Alunos de uma faculdade ofendem e ameaçam de estupro uma aluna que usou um vestido curto demais. Um rapaz de 15 anos estupra uma menina de 12. Moças fazem strip-tease no intervalo das aulas enquanto seus colegas gravam tudo no celular. Por que tantos casos de sexualidade adolescente à flor da pele foram revelados nos últimos dias?

Para especialistas o problema está na falta de limites determinados pelos pais e pelo tipo de ídolos que os jovens têm.

A ausência desses limites ganhou destaque na mídia em três casos apenas no mês passado. No primeiro, que ganhou mais repercussão, uma estudante do primeiro ano do curso de Turismo da Universidade Bandeirante (Uniban) foi ofendida por cerca de 700 colegas na unidade de São Bernardo do Campo (SP) por supostamente se vestir inadequadamente. Colegas tentaram colocar celulares entre suas pernas para tirar fotos e a ameaçaram de estupro. Ela saiu do local escoltada pela polícia.

Em Goiânia, um menino estuprou uma colega de 12 anos de idade. Em Boa Vista, adolescentes usavam o intervalo das aulas para sessões de strip-tease e, às vezes, de sexo oral – a direção só descobriu quando as imagens caíram na internet. Embora todos esses casos revelados tenham se passado no Brasil, há incidentes do tipo descobertos no exterior: em uma cidade da Califórnia, dez jovens entre 15 e 17 anos podem pegar até prisão perpétua por terem estuprado uma menina, que depois foi agredida e roubada.

“O que une esses casos é o vale-tudo, que os jovens aplicam porque não têm limites. Não estou falando de restrições. Estou falando da ausência de um modelo que lhes permita aprender ética, respeito pelo outro, pelo espaço”, diz Antônio Carlos Amador Pereira, professor da PUC-SP, psicólogo e autor do livro “O Adolescente em Desenvolvimento”. “A culpa não é só do adolescente. Afinal, eles veem na sociedade um modelo em que cada um luta exclusivamente por seus interesses e se dá bem quem ignora os limites do outro para conseguir o que quer.”

Para o professor, esses incidentes revelam uma banalização do sexo, incentivada com a exposição dos jovens a conteúdo midiático erotizado. “Os adolescentes reproduzem seus modelos. Em parte é exploração sexual, mas podem ser outras coisas. Se para as meninas o modelo podia ser uma dançarina de axé de anos atrás, erotizada, para os meninos pode ser do traficante Fernandinho Beira-Mar. Na adolescência a gente começa a se definir a partir de ídolos e estamos em uma crise de valores. É um momento perigoso no mundo todo.”

Mimos

No caso das ofensas dos estudantes da Uniban a sua colega, fica evidente, diz a psicóloga e escritora Olga Tessari, a falta de capacidade de aceitar o outro e de tentar assimilar pontos de vista diferentes dos aceitos pela grande maioria do grupo. “É um bando de crianças mimadas que acham que conseguem o que querem. E que sua visão – na verdade a mesma visão de uma manada – é a única possível. E aí quem está fora tem de se virar para corresponder às expectativas, porque, no fim das contas, o mimado tem que conseguir o que quer e tem que conseguir sempre”, diz.

A psicóloga afirma que os pais são os principais responsáveis pela falta de respeito dos jovens para com os outros. “Eles dão pouca atenção aos filhos e quando o adolescente começa a conviver com outras pessoas, tentam compensar fazendo todas as vontades dos seus filhos, que ficam mal acostumados e resultam nessa geração que temos aí. Os pais passam a maior parte do tempo trabalhando e não ensinam valores aos filhos, que entram na adolescência e se deixam levar pelos impulsos. Por um lado, impulsos naturais, levando em conta o lado animal. Mas, do ponto de vista humano, são inaceitáveis, já que temos regras e valores que não estão sendo bem colocados hoje.”

Especialista em sexualidade pela Universidade de São Paulo (USP), a doutora Carmita Abdo diz que o aumento da presença de mulheres em alguns ramos da sociedade, como as faculdades, estimulou esse tipo de comportamento por parte de jovens que não sabem lidar com os próprios impulsos. “O acesso certamente aumentou e isso trouxe a necessidade de que a sociedade acompanhasse melhor esses adolescentes para que pratiquem sexo mais responsável, adulto e saudável. Mas isso ainda não aconteceu”, diz.

“Todos os adolescentes de hoje se comportam de forma muito grupal, que não pode fugir a um padrão aceito. São mimados desde sempre e não conseguem se livrar desse comportamento. Por isso nesse caso da Uniban a moça não foi bem recebida, apesar de ser jovem e de conviver com os jovens. Se por um lado eles têm mais acesso a exercer sua sexualidade, por outro só podem fazer isso se estiver de acordo com determinados espaços, de determinada maneira. É um comportamento hipócrita, sim, mas é assim que eles conseguem estabelecer um mínimo de ordem para o caos que ajudaram a criar”, finaliza Abdo.

Fonte: UOL

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