Uma semana após um dos piores ataques contra cristãos iraquianos ocorridos em tempos modernos, muitos na comunidade consideram a possibilidade de deixar o Iraque.

O incidente ocorreu num domingo, quando um grupo de homens armados invadiu a Igreja da Nossa Senhora da Salvação, a maior igreja cristã de Bagdá, e tomou dezenas de fiéis que assistiam à missa como reféns.

Após horas de impasse, a polícia iraquiana, auxiliada por forças americanas, invadiu a igreja. Pelo menos 52 pessoas foram mortas e outras 56 ficaram feridas.

Com janelas destruídas e paredes danificadas por explosões e balas, a igreja já reabriu suas portas e alguns fiéis retornaram para assistir a mais um serviço religioso.

Mas enquanto a missa era celebrada em Bagdá, um importante clérigo iraquiano em visita a Londres, o arcebispo Athanasios Dawood, convocava cristãos iraquianos a abandonar o Iraque por causa dos perigos que ameaçam a comunidade.

“Se ficarmos, eles nos matarão”, disse ele à BBC, após falar a uma congregação de cristãos ortodoxos iraquianos durante uma missa na capital britânica.

“O que é melhor, fugir ou ficar? Ser morto ou ficar vivo? Mas quando eu digo a eles que saiam, meu coração está machucado”, disse Dawood.

Líderes da Igreja e políticos cristãos em Bagdá, no entanto, são unânimes em pedir à comunidade que fique.

”Testemunhas”

O bispo católico siríaco de Bagdá, Ignatius Metti Metok, disse que perdeu metade de sua congregação habitual no ataque da semana passada contra a sua catedral.

Ele disse que os fiéis lhe perguntam, “você quer que fiquemos após o que aconteceu? Pode acontecer de novo, e quem vai nos proteger?”

“Dizemos a eles, a Igreja é contra a emigração. Temos de ficar aqui, quaisquer que sejam os sacrifícios, para sermos testemunhas da nossa fé. Mas as pessoas são humanas e não podemos impedi-las de partir”.

Políticos cristãos ficaram furiosos com sugestões de que sua comunidade deveria ir embora, e de que países ocidentais deveriam abrir suas portas para cristãos em êxodo do Iraque.

“Esta é nossa casa, vivemos com os muçulmanos há séculos, este é nosso destino e vamos permanecer juntos”, disse o político cristão Yonadam Kanna, um influente membro do parlamento iraquiano.

“Isto é quase um paralelo com o que a Al-Qaeda está fazendo contra nós. A Al-Qaeda está tentando nos expulsar e vocês estão querendo me expulsar. Isto é contra meu interesse, contra o meu povo, contra o meu país”, disse Kanna.

Ele ficou particularmente indignado com o que acredita ser um plano do governo francês de convidar mil cristãos iraquianos para viver na França.

“Isto é contra os interesses dos cristãos, joga os muçulmanos contra nós e é um abandono dos valores europeus, que consideram pessoas enquanto seres humanos e não enquanto cristãos ou muçulmanos”.

Oferta de refúgio

Na segunda-feira, a embaixada francesa em Bagdá organizou voos de emergência para levar à França cerca de 40 feridos no ataque contra a igreja e alguns acompanhantes.

Mas o embaixador francês em Bagdá, Boris Boillon, ressaltou que a evacuação é motivada por razões médicas e humanitárias, e que a oferta de mil vistos a iraquianos em geral – e não apenas a cristãos – é parte de um programa europeu iniciado em 2008.

“A França tem uma longa tradição, de centenas de séculos, de oferecer refúgio a pessoas em perigo”, ele disse à BBC.

“Mas queremos que o Iraque mantenha sua identidade plural, e que a presença dos cristãos seja parte dessa identidade”.

Ainda assim, há temores de que o massacre na igreja resulte em outras ondas de emigração.

Fadya Issa está prestes a sair do país com o marido, os dois filhos jovens e a cunhada Samira. A família vai emigrar para os Estados Unidos.

Ela explicou que não se trata de uma decisão impulsiva motivada pelo ataque contra a igreja, mas admite que o incidente reforça sua decisão.

A família esperou dois anos por um visto americano.

Eles não conhecem os Estados Unidos e nunca viajaram de avião. Estão indo para a Califórnia, onde vive o irmão de Samira, mas não sabem exatamente onde. A família fala cerca de quatro palavras em inglês.

“Claro, é triste deixar sua terra natal, o lugar onde você nasceu e cresceu, e tudo o que você conhece”, disse Fadya.

“Mas o que podemos fazer? Aqui, você sente medo o tempo todo. Você sente medo em casa, quando leva as crianças para a escola, quando vai ao mercado. Onde quer que você vá, você está com medo”.

Não apenas cristãos

Os cristãos vivem no Iraque há cerca de dois mil anos, mas desde 2003 a comunidade vem se reduzindo dramaticamente. Não há dados oficiais, mas segundo estimativas, o número caiu de 900 mil para a metade.

“Antes da mudança no regime, há sete anos, não tínhamos massacres como este”, disse o bispo Metti Metok.

“Claro que estamos preocupados com o futuro da nossa comunidade. Embora nós os encorajemos a ficar, eles nos perguntam: você garante as nossas vidas?”

Metok e outros líderes da igreja enfatizam que não são somente os cristãos que estão sofrendo.

Dois dias após o ataque contra a igreja, cerca de 90 pessoas foram mortas em uma série de explosões de bombas em áreas xiitas.

Mesquitas xiitas, peregrinações e funerais, assim como mercados cheios e ruas movimentadas tem sido atacadas com frequência.

[b]Fonte: BBC Brasil
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