As igrejas evangélicas brasileiras estão em expansão na Alemanha. Das grandes neopentecostais às pequenas comunidades criadas por imigrantes brasileiros, nunca foi tão acirrada a luta por fiéis na terra de Bento 16. A mais recente igreja neopentecostal brasileira a fincar bandeira na Alemanha foi a Igreja Internacional da Graça de Deus, do pastor R.R. Soares (foto).

Desde fevereiro de 2007, o concorrente do bispo Edir Macedo – com quem fundara a Universal em 1977 e de quem se separou após divergências – tem um programa de uma hora de duração, sem interrupções comerciais, três vezes por semana, na Rhein Main TV – uma emissora regional emitida por satélite para toda a Europa.

O “Show da Fé” transmitido na Alemanha é o mesmo programa produzido no Brasil, só que dublado em alemão. Segundo as estatísticas, a emissora teve um aumento de 60% de audiência em comparação ao outono de 2006, data da última pesquisa: “Não podemos especificar se esse aumento tem relação direta com a produção do pastor Soares, mas estamos muito satisfeitos com ela”, declarou o diretor da emissora, Stephan Seeländer.

A estratégia de R.R. Soares foi inversa à das demais igrejas brasileiras com intenção de se estabelecer na Alemanha: “Não dá para conseguir um visto para um pastor, mas quando se tem um programa, pode-se consegui-lo mais facilmente”, revelou o pastor alemão Armin Salzmann. Realizador de programas religiosos, ele se dispôs a atender em seu escritório em Augsburg, cidade próxima a Munique, os telefonemas dos telespectadores.

Até o início de junho, o número de telefone fornecido nos créditos finais do “Show da Fé” não funcionava. A única maneira de se comunicar com representantes da Internacional era através de e-mail. Os pedidos de doações de 30, 50, 100 ou mais euros para ajudar a financiar o programa estavam sendo feitos em vão. “Fomos aconselhados a oferecer brindes e a cultivar o público para receber apoio financeiro”, esclarece Peter Walker, responsável pela pós-produção no Brasil.

Estratégias e metas diferentes

Já a Igreja Universal usou de outro artifício para se instalar no país: contratou pastores portugueses, que têm cidadania européia e falam alemão. Depois de uma tentativa fracassada em Stuttgart há cerca de cinco anos, abriu sede em Berlim, onde há grande número de brasileiros. Atualmente, tem templos em Munique, Hamburgo, Colônia, Würzburg e novamente em Stuttgart. Seguindo a regra do sigilo total, o presidente da igreja na Alemanha, conhecido como pastor Miguel, não quis dar entrevistas.

No site da Universal alemã, os representantes do bispo Macedo apresentam-se como uma instituição sem fins lucrativos, frisam que não são uma seita e encerram o texto com o número da conta bancária. Os cultos são diários e temáticos: no domingo, por exemplo, oram pelo “fortalecimento e reavivamento da fé”, na segunda-feira, “pela prosperidade financeira” e, na terça-feira, é o “dia do descarrego”.

Enquanto a meta da Internacional e da Universal (ambas neopentecostais) é atrair fiéis alemães, a pentecostal Assembléia de Deus é dirigida para os brasileiros. Há quase 15 anos no país, o presidente Everaldo Lopes é um dos mais antigos pastores evangélicos do Brasil a pregar na Alemanha. Lopes veio representar a Convenção Geral da Assembléia de Deus do Brasil, a de “Belenzinho”, em Belém, São Paulo. Já era primeiro secretário-geral e pastor desde o início dos anos 80. Hoje, o cearense é vice-presidente da Convenção Européia da Assembléia de Deus, que engloba todas as representantes da igreja na Europa. Ele e seu irmão Dionísio encarregam-se dos cultos em Mülldorf, Regensburg, Landshut, Mannheim e Ingolstadt, onde fica a atual sede da Assembléia – uma sala alugada que comporta 200 pessoas sentadas.

A divulgação da Assembléia de Deus é feita através da internet e de panfletos. “Fazemos a evangelização boca a boca, na rua, abordando as pessoas. Freqüentamos hospitais e presídios e ajudamos brasileiras com filhos presos”, explica David Lopes, filho de Everaldo. Segundo ele, “os evangélicos daqui são totalmente diferentes dos brasileiros, que são mais pentecostais, mais fervorosos”.

“Não se deve falar de dinheiro com os alemães”

No mesmo prédio onde funciona a igreja de Lopes em Mannheim, acontecem os cultos da Gemeinde Gottes Jesus ist der Weg (Assembléia de Deus Jesus é o Caminho), do pastor Rolf Dietz. O gaúcho chegou à Alemanha há quatro anos com sua esposa Elisabete, a fim de “colocar em prática a idéia do seu pastor no Brasil”, segundo suas próprias palavras. Embora filho de pai alemão, Dietz só veio a dominar o idioma depois de vários anos no país.

Criada há apenas seis meses, sua comunidade tem somente oito brasileiros e vinte alemães. “A meta é atingirmos os alemães, o que não é tão fácil como muitos pastores brasileiros pensam. Vários vêm para cá, ficam três meses, e depois desistem achando que alemão é tudo ateu”, conta Dietz.

Receando espantar seus fiéis, o pastor evita comentar a origem brasileira da igreja: “As pessoas aqui têm medo de fanatismo, exageros, coisas fora do normal. Procuro não assustá-los com nada de diferente”. E explica a sua receita: “Temos que ter muito tato, evitar falar sobre dinheiro. Nós apenas recolhemos, passamos a oferta no momento do culto, mas não dizemos nada. Se chegar da maneira errada neles, eles logo se fecham. Temos consciência de que não pode ser como no Brasil. Temos que cumprir horários e não podemos fazer muito barulho”. Para ele, o principal motivo dos alemães o procurarem é a solidão: “Eles vivem muito isolados, são distantes da família”, avalia.

Jogadores de futebol também fundam igrejas

O problema do isolamento e da distância da família é justamente o que mais aflige também os imigrantes brasileiros, dentre eles os jogadores de futebol. Não é à toa que dois deles participaram da fundação de igrejas.

Marcelo Bordon, capitão do Schalke, formou com alguns amigos, em janeiro de 2000, a Igreja Missionária de Jesus. No templo alugado em Stuttgart, onde cabem cerca de 60 fiéis, os cultos são feitos em português. Segundo Oliver Beyersdorffer, vice-presidente da igreja, os membros da Missionária “não costumam ter carências financeiras nem sociais, têm família, trabalho e uma rotina saudável”. O motivo de procurarem a comunidade seria “a vontade de seguir o caminho de Jesus”.

A igreja de Bordon publica em seu site os projetos que financia, como o “Pontapé da Esperança”, no qual através do futebol procura ajudar as crianças de rua de Moçambique, e o “Sonnenstrahlen nach Osten”, em que ajuda na construção de igrejas no Leste Europeu.

Há cerca de um ano e meio, um grupo de brasileiros deixou a Missionária para criar a Comunidade Cristã de Stuttgart. Com eles estava Cacau, o atacante do Stuttgart. Ainda numa sala alugada em igreja, os cerca de cem fiéis preparam-se para se mudar para um prédio exclusivo para seus cultos. Ainda sem projetos próprios, colaboram com alguns já existentes, como de apoio a missionários na Bolívia, a índios brasileiros e a mães solteiras.

“A minha vida inteira pertence a Deus. Tudo que ele me deu veio dele e pretendo dar tudo isso de volta a ele, mostrar como Deus é bom e que ele dá vida eterna a quem se entrega a Jesus. Normalmente, coloca-se Deus como um jogo, mas não é. Ele tem seu princípio, age em coisas maiores que isso”, declarou Cacau à DW-WORLD.

Recentemente entrevistado pelo Hamburger Abendblatt antes de um jogo entre o Schalke 04 e o Stuttgart, Cacau foi indagado sobre qual seria a decisão de Deus, já que tanto ele quanto seu rival Bordon estariam em campo lutando pela vitória, e respondeu: “Deus nos ama da mesma maneira, o campeonato não é tão importante”.

O time de Cacau não só ganhou esse jogo, como foi vencedor do Campeonato Alemão, no qual ele próprio chegou a marcar 13 gols.

Fonte: DW World

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