“Cultura não se impõe!”

Acabei de receber uma mensagem de um amigo, revoltado com a Câmara de Vereadores de Recife que esta tentando aprovar uma lei que obriga as rádios locais a tocar pelo menos 3 minutos diários de Frevo.

O princípio da proposta parece ser o de valorizar a cultura e os músicos locais, e abrir espaço nas rádios da cidade para divulgação de trabalhos regionais. Detalhe: as rádios religiosas, teoricamente, também teriam que se adequar à nova lei, tocando frevo por pelo 3 minutos por dia. E aí a discussão esquentou ainda mais.

Promover a cultura regional em um país xenômano como o Brasil é algo sempre bem vindo, mas a tal lei além de esdrúxula abre precedentes assustadores. Se a ideia é promover a cultura pernambucana, por que somente o frevo? Pernambuco tem mais de 20 ritmos e gêneros regionais que também merecem ser divulgados. Por que somente música? Literatura, artes plásticas, teatro e cinema também deveriam ser incentivados.

Mas, a questão passa longe do mero estimulo à cultura regional. O que realmente me incomoda é essa mania terrível de querer resolver tudo com novas leis. Isso é bem típico de políticos corruptos e preguiçosos que não querem fazer o seu trabalho dignamente e sempre optam pelo caminho mais fácil.

Meu amigo, revoltado com a tal lei, falou com muita propriedade que “Cultura não se impõe!“. De fato, só quem acha que gosto pessoal, cultura e preferências podem ser impostas, são os regimes totalitários. E é aí que mora o perigo dessa lei estúpida.

Leis desse tipo, assim como o voto obrigatório e a infame “Voz do Brasil”, são todos filhotes da ditadura militar que nos assolou por mais de duas décadas e que já deveria ter sido morta e sepultada. Parece que mesmo depois de quase 30 anos, as gerações mais novas ainda não conseguiram se livrar dos resquícios do totalitarismo do passado.

Não serão leis que irão mudar os conceitos e problemas de nossa sociedade; somente a educação é que pode realmente fazer diferença. Sou contra até mesmo a existência do horário político obrigatório; consciência política também não se impõe. Se a iniciativa partisse das próprias rádios, sem a interferência do Estado, seria algo muito mais bem vindo e louvável. Político tem que ficar de fora dessas coisas e se concentrar nas reais necessidades como educação, saúde e segurança.

Conheço muito bem o sistema de educação de Pernambuco e sei que é bastante precário. Somente investindo nas escolas, pagando melhor a professores e funcionários e dando melhores condições de trabalho, promovendo o ensino de culturas regionais e arte popular é que poderíamos de fato, criar um senso de cidadania e nacionalismo nas próximas gerações.

No fundo, tudo me parece um pouco de mercantilismo. Muito certamente, já deve haver produtores e empresários inescrupulosos de olho nos possíveis dividendos que a tal lei pode trazer.

Apesar da reação das rádios evangélicas, sinceramente esse aspecto é o que menos me preocupa; temos músicos evangélicos de ótima qualidade ligados à Pernambuco; não seria nada difícil produzir frevos evangélicos de bom gosto e mensagem relevante. Isso seria até prazeroso e estimulante. O que me preocupa realmente é a perpetuação de um modelo de governo inchado, ineficiente, corrupto e que não atende às reais necessidades do nosso povo.

Um abraço,

Leon Neto

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