Embora se observem mudanças nos papéis e funções dos integrantes da família, as funções nucleares materna e paterna parecem preservadas quanto à sua importância, apontaram as psicólogas Marilene Marodin e Tânia Vanoni Polanczick.
Não existe sociedade que possa viver sem esses papéis, que são reatualizados, arrola a professora e pesquisadora Miriam Pillar Grossi, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Não existem mais funções divididas e como modelo único das responsabilidades de pai e de mãe.
“O que temos é uma transformação de papéis que antes eram ditos de pai e de mãe”, diz a pesquisadora em entrevista para o Instituto Humanitas (IHU), da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), que perguntou, na edição de sua revista desta semana, se “Ainda precisamos de pai?” No Brasil, o segundo domingo de agosto é destinado ao Dia dos Pais.
Hoje aparecem novas formas de paternidade que estão sendo exercidas pelos homens contemporâneos, acrescenta a professora da UFSC. Para o psicólogo Marcelo Spalding Verdi, de Porto Alegre, existe um novo discurso em relação à paternidade. “O ideal passou a ser um pai participativo, afetivo e com autoridade”, define.
Pai e mãe, afirma Spalding, exercem duas funções fundamentais do ponto de vista da constituição psíquica da criança: acolhimento e interdição. “A apropriação, pela criança, dos recursos que lhe permitirão interagir com a sociedade depende dessas funções”, lembra o psicólogo.
Acolhimento significa cuidados, apego, contato, nutrição, carinho, dedicação, conforto e totalidade. Já a interdição representa limites, corte, restrição, castração, ruptura, impedimento e falta. “Da experiência de acolhimento resulta uma confiança básica para estar no mundo, da interdição, o reconhecimento do outro e a condição para a autonomia”, explica.
Spalding afirma que a família continua sendo a célula básica da sociedade. Ele frisa, contudo, que nessa afirmação não tem qualquer conotação moral. A família “é a célula básica porque tem uma função, ainda sem substituto à altura, de operar a transição do bebê humano da natureza para a sociedade, por meio de intermediação da cultura”. O psicólogo destaca, ainda, que os papéis de pai e de mãe são muito relevantes, enquanto as estruturas familiares nem tanto.
Mesmo que as mudanças sejam inevitáveis, a paternidade deverá seguir associada à sua função de transmitir os códigos de acesso à cultura aos filhos, “entretanto cada vez mais desvinculados dos laços biológicos e dos valores masculinos como hoje os entendemos”, assinala o psicólogo.
A terapeuta de casal e família, a psicóloga Cláudia Valle Sigaran reforça esse entendimento. “O envolvimento emocional é maior do que um envolvimento genético. É o elemento emocional, o sentimento de amor que gera, genuinamente, uma responsabilidade e comprometimento mútuo entre pai e filho”, diz.
Isso significa que a parentalidade (termo que carrega a idéia de vínculo afetivo entre duas pessoas, ao papel dos pais) não exige, necessariamente, um vínculo sangüíneo entre as pessoas.
“Na família contemporânea, ter pai e mãe não deixou de ser importante. O que mudou é a consciência de que esta não é a única maneira de constituir uma família. O que importa é que, nas mais diversas configurações familiares, possa existir alguém que assegure a existência de um vínculo afetivo que dê conta das necessidades básicas para um desenvolvimento saudável da criança”, afirma Cláudia Sigaran.
As psicólogas Marilene Marodin e Tânia Vanoni Polanczik lembram que a vida moderna empurrou a mulher e o homem para a mesma luta, a da sobrevivência. Assim como a mulher ganha cada vez mais espaços fora da família, em todas as esferas da vida social, os homens têm conquistado mais e legítimos espaços dentro da família e da educação dos filhos.
O desmonte das proteções sociais, verificado hoje na esteira do processo de globalização, afeta as relações familiares. “O ideal de proteção à infância, que emergiu também na modernidade, vem sofrendo abalos, já que os pais, expostos ao desamparo social, não encontram suportes externos para sustentar sua atitude de cuidado com as crianças”, arrola a psicóloga Beatriz Gang Mizrahi.
Os pais tentam adaptar-se à precariedade e instabilidade, “um ideal do mundo do trabalho que não acompanha a necessidade de nossos filhos de constituírem conosco relações sólidas, onde haja espaços tanto para proximidade como para o conflito sem risco de ruptura”, alerta Mizrahi.
Fonte: ALC