Você acredita em Deus? O que acontecerá com você depois da morte? Você ora? Você acha que os fiéis religiosos são iludidos? A maioria dos entrevistados ficou igualmente confusa. Alguns poucos, incluindo Hillary Clinton e Condoleezza Rice, se recusaram a ser entrevistados.

Muitas pessoas hesitariam em levantar tais perguntas em um jantar. Antonio Monda, por outro lado, as fez por vários anos para eminências culturais como Saul Bellow, Toni Morrison, Salman Rushdie, Daniel Libeskind, Derek Walcott, Spike Lee, Jonathan Franzen, David Lynch e Martin Scorsese.

Quando Monda entrevistou Grace Paley dois anos antes de sua morte em agosto, ela perguntou por que ele queria falar sobre religião e a posição dela a respeito. “Eu acho que é o assunto mais importante de nosso tempo”, ele disse. “Mais precisamente, é o mais importante de todos os tempos.”

Ela reagiu: “Você está falando sério?” A conversa entre eles abre uma das mais comoventes das 18 entrevistas de “Do You Believe? Conversations on God and Religion” (você acredita? Conversas sobre Deus e religião), recém-publicado pela Vintage em formato paperback original.

A maioria dos entrevistados por Monda -e seu livro também inclui entrevistas com Jane Fonda, Elie Wiesel, Paul Auster, Michael Cunningham, Richard Ford, Nathan Englander, Paula Fox e o falecido Arthur M. Schlesinger Jr.- ficou igualmente confusa com seu interesse. Mas apenas alguns poucos, incluindo Hillary Rodham Clinton e Condoleezza Rice, se recusaram a ser entrevistados.

Monda, 46 anos, se mudou para os Estados Unidos em 1994 e leciona no departamento de cinema e televisão da Universidade de Nova York. Ele também é correspondente cultural americano para o jornal italiano “La Repubblica”, onde publicou cinco destas entrevistas em 2003, começando com “talvez o nome mais atordoante, Saul Bellow”, ele disse em uma conversa no mês passado. “Minha idéia era de que se conseguisse Saul Bellow, seria mais fácil procurar as outras pessoas e dizer: ‘Saul Bellow concordou’.”

Bellow foi um dos cinco entrevistados que responderam sim para o que Monda chama de “questão fundamental”: se acredita que Deus existe. Seis responderam não. Sete ficaram em um território intermediário.

Todas são pessoas inteligentes o bastante para saber que definir Deus não é um assunto simples. Os que ficaram no meio foram particularmente aptos em falar do mistério. Alguns, como Franzen, usaram linguagem que se inclinava na direção de Deus:

“Deus não é como um executivo-chefe sentado em um painel de controle, comandando todas as ações”, ele disse. “Ao mesmo tempo, eu acho que há uma realidade sob o que podemos ver com nossos olhos e experimentar com nossos sentidos. Há essencialmente algo misterioso e imaterial a respeito do mundo. Algo grande, espantoso, eterno e não conhecível.”

Spike Lee falou de “um ser superior” e uma “presença superior”, “mas não sei se posso chamar de Deus”.

Outros, como Rushdie e Paley, foram bem claros que o “mistério” que afirmavam não era de forma alguma transcendental ou sobrenatural. Quando Englander, cujos contos premiados refletem a rebelião contra sua criação judaica ortodoxa, foi perguntado sobre se acreditava em Deus, ele respondeu: “Eu me inclinaria a dizer não se não temesse a ira de Deus”.

Walcott respondeu: “Eu acredito que eu acredito”. Scorsese pareceu muito mais certo sobre sua crença no catolicismo do que em sua crença em Deus. E meditando sobre os mistérios da física contemporânea, Cunningham disse: “Se você acredita na física, não é realmente um grande salto dizer que você acredita em Deus. Algum tipo de deus”.

Temas comuns estão presentes nas conversas. O fundamentalismo é ruim. Atrocidades foram perpetradas em nome da religião. A arte em si (a literatura, o cinema) é um chamado quase religioso. Jesus foi um grande “pensador” em vez de um redentor. Quanto à religião organizada, ninguém tem uma palavra boa sobre ela.

Parte disto é previsível, ocasionalmente até banal, apesar de neste sentido não necessariamente falso. Talvez haja conforto na descoberta de que líderes culturais nutrem os mesmos lugares-comuns sobre religião que todo mundo.

O próprio Monda defende as instituições religiosas, apesar de ser rápido em reconhecer seus crimes, e entende por que muitas pessoas temem a religião. Ele não disfarça seu próprio ponto de vista, o de um católico (“apostólico romano” ele está habituado a acrescentar) praticante. “Uma das coisas que tentei expressar no livro é que há uma forte diferença entre ortodoxia e fundamentalismo”, ele disse. Ele vê a ortodoxia -e não apenas em seu catolicismo- como equilibrada, freqüentemente de forma precária, entre um fundamentalismo perigoso à sua direita e um “culto Nova Era pessoal”, vago, não exigente, à sua esquerda.

“Ortodoxia é uma palavra muito arriscada”, ele reconheceu. “No momento em que você diz ortodoxia, as pessoas acreditam que você é um fanático.”

É difícil imaginar alguém considerando Monda um fanático. Ele tem o dom de apresentar um argumento, então recuar e permitir que os outros exponham o seu. Estas são entrevistas altamente destiladas, mas a edição reflete um respeito escrupuloso pelos entrevistados.

Respeito evidentemente gera respeito. Monda é um cineasta e crítico de cinema que amadureceu em um meio intelectual fortemente marxista. Ele é correspondente de um jornal italiano com reputação anticlerical. Ele habita mundos culturais que freqüentemente exibem um espírito anti-religioso. Então, como ele é recebido?

“Honestamente, com grande respeito e também curiosidade”, ele disse. “Eu sou percebido como uma pessoa com idéias estranhas, talvez interessantes.”

Nada ilustra isto melhor do que o que se seguiu após ter perguntado a Paley: “Você acha que existe vida após a morte?”

Ela respondeu: “Obviamente não”, acrescentando, “e uma mulher de 83 anos está lhe dizendo isto, ciente de que não tem muito tempo de vida”.

E então, invertendo o papel com Monda, ela perguntou: “E o que há para você após a morte?”

Ele respondeu: “A verdadeira vida”.

“E o que é esta vida que estamos vivendo neste momento?”, ela prosseguiu.

Ele respondeu: “Uma passagem e uma dádiva”.

“Sabe”, ela concluiu, “esta é uma idéia que me interessa, porque é muito diferente daquilo em que acredito”.

Fonte: The New York Times

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