O Santo Daime, religião criada no Brasil e que tem como base o consumo da planta alucinógena ayahuasca, está ganhando cada vez mais adeptos na Grã-Bretanha, segundo afirma reportagem publicada nesta terça-feira pelo caderno de cultura do jornal britânico The Times.
Segundo a reportagem, o número de britânicos adeptos do Santo Daime estaria em algumas centenas e crescendo “apesar de um obstáculo óbvio – o princípio ativo da ayahuasca, dimetiltriptamina (DMT), é uma droga classificada como classe A (classificação do governo britânico para as drogas mais pesadas)”.
O texto observa que os seguidores do Santo Daime na Grã-Bretanha se encontram de maneira secreta, temerosos de possíveis batidas policiais.
“Eles praticam a religião em suas casas, em centros comunitários, escolas e salões de igreja, muitas vezes dizendo aos anfitriões que precisam do local para um ensaio de coral”, diz o Times. “Eles nunca anunciam os encontros, e os novos membros somente podem participar por convite.”
“Mas entre aqueles em busca de uma iluminação espiritual – e entre os ‘new-agers’ de fim de semana também – a novidade está se espalhando: os seguidores do Santo Daime afirmam que uma sessão com a ayahuasca é equivalente a cem horas de terapia”, comenta a reportagem.
Shangri-lá na Amazônia
O jornal enviou um repórter à comunidade do Céu do Mapiá, na Amazônia, que concentra 700 seguidores do Santo Daime, para “entender suas crenças e beber seu sacramento”.
Segundo o repórter, a comunidade é uma verdadeira “Shangri-lá” dos adeptos da religião, que “vivem seu sonho dentro da floresta”. “Porque aqui, assim como em todo o Brasil, o uso da ayahuasca em um contexto religioso é perfeitamente legal, tratado até mesmo com deferência por acadêmicos, políticos, pesquisadores médicos e teólogos”, diz o texto.
O jornal relata que “a Igreja do Santo Daime nasceu nos anos 1930 a partir das experiências de um seringueiro brasileiro chamado Raimundo Irineu Serra, ou Mestre Irineu, como os seus seguidores o chamam”.
No Acre, Irineu experimentou a ayahuasca, dada por xamãs indígenas, e “passou oito dias e noites sozinho na floresta, experimentando uma série de visões e recebendo instruções da Virgem Maria, a quem ele chamou de ‘Rainha da Floresta’, que formou a base de uma nova religião”.
A reportagem comenta que a religião criada por Irineu era “predominantemente cristã com uma ênfase na natureza – nos espíritos da floresta tropical – e sustentava o crescimento espiritual por meio do consumo da ayahuasca durante rituais cuidadosamente definidos”.
O jornal relata ainda que “os grupos do Santo Daime acreditam que a ayahuasca, ou Daime, como a chamam, é uma manifestação de Jesus Cristo que os traz para mais perto de Deus”.
“Suas visões, algumas vezes aterrorizantes, algumas vezes alegres, os ajudam a tomar consciência de si mesmos, de seu universo e de seu deus.”
Exportação
A reportagem afirma que os seguidores do Santo Daime no Brasil dizem produzir mensalmente em Céu do Mapiá 2 mil litros de chá de ayahuasca, enviados ao exterior pelo correio em pacotes marcados como “chá”.
Uma porta-voz do Ministério do Interior britânico, ouvida pelo jornal, afirma porém que o tráfico de DMT para a Grã-Bretanha é ilegal e pode resultar em uma pena de prisão de até sete anos.
“Questionada se os acusados não poderiam citar o artigo 9 da Convenção Européia de Direitos Humanos, que garante a liberdade de pensamento, consciência e religião, ela disse que seria uma questão para os tribunais”, diz o texto.
Fonte: Estadão