Feliz Dia das Mães! Vamos celebrar o Dia das Mães com todas as flores e almoços que pudermos. Só o dinheiro que os norte-americanos gastarão em cartões de Dia das Mães hoje –cerca de US$ 670 milhões– salvaria a vida de muitos milhares de mulheres e crianças.

E deixe-me esclarecer: sou a favor de flores, almoços suntuosos e qualquer outro presente de agradecimento para as mães e outras deusas.

Deixe-me também acrescentar que sua mãe –sim, estou falando diretamente para você, leitor– é especialmente merecedora. (Assim como a minha mãe, assim como a minha mulher. E a minha sogra!)

E como tantas pessoas sentem o mesmo, cerca de US$ 14 bilhões serão gastos nos Estados Unidos este ano, de acordo com a Federação Nacional de Vendas. Isso inclui US$ 2,9 bilhões em refeições, US$ 2,5 bilhões em joias e US$ 1,9 bilhões em flores.

Para se ter ideia, essa quantia é suficiente para pagar pela educação primária de todas as 60 milhões de meninas em todo o mundo que não frequentam a escola. Isso praticamente acabaria com o analfabetismo feminino.

Esses números são vagos e incertos, mas parece que ainda haveria dinheiro suficiente para programas que reduzissem em três quartos as mortes durante o parto, salvando cerca de 260 mil vidas de mulheres por ano.

Talvez houvesse ainda dinheiro suficiente para tratar dezenas de milhares de jovens mulheres que sofrem uma das coisas mais terríveis que pode acontecer a uma pessoa, um problema decorrente do parto chamado fístula obstétrica. As fístulas fazem com que as mulheres percam o controle da urina e das fezes, transformando-as em párias –e esses ferimentos normalmente podem ser reparados com uma operação de US$ 450.

Então vamos celebrar o Dia das Mães com todas as flores e almoços que pudermos: não há motivo para se sentir culpado por exagerar nos mimos para compensar os 365 dias que as mães trabalham exaustivamente. Mas vamos pensar também em mudar o significado do Dia das Mães, para que seja uma data que não homenageie apenas uma mãe em especial, mas que seja uma ocasião para tentar ajudar outras mães do mundo inteiro.

Estranhamente, para uma cultura que celebra a maternidade, nós nunca fomos especialmente interessados pela saúde materna. Os Estados Unidos estão em 41º lugar entre os países com maior mortalidade materna, de acordo com um relatório da Anistia Internacional, ou em 37º de acordo com um novo e abrangente estudo do jornal médico “The Lancet”, para citar duas fontes de dados. De acordo com os dois conjuntos de estatísticas, as mulheres norte-americanas têm duas vezes mais chances de morrer na gravidez ou no parto do que as mulheres europeias.

Uma amiga minha de Nova York, uma jovem mulher que cuida de sua saúde e chegou até mesmo a trabalhar com assuntos ligados à saúde da mulher, quase se juntou às estatísticas no mês passado. Ela teve uma gravidez ectópica [fora do útero] e só descobriu quando a trompa de falópio se rompeu e ela quase morreu.

A mortalidade materna é bem mais comum na África e na Ásia. No Níger, oeste da África, cerca de uma em cada sete mulheres corre o risco de morrer de complicações na gravidez. As mulheres lá normalmente não podem ir ao médico se o marido não der seu consentimento expresso –então, se ele estiver a 100 quilômetros de distância quando ela tiver complicações no parto, ela pode simplesmente morrer em casa.

No 50º aniversário da pílula, também vale a pena observar que o controle de natalidade é uma excelente forma de reduzir as mortes no parto. Se o número de mulheres grávidas fosse reduzido pela metade nos países pobres, haveria metade do número de mortes maternas.

Certamente é possível evitar que as mulheres morram durante o parto, e alguns países pobres –como o Sri Lanka– fizeram um bom trabalho para reduzir a mortalidade materna. Mas em muitos países, as vidas das mulheres não são prioridade.

Não há uma solução mágica para acabar com a mortalidade materna, mas conhecemos ações que fizeram uma grande diferença em alguns países. A lei bipartidária que será apresentada este ano pela congressista Rosa DeLauro do Connecticut tem como objetivo que os Estados Unidos adotem esses métodos comprovados para combater as fístulas obstétricas e para melhorar a saúde materna como um todo.

Só o dinheiro que os norte-americanos gastarão em cartões de Dia das Mães hoje –cerca de US$ 670 milhões– salvaria a vida de muitos milhares de mulheres. Muitas organizações fazem um trabalho maravilhoso nessa área, de gigantes como a Care até o minúsculo Hospital Maternidade Edna em Somaliland. A Women Deliver e a White Ribbon Alliance for Safe Motherhood fazem um importante trabalho de defesa da mulher. E a Fistula Foundation e o Worldwide Fistula Fund ajudam mulheres que têm fístulas obstétricas.

Assim, se uma das formas de celebrar o Dia das Mães é comprar flores para uma mãe em especial, a outra é tornar esse planeta mais seguro para as mães em geral. E como os homens estarão preocupados em comprar flores, talvez as próprias mulheres possam trabalhar para tornar a maternidade menos letal.

Outro dia recebi uma carta de uma mulher em Connecticut, Eva Hausman, que ficou tão horrorizada quando soube das fístulas obstétricas que mandou um e-mail para seus amigos e pediu que eles contribuíssem com pelo menos US$ 20. Ela já conseguiu levantar US$ 9 mil para a Fistula Foundation.

“A maioria das contribuições foram acompanhadas de cartas de agradecimento”, ela me disse. Quando as pessoas agradecem a você por terem a oportunidade de doar isso significa que a causa é verdadeiramente comovente –e uma bela forma de celebrar o Dia das Mães.

Escrito por Nicholas D. Kristof
Tradução: Eloise De Vylder
Fonte: The New York Times

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