Um grupo de pastores e fiéis evangélicos marcharão rumo à Parada Gay no domingo (7). Na avenida Paulista, começam a missão: converter o máximo de almas possíveis. Almas homofóbicas, no caso.

Para achá-los no dia, procure por pontos brancos no mar de glitter colorido e tutus de bailarina no evento LGBT. “A ideia é que todos vistam camisetas claras. É uma proposta de paz. Um anseio pela quebra desta corrente de ódio que se retroalimenta”, diz José Barbosa Júnior, 44, teólogo da igreja Batista e autoproclamado “pastor marginal”.

A caravana, batizada “Jesus Cura a Homofobia” para se contrapor à “cura gay”, lançou um chamado no Facebook -até a noite de sexta (5), 420 pessoas aderiram a ela.

Casado há dois anos com Ellen, Júnior afirma que não é preciso estar “no armário” para “pedir perdão pela forma como a igreja trata os homossexuais”. “O cristianismo sempre tem que estar a favor daquele que é oprimido”, diz.

Nos cartazes que empunharão domingo, os dizeres “Malafaia e Feliciano não nos representam”. A pregação contra direitos LGBT dos pastores Silas Malafaia e Marco Feliciano propagam, para Júnior, é o teto de vidro de sua fé.

A reação religiosa ao comercial da Boticário não foi a primeira pedra que o estilhaçou -mas foi decisiva, diz Danilo Fernandes, 48, dono do Genizah, um dos sites mais influentes entre evangélicos.

Ele critica o boicote à marca de cosméticos que divulgou uma campanha com casais do mesmo sexo se abraçando ao som de “Toda Forma de Amor”, de Lulu Santos. O Genizah ilustra um artigo sobre o tema com uma imagem de Jesus e Judas em seu cangote. A legenda: “Hmm, cheiroso”.

Cita Desmond Tutu, que lutou contra o apartheid na África do Sul, e Martin Luther King, líder dos direitos civis nos EUA, como evangélicos “que entenderam a separação entre Estado e igreja”.

“Amar o próximo que é parecido com você é muito fácil. Foi com as prostitutas que Jesus se sentou para comer.”

Para Danilo, os fiéis devem lembrar que várias marcas apoiam a causa LGBT, “do Facebook ao McDonald’s”. E que boicotar perfume, além de hipocrisia, “é picuinha”.

Após dezenas de reclamações de consumidores, o Conar (Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária) abriu na terça (2) um processo ético para analisar o comercial. Uma mulher insatisfeita, por exemplo, disse que a Boticário pecava ao mostrar essas famílias “como se fosse normal”. “Não tenho preconceito contra homossexuais, inclusive luto para que encontrem o caminho de Deus”.

José Barbosa Júnior diz que líderes religiosos querem mandar um recado ao atacarem a empresa: o de que “evangélicos têm poder de barganha econômica. Se não fizeram o que mandamos, podemos mexer na economia”.

[b]DIZ A BÍBLIA
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Cravar se a Bíblia condena homossexuais “talvez seja a mais polêmica das perguntas”, diz Júnior. “Literalmente, sim, ela faz isso. Mas há teólogos que defendem uma outra interpretação bíblica, levando em conta contextos históricos, políticos e sociais.”

Para Malafaia, 56, não dá para relativizar. Ele enumera passagens no Novo Testamento: “Coríntios” lacra o “reino de Deus” a “devassos, idólatras, adúlteros, efeminados e sodomitas”; “Romanos” fala de “homens com homens” que “receberam o castigo merecido por sua perversão”.

Para o pastor, o quórum da caravana gospel pró-LGBT “não é nem 0,000001% dos milhões de evangélicos. Não representa porcaria nenhuma, tô dando gargalhada”.

Malafaia compara: “Querida, imagina se alguém faz a Igreja das Prostitutas Católicas. Cada um pode inventar a igreja que quiser. Nem Jesus foi unânime. Nem todo mundo diz amém ao que eu falo”.

[b]Fonte: Folha de São Paulo[/b]

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