“Tapa na Cara” pode; “Tapinha”, não. Esse é o entendimento da Justiça Federal de Porto Alegre, que condenou a produtora Furacão 2000 Produções Artísticas -responsável pelo funk “Tapinha”, do refrão “Tapinha não dói”, sucesso de Mc Naldinho e Bella Furacão em rádios e casas noturnas do país no começo da década- a pagar R$ 500 mil por danos morais às mulheres.

Na mesma decisão, no entanto, eximiu de responsabilidade a Sony Music pela música “Tapa na Cara”, do grupo Pagodart, lançada pela gravadora em CD.

A ação foi movida pelo Ministério Público Federal a pedido da ONG Themis – Assessoria Jurídica e Estudos de Gênero, de defesa às mulheres.

De acordo com a ONG, ambas as letras das músicas eram “ofensivas à dignidade da mulher”, “influenciavam o cotidiano das pessoas” e “banalizavam a violência”, além de serem discriminatórias e de legitimarem a violência masculina.

A Themis pediu também a condenação da União por permitir a difusão das músicas.

Queria que a União fosse condenada a cumprir um artigo da Convenção de Belém (PA) para promover a “inclusão, nos contratos de concessão de exploração dos meios de comunicação, de cláusulas específicas que importem em observância dos parâmetros de erradicação da violência e promoção da dignidade da mulher”.

A Justiça, entretanto, condenou apenas a Furacão 2000.

“Artística”

Para o juiz Adriano Vitalino dos Santos, o tapa descrito no funk provocava dor física e abalo psíquico.
Na outra canção, o tapa era uma manifestação “artística” que aborda o masoquismo.

De acordo com o juiz Santos, a música “Tapinha” (Se te bota maluquinha/Um tapinha eu vou te dar porque: Dói, um tapinha não dói), de Mc Naldinho e Bella Furacão, descreve uma situação de um gesto humilhante.

“O “tapa” (…) evidentemente causa dor física na vítima, além do abalo psíquico decorrente da humilhação que o gesto em si constitui”, escreveu Santos na sentença.

Já sobre a música “Tapa na Cara” (Tapa na cara/Na cara mamãe/Se você quiser, ai eu vou te dar), o magistrado afirmou que a letra “apenas relata um encontro amoroso entre um homem e uma mulher, que implora ao parceiro para que lhe dê tapas durante o ato sexual”.

“Na esfera privada, é vedada a quem quer que seja, Estado ou particular, a intromissão sem consentimento.”

A ação tramitava na Justiça Federal em Porto Alegre desde 2003. A sentença foi proferida em Mafra (SC), em 19 de fevereiro, durante um mutirão da Justiça.

Omissão

Rúbia da Cruz, coordenadora da ONG Themis que elaborou a representação que deu origem à ação na Justiça, afirma que vai recorrer da decisão que absolveu a Sony Music e a União.

Para a entidade, o Estado se omitiu ao permitir a veiculação pelo país de duas músicas com conteúdo que ofende as mulheres. Rúbia da Cruz, porém, diz que foi surpreendente o valor que a Furacão 2000 acabou condenada a pagar.

A Folha procurou o juiz Adriano Vitalino dos Santos para comentar a decisão, mas foi informada, em seu gabinete, que tudo o que ele poderia informar constava da sentença.

Fonte: Folha de São Paulo

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