Os bispos argentinos expressaram na semana passada sua preocupação com o processo de concentração de terras do país nas mãos de estrangeiros ou de grandes grupos, em detrimento dos pequenos produtores.

Segundo estimativa do Exército, 10% do território da Argentina -270 mil km2- pertencem a estrangeiros. Haveria outros 32 milhões de hectares de terras em processo de venda a investidores internacionais.

A Conferência Episcopal Argentina afirmou que há “venda indiscriminada de grandes extensões” e um processo de “estrangeirização da terra”, com danos sociais e ambientais, e questionou a responsabilidade do Estado. A entidade divulgou o estudo “Uma Terra para Todos”, em parceria com a Universidade Católica Argentina, que destaca ainda que as áreas vendidas abrigam importantes reservatórios de água.

O movimento dos bispos ocorre enquanto se discute na Argentina uma polêmica proposta do piqueteiro Luis d’Elia, atual subsecretário de terras do governo do presidente Néstor Kirchner, para expropriar terras de estrangeiros.

No início de agosto, D’Elia invadiu a propriedade do empresário americano Douglas Rainsford Tompkins, na Província de Corrientes. O piqueteiro sustenta que as terras são improdutivas e guardam um “enorme reservatório de água”.

Em seguida, chegou ao Congresso projeto de lei assinado por uma deputada kirchnerista para desapropriar 300 mil hectares de Tompkins e criar ali uma reserva nacional.

O mal-estar foi tanto que a Casa Rosada chegou a dizer que não apoiava expropriações. Porém, o governo se aproveitou da ação de D’Elia para mostrar que não está alinhado com o “imperialismo” dos EUA.
Tompkins, 63, diz comprar terras para preservá-las.

Ao saber das declarações dos bispos, D’Elia elogiou os religiosos. Os bispos, entretanto, reagiram dizendo não defender a expropriação de terras, apenas a implementação de uma “política governamental mais responsável”.

Surpreendentemente, em nota, Tompkins também elogiou os bispos. Disse que tem “pontos de vista similares”, que a concentração de terras é fruto do “capitalismo de livre comércio desenfreado” e que pretende doar a área a uma reserva nacional “após recuperar o ecossistema”.

Frisou, porém, que não comprou terras de pequenos produtores em dificuldade, mas de grandes proprietários.

Magnatas

A Argentina não possui lei federal para regular a venda de terras a estrangeiros -todos os projetos relacionados ao tema estão parados no Congresso. O ex-presidente Carlos Menem é apontado como o responsável por acelerar o processo de “estrangeirização de terras” nos anos 90.

Um livro-reportagem sobre quem são os magnatas donos de terras na Patagônia -onde fica Santa Cruz, a Província natal do presidente Néstor Kirchner- acaba de ser lançado na Argentina. “Patagônia Vendida”, escrito pelo jornalista Gonzalo Sánchez, da revista semanal “Notícias”, descreve os motivos e os caprichos de alguns desses milionários, cujas fortunas, juntas, superam o PIB da Bolívia.

Entre eles está a família Benetton, a maior proprietária privada de terras na Argentina, que está na mira de Luis d’Elia; Ted Turner, o fundador da rede CNN, que teria comprado uma grande área apenas para pescar trutas; e Joseph Lewis, o sexto homem mais rico da Inglaterra, dono de um império que inclui o Hard Rock Café e o Planet Hollywood.

Na semana passada, a CNN exibiu uma reportagem criticando Luis d’Elia e a “instabilidade” existente na Argentina.

Bill Gates, o homem mais rico do mundo, também investirá na Patagônia, mas em uma mina de prata: serão cerca de US$ 120 milhões.

Fonte: Folha de São Paulo

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