Uma comitiva de sacerdotes do candomblé diz ter sofrido discriminação religiosa ao embarcar em um voo da Gol no Aeroporto de Congonhas, na Zona Sul de São Paulo. Segundo eles, uma funcionária impediu que levassem uma pedra considerada sagrada dizendo que o objeto era usado para matar galinhas. A companhia, porém, nega discriminação e diz que o grupo é que se atrasou para despachar a bagagem.

O incidente ocorreu no sábado (4), quando o grupo, que incluía Mãe Carmem de Oxum (fundadora de um dos mais antigos e tradicionais terreiros de candomblé de São Paulo, o Ilê Olá Omí Asé Opô Araká), passava pelo raio-X do aeroporto para, em seguida, embarcar para Maceió.

Segundo Mãe Carmem, que tem 65 anos, uma funcionária da Gol questionou o que levavam dentro de uma caixinha de madeira. O grupo respondeu que era a otá, uma pedra arredondada, sem pontas e de aproximadamente 100 gramas que, segundo o candomblé, abriga a força sagrada de um orixá. Os quatro integrantes da comitiva estavam vestidos com as roupas típicas do candomblé.

Não convencida, a funcionária teria recorrido a um agente da Polícia Federal do aeroporto. A líder religiosa conversou com ele: “Eu comecei a explicar novamente que somos de uma religião de matriz africana e que o objeto era importante para nós, mas ele me interrompeu rispidamente e disse: ‘Antes de qualquer explicação, coloca isso dentro de uma mala para vocês despacharem’”.

De acordo com Mãe Carmem, mesmo com a sugestão do policial, a funcionária se negou a permitir o despacho do objeto e acrescentou: “A pedra não vai. Esse pessoal utiliza para matar galinha”. Ela orientou a comitiva a conversar com outro funcionário.

“Foi muito tumultuado. Eles dificultavam, diziam que não embarcaríamos com ‘aquilo’ e meu filho questionava a funcionária sobre o porquê de estar alterada. Eles respondiam que estávamos atrasando todo o processo e sugeriram que colocássemos a pedra no descarte”, contou Mãe Carmem.

“Muito constrangidos e pressionados a tomar uma decisão, optamos por deixar o otá para não faltar ao nosso compromisso, nem ter que pagar por novas passagens”, explicou.

[b]Outro lado[/b]

Questionada, a Gol Linhas Aéreas disse em nota que não houve discriminação e que o grupo é que se atrasou para despachar as bagagens, por isso a confusão. “Ao passarem pela inspeção de segurança do aeroporto, os clientes foram informados que não poderiam embarcar com os pertences. Eles retornaram ao balcão de atendimento da companhia para tentar despachar os objetos, não sendo possível, já que o voo havia sido encerrado.”

Ainda segundo o comunicado, “a companhia ofereceu a remarcação do bilhete, mas os clientes optaram por seguir viagem e deixar os pertences no aeroporto”, “preza pelo respeito aos clientes e condena qualquer ação que viole os direitos dos cidadãos”.

O Aeroporto de Congonhas também defende que o grupo chegou atrasado e diz que os Agentes de Proteção da Aviação Civil (Apacs) orientaram a comitiva “despachar os itens, não tendo sido registradas indicações para descarte de nenhum dos objetos apresentados”.

O advogado de Mãe Carmem, Hédio Silva Júnior, ex-secretário da Justiça do Estado de São Paulo, estuda entrar com uma ação judicial. “A legislação não proíbe o despacho ou embarque de pedras. Muitas pedras ornamentais, por exemplo, são transportadas de avião. Ela não está entre os itens vedados”, explicou. “Os funcionários da Gol passaram 10 ou 15 minutos humilhando o grupo.”

Mãe Carmem diz não ter dúvidas de que houve discriminação: “Foi um absurdo. Fomos humilhados e tivemos nosso sagrado violado. Não se mata galinhas com esta pedra. Nós cultuamos a natureza com ela. Isso é milenar. É africano. É a nossa tradição.”

[b]Fonte: G1[/b]

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