A Igreja Católica portuguesa contesta a possibilidade de mudança na lei que restringe a abertura de supermercados aos domingos e feriados, considerando que esses dias devem ser dedicados à família.

Atualmente, os grandes estabelecimentos comerciais portugueses são proibidos de abrir nas tardes de domingos e nos feriados entre janeiro e outubro.

O fechamento ou não dos supermercados nesses dias, seu horário de funcionamento e a possibilidade de as prefeituras decidirem estas questões estarão em debate no Parlamento português nesta sexta-feira.

Fátima Almeida, coordenadora nacional da Liga Operária Católica (LOC), defende que os domingos devem ser dias “dedicados ao encontro das famílias”, limitando-se ao máximo qualquer atividade laboral.

Os funcionários dos supermercados “também têm famílias”, disse Fátima Almeida, que aponta a excessiva precariedade do trabalho, os turnos rotativos e a falta de emprego como motivos para a perda da estabilidade familiar.

“Perdeu-se o domingo como espaço de encontro das famílias” e, embora “esses espaços comerciais sejam uma espécie de centros de culto” para os agregados familiares modernos, é preciso encontrar outras “soluções e novos espaços de diálogo, de partilha e de interajuda”.

Posição semelhante tem D. Januário Torgal Ferreira, bispo das Forças Armadas e ex-porta-voz da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP).

“O domingo é o dia da família”, em que deve haver o “cumprimento de valores sociais, como o descanso e a tranqüilidade que um trabalhador merece”, afirmou o bispo, rejeitando que a posição da Igreja tenha relação com a realização das eucaristias dominicais.

“Não renegamos os aspectos religiosos”, mas o que motiva esta posição é a necessidade de “encontro das famílias”, considerou D. Januário, que admite a abertura de supermercados apenas em “circunstâncias ou lugares” em que não exista opção à satisfação das “necessidades básicas”.

“O supermercado deve estar a serviço das necessidades das pessoas”, considerou o clérigo.

“Com bom senso e grande sensatez, as pessoas deveriam abrir os olhos”, até porque “não é uma questão religiosa”, mas sim o respeito da “dignidade humana”.

“É importante que um trabalhador tenha direito ao domingo”, defende o bispo, dizendo que “há uma razão história e social para o fim de semana ser um espaço de legítimo descanso”.

Propostas de lei

No centro da discussão estarão três projetos de lei: um do Partido Comunista Português (PCP), um do Bloco de Esquerda (BE) e outro do Partido Social-Democrata (PSD).

Em termos gerais, o BE defende o fechamento dos grandes estabelecimentos comerciais nos domingos e feriados por considerar que sua abertura “impossibilita o pequeno comércio, de proximidade, muitas vezes de caráter familiar, de poder competir com tais potentados de distribuição, levando ao inexorável decréscimo de clientes e ao conseqüente encerramento de muitas pequenas empresas de comércio varejista”.

Para o BE, a “proliferação” de grandes estabelecimentos comerciais em Portugal registrada nos últimos tempos teve ainda o “condão de tornar os centros das cidades e vilas vazios, sem comércio” e levou a que “centenas, ou mesmo milhares, de trabalhadores dessas grandes superfícies” vissem retirado “seu direito ao descanso em um dia que a generalidade das famílias portuguesas tem para fruição do seu lazer”.

Segundo o texto do Bloco, a lei não afetaria os shoppings, considerados um centro de lazer, “salvo se as superfícies de venda contínua sejam equiparáveis a hipermercados”.

Já o projeto de lei do PCP defende que os estabelecimentos de venda ao público e de prestação de serviços encerrem aos domingos e feriados, admitindo, contudo, que possam abrir “optativamente durante um máximo de 10 dias, domingos ou feriados por ano”, ou, no caso de estâncias turísticas, “durante um máximo de 16 dias”.

O PCP sustenta que a necessidade de uma regulação “diferente e equilibrada do horário de abertura das unidades de comércio é hoje incontornável”.

“Não para ‘fechar tudo’, mas para fazer do encerramento ao domingos a regra, com todas as exceções necessárias à vida da sociedade de hoje”.

Para o partido, o equilíbrio entre as grandes empresas e os pequenos comércios é “necessário para travar a desertificação dos centros urbanos e uma alteração significativa, quantitativa e qualitativa do emprego no comércio”.

Destoando das duas outras forças, o PSD considera a legislação que ditou o fechamento dos grandes estabelecimentos nas tardes de domingo e nos feriados “obsoleta” e, “em alguns casos, injusta” por causa da criação de espaços com um pouco menos de 2 mil metros quadrados, que facilmente ultrapassaram a limitação legal existente.

“Desregulamentar, liberalizar e descentralizar” são as palavras de ordem da proposta social-democrata, que defende que a última palavra cabe aos municípios por “proximidade e conhecimento direto” que têm da realidade.

Para o PSD, um regime de “horário de funcionamento com iguais limites para todo o território nacional tende a tratar de forma igual uma atividade que deve forçosamente desenvolver-se de forma diversa face aos interesses econômicos específicos presentes em cada localidade” e por isso defendem a possibilidade de os estabelecimentos de venda ao público e de prestação de serviços estarem abertos entre as 6h e as 24h todos os dias da semana.

O partido alega que, em certas localidades, a abertura sem restrição aos fins de semana pode ajudar a combater o desemprego, enquanto em outras regiões a proibição pode ser “a única forma de defender a sustentabilidade e a viabilidade econômica do comércio tradicional”.

Fonte: Lusa

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