O Ministério Público e a Corregedoria-Geral da Polícia Civil investigam pelo menos quatro peritos do Instituto de Criminalística (IC) de São Paulo suspeitos de vender laudos que beneficiariam o Consórcio Via Amarela, responsável pela construção de uma linha do Metrô, e a Igreja Renascer em Cristo, onde o teto do templo no Cambuci caiu, em janeiro de 2009, causando 9 mortes (foto).

Ao menos quatro peritos do IC (Instituto de Criminalística) de São Paulo estão sendo investigados pela suspeita de fraude em laudos que beneficiariam o Consórcio Via Amarela, que constrói uma linha do metrô, e a Igreja Renascer em Cristo.

As investigações são conduzidas pelo Ministério Público do Estado e pela Corregedoria-Geral da Polícia Civil e surgiram depois que o Gaeco (grupo especial do Ministério Público de combate ao crime organizado) identificou incongruências nas conclusões feitas pelos peritos no caso do metrô.

Nem a Promotoria nem a Corregedoria da Polícia Civil deram detalhes da investigação sob o argumento de que a divulgação poderá prejudicar a apuração dos casos.
As suspeitas apontam que laudos reduziriam a responsabilidade do consórcio pelo acidente na obra do Metrô em Pinheiros, que deixou sete mortos em janeiro de 2007, e da Renascer, em razão da queda do teto do templo no Cambuci, onde nove pessoas morreram e centenas ficaram feridas em janeiro do ano passado.

Investigação

Os laudos do IC são um dos itens da investigação da polícia para apurar a responsabilidade criminal dos envolvidos, a exemplo do que ocorreu no júri do caso Isabella Nardoni.

Pelo Ministério Público, a investigação de fraude pericial é conduzida em duas frentes: Promotoria do Patrimônio Público, que apura improbidade administrativa dos funcionários, e pelo Gaeco. Na Corregedoria, além de sindicância, há um inquérito de improbidade.

Na lista dos investigados está o perito José Domingos Moreira das Eiras. Ele foi, até dezembro do ano passado, o diretor-geral do Instituto de Criminalística e foi afastado após a suspeita de fraudes em concursos do IC revelada pela Folha.

Também são investigados os peritos Edgard Engelber, Henrique Honda e Jaime Telles. Telles assina ambos e Engelber, assina o laudo do metrô, mas nenhum dos órgãos divulgou porque Honda foi incluído no caso, já que não assina nenhum dos dois laudos sobre os acidentes.

Documento desprezado

As suspeitas no caso do metrô ganharam força depois do surgimento de dúvidas sobre a qualidade e a veracidade das informações dos peritos.

Isso levou a Promotoria a desprezar o documento na denúncia apresentada à Justiça contra diretores e funcionários do Consórcio Via Amarela (integrado pelas empresas CBPO [grupo Odebrecht], OAS, Queiroz Galvão, Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez e Alstom e do Metrô.

Em junho do ano passado, reportagem da Folha revelou que promotores e peritos do próprio Instituto de Criminalística, sob a condição de anonimato, diziam que havia informações falsas que amenizavam a responsabilidade dos diretores do Consórcio Via Amarela pelas mortes.

Agora, o processo corre o risco de ser anulado pelo Tribunal de Justiça a pedido da defesa.

Já as “considerações finais” do laudo que apurou as causas do acidente do teto da Igreja Renascer praticamente descartam qualquer culpa da igreja pelas mortes e não citam o nome da instituição. Cópia desse documento é até disponibilizada em link do site da assessoria de imprensa da Renascer.

Os peritos do Instituto de Criminalística apontaram, no trecho final do documento, que houve responsabilidade da empresa Etersul, que havia realizado uma reforma no telhado, do Corpo de Bombeiros e da Prefeitura de São Paulo, por conta da falta de inspeções na segurança da estrutura. Mas em nenhum momento citam se houve falha da direção da Renascer em não fazer a manutenção do local.

Nem sabemos quais são os problemas, afirma perito

O perito do IC Jaime Telles disse à Folha que desconhece as suspeitas que recaem sobre ele e que já tentou obter detalhes da investigação, sem sucesso. “Só me responderam que está sob sigilo. Nem eu nem meus colegas tivemos acesso aos dados. Não sabemos quais são os problemas, se técnicos ou de qualidade.”

Segundo ele, que atuou no laudo do metrô, a perícia do IC foi confiável a ponto de ter sido usada em uma das ações movidas pelo Ministério Público. “Trabalhamos um ano e quatro meses nesse caso. Boa parte do nosso laudo, uns 80%, foi “copia e cola” do laudo do IPT”, diz.

O IPT também elaborou um laudo, que baseou a denúncia do Ministério Público.

O perito declarou ainda que, em todas as situações, sempre seguiu orientações superiores. “Me limitei a fazer aquilo que meus diretores mandaram fazer”, declarou Telles.

O perito afirmou que, durante os trabalhos do laudo, jamais escondeu informações. “Sempre tentei ser o mais transparente possível.”

Na época das investigações sobre o acidente do metrô, segundo Telles, o IC “não tinha suporte técnico” para fazer um trabalho mais adequado às dimensões do caso.

A respeito do laudo da Renascer, o perito afirmou que não teve quase nenhuma participação. “Não participei de nada. Fiz só a revisão do laudo.”

Os peritos Edgard Engelber e Henrique Honda diseram, por meio da assessoria da Secretaria da Segurança, que não queriam se manifestar.

A Secretaria da Segurança disse não ter conseguido localizar ontem o perito José Domingos Moreira das Eiras para que ele pudesse se manifestar.

A pasta não informou se os peritos serão afastados das funções até o término da investigação da Corregedoria.

A assessoria de imprensa da Igreja Apostólica Renascer em Cristo se limitou a dizer ontem que “não tem nenhuma informação” sobre a suposta venda do laudos elaborado por peritos do IC (Instituto de Criminalística) sobre a queda do teto do templo no Cambuci.

Em razão disso, a instituição afirma, em nota enviada à Folha, que “não há condições, portanto, de se manifestar sobre” as investigações em curso.

O Consórcio Via Amarela, por meio de sua assessoria, disse “que até o momento não tomou conhecimento oficial, via órgãos competentes, sobre a questão citada pelo jornal e por isso não pode se manifestar”.

Fonte: Folha de São Paulo

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