O Exercício da Cidadania e a Linguagem Jurídica

Tive a alegria de ser “iniciado” na carreira jurídica por dois amigos, há quase trinta anos, aos quais rendo homenagens póstumas, eis que, alertaram dos perigos do “juridiquês”, a linguagem técnica utilizada pelos advogados, juízes etc.

Colegas experientes, àquela época, ambos com mais de três décadas de advocacia, Dr. Pércio Rangel de Almeida, meu “gamaliel jurídico”, e, Dr. Paulo de Souza Ribeiro, meu “exemplo de profissional”.

Eles ensinavam já no início dos anos 80, “faça petições objetivas, escreva de forma direta, exponha o fato, a lei e o direito, eis que o juiz não tem tempo a perder com `latins´, e o tempo de escrever difícil com citações estéreis, de utilizar linguagem rebuscada passou.”

Verdadeiramente os tempos mudaram, e hoje é tido como desnecessária exposição de conhecimento, a citação exagerada de latim, ou mesmo visto como pretensão de demonstração de cultura a citação de textos de pensadores, doutrinadores, filósofos etc.

É sabida a dificuldade que a maioria das pessoas tem em lidar com os chamados “jargões técnicos herméticos”, ou seja, expressões e termos específicos, em geral compreendidos apenas por quem é “versado” no assunto, limitando o acesso do povo ao conhecimento.

Assim temos o “politiquês”, o “economês”, o “mediquês”, e ainda o “juridiquês”, que não é entendido pelo grande público, cerceando o exercício de cidadania, sendo que esta dificuldade de comunicação tem motivado iniciativas de simplificação da linguagem legal.

Fortalece-se cada vez mais um movimento entre advogados, professores de direito, juízes e diversos outros operadores do direito, inclusive pela Associação de Magistrados Brasileiros, visando propiciar o acesso à cidadania, com a facilitação de seu entendimento.

Vivemos um tempo novo, onde existe uma maior ênfase na comunicação visual, sendo a escrita um ponto de referencial da sociedade, por isso, cada vez mais perde espaço a linguagem “bolorenta”, “verborrágica”, palavras de difícil compreensão, ou de uso incomum, exatamente em função da escassez de tempo, que todos nós estamos submetidos.

É vital o advogado, fuja do “juridiquês”, pois o que antigamente era um sinal de intelectualidade, atualmente é visto como um profissional que não sabe se comunicar na linguagem simples, prestando um desserviço a população dificultando seu acesso ao direito.

Neste tempo de internet, comunicação virtual, linguagem digital, onde os meios de comunicação carecem da intervenção dos profissionais do direito, sobretudo dos advogados, é indispensável à utilização de uma linguagem prática, sem deixar de possuir conteúdo técnico-jurídico, transmitindo conhecimento de forma fácil, sem ser chulo.

A utilização da linguagem coloquial e acessível ao cidadão não versado no direito tornou-se um imperativo, em face da necessidade de comunicação dos advogados com a sociedade, tornando mais fácil a compreensão das leis, e aí, promover-se-á a instrumentalização no exercício da cidadania facilitando o pleito de direitos junto aos órgãos públicos e privados.

A linguagem forense verdadeiramente tem uma forma de expressão diferenciada e muitas das vezes existem termos específicos que são utilizados no direito que não podem ser substituídos, entretanto, necessitamos evitar a utilização de um palavratório arcaico.

Desta forma, também, estaremos contribuindo para que nossa “brava gente brasileira” possa conhecer para usufruir plenamente de suas prerrogativas, tendo ciência de suas responsabilidades, eis que deste modo, verdadeiramente, o direito estará a serviço do povo.

No Ano de 2012 celebramos o Jubileu de Prata do Grau de Bacharel em Direito, e confirmamos a atualidade do que Oscar Wilde, no livro “O Retrato de Dorian Gray”, através do personagem Lord Henry Wotton, numa tradução livre, asseverou: “Nossos provérbios querem ser reescritos. Eles foram feitos no inverno e nós estamos no verão”.

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Gilberto Garcia
DIREITO NOSSO: Gilberto Garcia é Advogado, Professor Universitário, Mestre em Direito, Especialista em Direito Religioso. Presidente da Comissão de Direito e Liberdade Religiosa do IAB/Nacional (Instituto dos Advogados Brasileiros), Membro da Comissão Especial de Advogados Cristãos, OAB/RJ, Integrante da Comissão de Juristas Inter-religiosos pelo 'Diálogo e pela Paz', Instituída pela Arquidiocese Católica do Rio de Janeiro, e, Membro Titular da Academia Evangélica de Letras do Brasil - AELB. Autor dos Livros: “O Novo Código Civil e as Igrejas” e “O Direito Nosso de Cada Dia”, Editora Vida, e, “Novo Direito Associativo”, Editora Método/Grupo GEN, e Coautor nas Obras Coletivas: “In Solidum - Revista da Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais Aplicadas da UNIG”, Ed. Gráfica Universitária/RJ; bem como, “Questões Controvertidas - Parte Geral Código Civil”, Grupo GEN, e, “Direito e Cristianismo”, Volumes 1 e 2, Editora Betel, e, “Aprendendo Uma Nova Realidade: 2020 - O Ano em que o Mundo Parou!”, “Os Reflexos da Covid-19 no Meio Cristão-Evangélico Brasileiro”, “O Que Pensam os Líderes Batistas?”, “O Esperançar em Um Pais Repleto de Pandemias”, “Princípios Batistas, Discurso Relativização, Coerência e Vivência”, e, “Igreja e Política - Um Hiato Dolorido”, "Antologia de Verão/2023", "Antologia de Outono/2023', Vital Publicações; e, ainda, “A Cidadania Religiosa num Estado Laico: a separação Igreja-Estado e o Exercício da fé”, IAB/Editora PoD, e, “Desafios do Exercício da Fé no Ordenamento Jurídico Nacional”, IAB/Editora Essenzia; além do DVD - “Implicações Tributárias das Igrejas”, CPAD/CGADB; Instagram:@prof.gilbertogarcia; Editor do Site: www.direitonosso.com.br
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