em termos de unir as pessoas em torno de um objetivo. Pelo menos mais poderoso que a idéia de não acreditar em nada, que é o que as pessoas em geral relacionam com o ateísmo.

Esta é uma boa observação. Mas, quando você vive em um país em que o governo diz tomar decisões com base na religião, você tem um motivo forte para fazer alguma coisa a respeito.

Quais são os principais obstáculos para disseminar suas idéias?

Há vários. Alguns temem desagradar a Deus só de ouvir o discurso de um ateu. Outros são apenas ignorantes, nunca ouviram uma boa argumentação científica. E também há o medo da reação da família e dos vizinhos. As pessoas precisam freqüentar a igreja de sua comunidade porque os pais, os avós, ou até mesmo o marido ou a mulher, são religiosos. Daí elas não querem decepcionar nem irritar gente tão próxima assim. Mas boa parte da resistência se deve à ignorância. No sentido de que muitas pessoas não entendem que a ciência não tem de dar uma explicação imediata para tudo o que hoje elas atribuem a Deus.

Se isso acontece em um país onde os níveis educacionais são razoavelmente altos, como os Estados Unidos, a situação deve ser pior em outros países…

Você imaginaria isso, não é verdade? Entretanto, o fato é que os Estados Unidos têm uma proporção muito mais alta de pessoas que não acreditam na evolução das espécies do que em qualquer país europeu, por exemplo. A única exceção é a Turquia.

O senhor tem planos para levar sua mensagem a países em desenvolvimento onde a religião ocupa um lugar de destaque na sociedade, como o Brasil?

Já tive vários convites para fazer palestras no Brasil, o que me deixa contente. Mas não tenho planos imediatos de ir para lá.

O senhor acredita que suas idéias teriam impacto em um país como o Brasil?

Bom, eu acho importante levar essa mensagem para todas as partes do mundo. Espero que um dia seja possível comprovar isso.

No Brasil as pessoas em geral têm uma relação menos radical com a religião que nos Estados Unidos. Mesmo assim, o senhor acha que os ateus brasileiros também deveriam se esforçar em combater a religião?

Não conheço o Brasil, mas o que você está dizendo soa encorajador. Talvez haja uma necessidade menor de combater a religião lá que em outros lugares.

Seu livro afirma que o acesso à educação e à informação é um remédio eficiente contra as superstições e a favor da ciência. Hoje há cada vez mais educação no mundo, e a internet oferece mais informação que nunca. O senhor acredita que o fim da religião seria uma conseqüência lógica do processo de expansão do conhecimento?

Gostaria de acreditar que você está certo, e quem sabe esteja. Essa é a atitude de muitos de meus colegas cientistas. Mas considero essa visão um pouco otimista. Em um país como os EUA, onde a religião é tão forte, acredito que é preciso algo mais que simplesmente educar as pessoas a respeito da ciência. É o que estou fazendo.

Seu livro de certo modo também deixa a impressão de que a ciência traz muitas coisas boas para a humanidade, enquanto a religião promove resultados negativos. Mas a ciência nos deu a bomba atômica e inspirou teorias malucas como a eugenia.

A ciência pode ser usada na produção de coisas ruins como a bomba atômica, mas por si mesma não leva a ações malignas. Entretanto, fazer coisas horríveis é uma parte lógica do processo de acreditar em Deus. Os 19 homens que perpetraram os ataques de 11 de setembro de 2001, por exemplo, talvez não fossem naturalmente malignos. Mas eram profundamente religiosos. Eles achavam que o que estavam fazendo era correto segundo o que acreditavam. E chegaram a essa conclusão de uma forma lógica a partir de seus textos religiosos. Para um ateu, seria impossível realizar um ato similar a partir de uma racionalização lógica.

Fonte: Época Online

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