Ouvir as badaladas dos sinos do Vaticano ou do Mosteiro de São Bento de São Paulo na igreja católica do bairro está se tornando cada vez mais comum. A mágica é possível graças a um sistema de sinos eletrônicos que reproduz, por meio de alto-falantes, os sons das badaladas originais.

Muitas igrejas no país têm aderido aos sinos eletrônicos pelo alto preço dos convencionais e por outros inconvenientes desses elementos como o fato de exigirem a construção de uma torre e possuírem uma manutenção cara. Há ainda igrejas que mesmo tendo os sinos de bronze usam os eletrônicos por serem mais práticos, como é o caso da Paróquia São Cristóvão, no município de Cabo Frio, litoral do Rio de Janeiro.

De acordo com as principais empresas que comercializam esses sistemas no país, a demanda aumentou no último ano. A Orion Brasil, sediada no Rio de Janeiro, diz que a procura cresceu 20% este ano em relação ao ano passado. A Dynavox, do Espírito Santo, que revende os sinos eletrônicos da Belltron, uma empresa italiana, diz que também registrou crescimento nas vendas, mas não revela os números.

O mecanismo eletrônico permite que os padres programem que tipo de badalada deve ser tocada e em qual intervalo de hora. “O automático é mais barato, mais moderno e mais prático que o convencional”, atesta o padre Javier Mateo, 68, pároco da igreja Nossa Senhora do Carmo, em Santos, litoral norte de São Paulo.

Nascido e criado na Espanha, onde escutou muito o som de sinos tradicionais, padre Javier diz que gosta dos “artificiais” também. “A imitação é muito boa, as pessoas nem desconfiam”, conta. O prédio da igreja Nossa Senhora do Carmo é de 1966 e não possui torre, o que dificulta a colocação de sinos de bronze.

Esse também é o problema da paróquia de Santo Antônio do Caxingui, na Zona Oeste da capital paulista. A igreja não tem torre, nem nunca teve um sino. Para fazer com que a comunidade tivesse a experiência de ouvir sons de sino, o pároco Alfredo Veiga, 44, comprou, há dois anos, um sino eletrônico.

“É um sistema computadorizado, bem mais simples que o tradicional”, avalia. “A função do sino é mostrar a presença da igreja no meio da cidade e serviu para isso. As pessoas adoraram e tem gente que pára para rezar quando ouve a Ave Maria”, conta o padre. No Caxingui, as badaladas eletrônicas soam na melodia da Ave Maria ao meio-dia e às 18h. Já aos domingos, os sinos tocam badaladas diferentes antes da missa e na hora da celebração.

Moderno x tradicional

Para uma das freqüentadoras da igreja do Caxingui, a dona-de-casa, Glória Maria de Paula Souza, 66, o som do sino natural é mais bonito, mas a tendência da sociedade é adotar elementos mais modernos. “Dá para perceber algo mais eletrônico [no som], mas acho que ele representa o perfil do mundo moderno. Além do que o som chega muito mais longe”, afirma.

O funcionário de um estacionamento ao lado da igreja, Gil Rios Carneiro, 33 anos, concorda com Glória. “Acho que o antigo é mais tradicional, mas as coisas vão se modernizando e esse tem um som mais certinho”, opinou.

Sergio Pontiggia, um dos sócios da Dynavox, diz que graças à tecnologia o som do sistema tem uma qualidade muito próxima das badaladas verdadeiras. “Só um ouvido muito bem treinado reconhece [que não se trata do aparato de bronze]”.

Já para o relojoeiro Fábio Fonseca, que faz manutenção em sistemas de sino de bronze, o som do eletrônico é muito diferente. “Acho esquisito. As cornetas [usadas para propagar o som] não reproduzem o som grave das badaladas, só dá para ouvir o agudo e fica uma coisa irritante”, comenta.

Segundo Fonseca, a maior parte das igrejas construídas a partir da década de 60 não possuem torres, o que dificulta a colocação de sinos. Ele reconhece que o toque eletrônico sai bem mais em conta do que o convencional. De acordo com o relojoeiro, um quilo de bronze custa cerca de R$ 50, o que torna caro um sino de 300 quilos, adequado para uma igreja mediana. “É mais caro comprar os [convencionais], mas fazer o restauro não sai tão custoso”, diz ele, no caso dos templos que já possuem os exemplares de bronze. De acordo com Fonseca, a crise dos sinos fez com que as fundições desses aparelhos quase desaparecessem do país e hoje restam poucas.

Ouvido a quatro quilômetros

Para poder fazer ecoar o som do sino a quilômetros de distância, o equipamento conta com cornetas que são colocadas no teto da igreja. Em geral são usadas quatro, cada uma voltada para um ponto cardeal: norte, sul, leste e oeste. A capacidade de alcance varia de um quilômetro e meio a quatro quilômetros, se não houver obstáculos que impeçam a propagação do som, garantem os fabricantes.

O sistema pode conter as músicas já na memória ou ter as tocadas armazenadas em um CD. O preço vai de R$ 3,6 mil a R$ 15 mil. Há uma diversidade grande de tipos de badaladas e melodias como cantos natalinos, de adoração, marcha fúnebre, canções religiosas em geral, além dos sons de sinos famosos como os do Vaticano e do Mosteiro de São Bento. Mas há também os padres que não podem investir na aquisição e simplesmente compram um aparelho de som e um CD com a reprodução das badaladas.

A programação de como o sistema deve funcionar é feita por cada igreja e, segundo as empresas, se mantém sem alteração durante pelo menos dez anos. Caso o padre queira mudar algum dia, é só reprogramar o equipamento.

De acordo com Pontiggia, as igrejas que ficam nas cidades menores compram mais o sistema que as paróquias dos grandes centros, porque a população está mais acostumada a ouvir sinos. “Nas grandes cidades, as pessoas costumam dormir até tarde e reclamam do barulho do sino”, comenta.

Fonte: G1

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