O cardeal arcebispo de Veneza e a organização italiana Liga Católica Antidifamação pediram à direção da Bienal de Dança que o espetáculo Messiah Game seja cancelado porque consideram blasfema e ofensiva a interpretação ‘erótica’ que é apresentada sobre alguns episódios da vida de Cristo.

“Messiah Game mostra uma versão masoquista, orgiástica e pornográfica da Paixão de Cristo, da Última Ceia e da Crucificação”, diz um comunicado da Liga.

No texto, a entidade pede aos católicos que façam de tudo para impedir que o espetáculo, programado para a próxima quarta-feira, seja realizado.

O cardeal Angelo Scola, patriarca de Veneza, chegou a divulgar uma nota oficial na qual define o espetáculo como “ofensivo e provocatório” e pede que seja suspenso.

A coreografia, criada pelo alemão Felix Ruckert, se baseia em episódios do Novo Testamento, como o batismo de Jesus, a Tentação, a Última Ceia, a Crucificaçã e a Ressurreição.

Ruckert explicou que pretende “evidenciar a relação ambígua e dialética entre domínio e submissão, devoção e poder, que a figura de Cristo simboliza” e se disse surpreso com a polêmica provocada pelo espetáculo.

O coreógrafo, ex-bailarino do grupo de Pina Bausch, afirmou que o espetáculo não pretende colocar em discussão os mistérios da fé ou propor novas interpretações das sagradas escrituras.

“Eu achava que na Itália existisse liberdade para os artistas”, disse.

“Caça às bruxas”

Apesar das pressões de entidades religiosas e de políticos conservadores, a direção da Bienal de Dança de Veneza se recusou a censurar o espetáculo e afirmou que não há intenção de provocar.

“Nosso objetivo principal é garantir a liberdade de idéias e de formas expressivas”, diz um comunicado da entidade, cujo diretor artístico é o bailarino brasileiro radicado na Alemanha Ismael Ivo.

“Nunca pensei que um espetáculo sobre eros e corpo fosse causar tanta reação em pleno 2007. Parece que a civilização ocidental está voltando à Idade Média, ao tempo da caça às bruxas”, disse Ivo à BBC Brasil.

O bailarino explicou que Messiah Game faz parte do 5° Festival Internacional de Dança Contemporânea da Bienal, encerrando uma trilogia sobre o corpo que começou três anos atrás.

A última parte da trilogia chama-se Corpo e Eros. O tema foi desenvolvido por 15 companhias de dança de vários países, com a participação de 31 artistas, entre bailarinos e coreógrafos, e explora o corpo como um organismo sensorial, as emoções e a sensibilidade.

Segundo Ismael Ivo, “o filho de Deus que se fez homem se apropriou não só do senso divino, mas também do senso humano, que inclui todo o tipo de sensibilidade”.

Na sua opinião, Messiah Game tem qualidade de movimento indiscutível e propõe uma releitura de partes do Evangelho de uma forma controversa, mas não do ponto de vista sexual.

“Erotismo não significa exatamente sexualidade, nem pornografia, mas sensibilidade”, disse Ismael Ivo.

Ele não concorda com a imprensa italiana, que define o espetáculo como uma versão ‘sadomasoquista’ da Paixão de Cristo, e considera a censura inaceitável.

“Colocamos este trabalho no programa por seu valor artístico, que não pode se discutir, mas tem espaço para o confronto. Por que as pessoas têm medo de se confrontar com um espetáculo de dança e dizer não?”

Para o coreógrafo Felix Ruckert, a polêmica é “um pretexto para a imprensa criar conflitos e para a Igreja se apresentar como protetora da moral publica”.

Fonte: BBC Brasil

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