Uma amostra dos obstáculos que a Igreja Católica terá para “lançar um chamado à conversão” aos “povos” da Amazônia -um dos objetivos da Campanha da Fraternidade deste ano- é encontrada na região de Autazes (112 km de Manaus).

Nessa cidade cinco vezes maior do que São Paulo, margeada por afluentes do rio Madeira, aldeias indígenas da etnia mura visitadas pela Folha recebem mais apoio religioso de outras denominações do que da Igreja Católica.

O avanço do catolicismo ali esbarra na falta de recursos materiais e humanos -a Funai (Fundação Nacional do Índio) estima que haja de 6.000 a 13 mil índios na região.

Para alcançar as 78 comunidades ribeirinhas da área, por exemplo, o único representante da Igreja Católica na região, o padre diocesano Jésus Lopes, 33, depende da boa vontade de índios e moradores, que cedem barcos para seu deslocamento.

“Dependemos de barcos de linha [transporte coletivo] ou que a comunidade se mobilize e nos busque. Quando isso não ocorre, eles [índios] ficam à mercê de falsas promessas. Infelizmente, assim é o rosto do Amazonas”, disse o pároco.

Apoio financeiro

Na última sexta-feira, a Folha visitou três aldeias da região, em um percurso de 90 km por estradas de terra batida. Na aldeia Sampaio, a 36 km da sede de Autazes, encontrou seis templos religiosos -um a cada 200 metros. São duas capelas católicas e dois templos de outras denominações -Batista, Adventista e as pentecostais Assembléia de Deus e Evangelho Quadrangular.

Na aldeia de 130 famílias, que vivem, principalmente, da mandioca, os grupos não-católicos têm trabalhos de evangelização de jovens e dão apoio financeiro para formar pastores.

A Igreja Católica foi a primeira a chegar na aldeia, em 1967. Perdeu terreno a partir de 1980, com a entrada da Igreja Adventista do Sétimo Dia, que converteu a maior parte dos índios e diz ter 44 membros efetivos na aldeia.

Um deles é o tuxaua (chefe político) geral da povoação, Antônio de Matos, 64. “No tempo em que era católico eu me aborrecia, nada era bom. Depois que passei a ser adventista, conheci muitas coisas que eu fazia errado, como beber, fumar e andar armado. A Bíblia é o caminho para endireitar a vida da gente.”

Na aldeia Josefa, de 60 famílias, predominam a Assembléia de Deus e a Adventista do Sétimo Dia. Minoria, os índios católicos não praticam a religião.

O tuxaua geral, Salatiel de Souza, 20, é da Assembléia de Deus. Disse que vai organizar um plebiscito se a Igreja Católica resolver abrir um templo na aldeia. “Os católicos daqui são poucos e não praticam. Se a Igreja Católica quiser abrir um templo aqui, é a população que vai decidir.”

Na aldeia Ferro Quente, não há igrejas. As 12 famílias são quase todas católicas, mas têm que percorrer 45 km até Autazes se quiserem ir à missa.

Campanha

O padre Jésus disse esperar que a Campanha da Fraternidade ajude o catolicismo a recuperar terreno na Amazônia. “Precisamos de pessoas que venham para o Amazonas com verdadeiro espírito missionário, porque aqui tem muito o que fazer”, afirmou.

Fonte: Folha de São Paulo

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