Os atos anti-semitas na Argentina cresceram 57,1% em um ano. Este é o dado mais preocupante do relatório do Centro de Estudos Sociais (CES) da Delegação de Associações Israelitas da Argentina (DAIA), braço político da comunidade judaica argentina.
Os números se referem ao ano passado, em comparação a 2005, e incluem de pichações, profanações de cemitérios e agressões físicas a declarações racistas. Foram 373 ocorrências no ano retrasado, 586 em 2006 e, desde o início deste ano, 190.
O caso mais recente ocorreu anteontem, quando o jovem Cristian Nieto, que usava uma camiseta com slogans antinazistas, foi espancado e esfaqueado por um grupo de neonazistas em San Martín, município da Grande Buenos Aires. Em 1998, quando a medição começou a ser realizada, foram registrados 90 casos. Isso indica um aumento de 600% em nove anos. Para alguns especialistas, o crescimento é relativo, já que, anos atrás, a denúncia desse tipo de prática ainda era algo novo na sociedade. Marisa Braylan, diretora do CES, afirmou ao Estado que “muitos atos nem são denunciados”.
O crescimento de pichações anti-semitas coincidentemente disparou no ano passado na época da guerra entre Israel e o Hezbollah. O vice-presidente da DAIA, Angel Schindel, explica que, antes, os casos eram protagonizados por integrantes de grupos nazi-fascistas. Mas, agora, são verificados também em parte de grupos de extrema esquerda. Segundo as autoridades da DAIA, “a Argentina não é um país anti-semita. Mas aqui existem grupos que estimulam o ódio racial”.
A Argentina possui a maior comunidade judaica da América Latina, com 300 mil pessoas. E a capital é o principal centro editorial de material de ideologia anti-semita na América do Sul. Obras com este perfil são vendidas abertamente em bancas de jornais, inclusive perto da Corte Suprema de Justiça e do Congresso Nacional. Na Rua Sarmiento, em pleno centro portenho, como pôde constatar o Estado, a dez quarteirões da Casa Rosada, uma loja vende estatuetas de oficiais da SS ostentando braçadeiras com a suástica ao preço médio de US$ 10.
Sérgio Wieder, diretor da divisão latino-americana do Centro Simon Wiesenthal, afirma que os grupos neonazistas são pequenos, mas seu potencial nocivo não deve ser desprezado. “O problema concentra-se nos grupos radicalizados de esquerda, aliados dos fundamentalistas islâmicos que voltam a falar sobre ?conspirações mundiais? judaicas”, disse ao Estado. “No Fórum Social de Porto Alegre apareceram grupos pró-Hezbollah com declarações anti-semitas. Recentemente, o presidente venezuelano Hugo Chávez disse que ?os descendentes dos que assassinaram Cristo agora querem todo o ouro do planeta, além da água, das terras e petróleo?”, acrescentou.
Precedentes históricos
Em 1918, Buenos Aires tornou-se cenário de um “pogrom”. Na ocasião, 179 judeus, a maioria de origem russa, foram massacrados por grupos nacionalistas de extrema direita nos bairros de Once e Villa Crespo. Os portenhos também presenciaram dois dos maiores atentados realizados na região – a explosão da Embaixada de Israel (1992) e da AMIA (1994). Ambos deixaram 114 mortos. O país também abrigou criminosos de guerra nazistas.
Até 1994, a Constituição determinava que o presidente da República devia ser católico de batismo. A Constituição foi reformada, mas isso não impediu que José Alperovich, eleito em 2003 governador de Tucumán, tivesse problemas com a Constituição provincial, que exigia juramento sobre a Bíblia no ato da posse. A controvérsia foi grande à época e foi preciso que a Corte Suprema garantisse sua posse. Além disso, jamais um judeu chegou ao posto de general nas Forças Armadas.
Fonte: Estadão