A nova lei de proteção às mulheres

Recentemente num jornal evangélico foi narrada por um pastor a seguinte situação: “Ouvi de uma senhora que foi a delegacia da Mulher (…) denunciar seu marido por violência. Ambos – esposa e esposo – foram primeiramente atendidos pela assistente social.

A seguir, enquanto a esposa era atendida pela delegada, a assistente social perguntou ao marido sobre os motivos da agressão. A justificativa foi que, sendo ambos evangélicos, ele não admitia que ela não se sujeitasse a ele, como mandava a Bíblia. …” , grifo nosso.

Referida situação narrada pelo ilustre obreiro não é isolada e tem ocorrido com mais freqüência com que muitos de nós envolvidos na liderança da igreja evangélica brasileira imaginamos, e quem diz isso são as instituições e entidades, que tem prestado um relevante serviço social por todo o Brasil, provendo orientação psicológica e jurídica, e especialmente apoio moral em momento de fragilidade pessoal, quando uma mulher é agredida pelo marido, companheiro, noivo, namorado etc.

Cresce assustadoramente o número de mulheres evangélicas que tem tido a iniciativa de procurar estas ONGs – Organizações Não Governamentais, que funcionam como associações de defesa da mulher vitima de violência doméstica, em face de sofrerem dentro de casa agressões de seus esposos, que por sua vez também são evangélicos, e que em sua grande maioria ocupam cargos de liderança eclesiástica na igreja, que as tem encaminhado para o atendimento na Delegacia da Mulher, quando esta instalada ou mesmo na Delegacia de Polícia, para o registro da ocorrência, e a devida instauração do processo legal de penalização do agressor.

Em boa entrou em vigor a Lei 11.340/06, que visa “…coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher…”, a qual recebeu popularmente a denominação de Lei Maria da Penha, em homenagem a uma mulher vitima de violência doméstica, que lutou pela aprovação dessa avançada legislação no Brasil.

Com base no preceito constitucional “não há crime sem lei anterior que o defina”, um delito só considerado crime se estiver descrito, narrado numa lei como tal, a isto se chama tipificação, podendo aí ser punido pela autoridade judiciária.

Registre-se que os preceitos desta lei aplicam-se tão somente as mulheres, e aí utilizamos os termos da própria lei, que entendemos serem simples, eis que voltada para resguardo das mulheres em situação de violência doméstica e familiar.

Descreve o legislador os “ambientes” onde a situação de violência é considerada doméstica, e por isso, inseridos nesta lei: “…no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas; no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa; em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independente de coabitação. …”.

Didaticamente a Lei 11.340/06 narra quais são as “…formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras…”, que são: “…a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal; a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação…”.

Prossegue o texto legal, “…a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar , a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação, ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos; a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades; a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria. …”.

A lei também prevê que ocorrerá, “…a implementação de atendimento policial especializado para as mulheres, em particular nas Delegacias de Atendimento à Mulher…”, e que “…a assistência à mulher em situação de violência doméstica e familiar será prestada de forma articulada e conforme os princípios e as diretrizes previstos na Lei Orgânica da Assistência Social …”.

Existem algumas garantias que foram inseridas que a Lei Maria da Penha, entre as quais, citamos: “… manutenção do vínculo trabalhista, quando necessário o afastamento do local de trabalho, por até seis meses. …”, “…deverá a autoridade policial (…), de imediato…”, “…determinar que se proceda ao exame de corpo de delito da ofendida e requisitar outros exames periciais necessários …”.

Aguarde a conclusão deste vital instrumento legal de proteção as mulheres, de todas as raças, credos e condição social, que ainda são vitimas de violência doméstica em pleno século XXI.

Prof. Gilberto Garcia

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Gilberto Garcia
DIREITO NOSSO: Gilberto Garcia é Advogado, Professor Universitário, Mestre em Direito, Especialista em Direito Religioso. Presidente da Comissão de Direito e Liberdade Religiosa do IAB/Nacional (Instituto dos Advogados Brasileiros), Membro da Comissão Especial de Advogados Cristãos, OAB/RJ, Integrante da Comissão de Juristas Inter-religiosos pelo 'Diálogo e pela Paz', Instituída pela Arquidiocese Católica do Rio de Janeiro, e, Membro Titular da Academia Evangélica de Letras do Brasil - AELB. Autor dos Livros: “O Novo Código Civil e as Igrejas” e “O Direito Nosso de Cada Dia”, Editora Vida, e, “Novo Direito Associativo”, Editora Método/Grupo GEN, e Coautor nas Obras Coletivas: “In Solidum - Revista da Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais Aplicadas da UNIG”, Ed. Gráfica Universitária/RJ; bem como, “Questões Controvertidas - Parte Geral Código Civil”, Grupo GEN, e, “Direito e Cristianismo”, Volumes 1 e 2, Editora Betel, e, “Aprendendo Uma Nova Realidade: 2020 - O Ano em que o Mundo Parou!”, “Os Reflexos da Covid-19 no Meio Cristão-Evangélico Brasileiro”, “O Que Pensam os Líderes Batistas?”, “O Esperançar em Um Pais Repleto de Pandemias”, “Princípios Batistas, Discurso Relativização, Coerência e Vivência”, e, “Igreja e Política - Um Hiato Dolorido”, "Antologia de Verão/2023", "Antologia de Outono/2023', Vital Publicações; e, ainda, “A Cidadania Religiosa num Estado Laico: a separação Igreja-Estado e o Exercício da fé”, IAB/Editora PoD, e, “Desafios do Exercício da Fé no Ordenamento Jurídico Nacional”, IAB/Editora Essenzia; além do DVD - “Implicações Tributárias das Igrejas”, CPAD/CGADB; Instagram:@prof.gilbertogarcia; Editor do Site: www.direitonosso.com.br
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