Estratégia das igrejas evangélicas tenta recuperar sua bancada no Parlamento, fortemente abalada pelo escândalo dos sanguessugas – o esquema de fraudes em licitações na área da saúde desbaratado pela Polícia Federal, que culminou na prisão de parlamentares ligados à igreja evangélica.

Coordenador político da Confederação Nacional dos Evangélicos, o pastor Ronaldo Fonseca mostra, com orgulho, o estatuto do partido que pretende criar como representação política da Assembléia de Deus. Seu alvo é o Legislativo.

Fonseca adota uma linha de pensamento que coincide em muito com a exposta pelo bispo Edir Macedo, líder da Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd), em seu último livro Plano de poder: Deus, os cristãos e a política – oportunamente lançado a poucas semanas do primeiro turno de votações das eleições municipais.

– A potencialidade numérica dos evangélicos como eleitores pode decidir qualquer pleito eletivo – prega o bispo Macedo.

A semelhança de idéias deixa clara a estratégia das diferentes denominações de igrejas evangélicas para recuperar sua bancada no Parlamento, fortemente abalada pelo escândalo dos sanguessugas – o esquema de fraudes em licitações na área da saúde desbaratado pela Polícia Federal, que culminou na prisão do ex-deputado Bispo Rodrigues, outrora responsável pela coordenação política da Iurd, mais uma série de parlamentares ligados à igreja. Na avaliação de estudiosos, o Parlamento é, para os evangélicos, uma fase necessária para cacifar sua bancada em direção a governos estaduais e, eventualmente, à Presidência da República.

Boa organização

Mesmo depois da punição pelas urnas em 2006, a bancada evangélica é avaliada pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar como um dos grupos suprapartidários mais organizados do Congresso. Estão representadas no Parlamento a Universal, a Igreja do Evangelho Quadrangular, a Assembléia de Deus, a Sara Nossa Terra e a Igreja Batista.

Têm presença forte nas comissões permanentes da Câmara, sobretudo na Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática, que cuida, entre outros assuntos, das concessões para emissoras de rádio e televisão, assunto caro para a Iurd, que escolhe entre seus candidatos radialistas e donos de concessões de meios de comunicação.

– Para eleger seus candidatos, toda a estrutura da igreja é acionada, sobretudo no caso da Iurd – explica o antropólogo da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e especialista em religiões Ari Pedro Oro. Para ele, o desempenho do PRB, legenda com maior percentual de evangélicos no Congresso, é prova do poder do “carisma institucional” da Universal nas urnas.

Política no púlpito

– A Iurd inaugurou uma forma de fazer política que vem sendo copiada pelas demais denominações evangélicas e, mais recentemente, até mesmo pela Igreja Católica. Faz-se política no púlpito, prega-se a fidelidade e o voto no candidato escolhido pela cúpula da Universal. As outras igrejas a condenam, mas a imitam.

A Universal nega qualquer interferência na eleição de membros de sua comunidade. Por meio da assessoria de imprensa, a Iurd afirma que “não faz campanha política e tão pouco possui candidato”.

“Membros ou freqüentadores que ingressam na carreira política o fazem por si só e assim, não sofrem nenhum tipo de influência da igreja em suas decisões” afirmou o presidente da área de Relações Institucionais da Iurd, Jerônimo Alves, por meio de nota.

De acordo com o pastor Ronaldo Fonseca, contudo, é para escapar da influência do que chama de “máquina eleitoral” da Iurd que a Assembléia de Deus pretende percorrer caminho próprio na política ao apoiar a legenda ainda em gestação, o Partido Republicano Cristão (PRC). Na avaliação do pastor, futuro presidente do partido, será possível aproveitar uma brecha da legislação eleitoral que permite políticos migrarem para siglas recém-criadas sem sofrerem punição.

– Neste cenário, será possível contar, já de início, com um corpo de 920 vereadores, nove deputados federais e 27 estaduais – acredita Fonseca. – É o suficiente para chegar em 2010 com uma máquina forte e competitiva, e com uma representação à altura da Assembléia de Deus.

Sem artifícios

Fonseca afirma que não usará os mesmos “artifícios” que, de acordo com ele, seriam adotados pela Iurd para eleger seus parlamentares – a campanha nos púlpitos, na porta das igrejas, a escolha dos candidatos de cima para baixo, pela cúpula dos bispos e imposta aos fiéis.

– A escolha de pessoas despreparadas acabou penalizando não só a Iurd como toda a comunidade evangélica – diz. – Foi esse o caso do Bispo Rodrigues. Vamos apostar em lideranças políticas autênticas, que emergem da comunidade por seus valores e seu talento, em vez de selecionar simplesmente entre quem tem mais influência entre o eleitorado.

Fonte: JB Online

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