Os bispos irlandeses falaram ontem pela primeira sobre o encontro mantido nos dias 15 e 16 com o papa Bento XVI, no qual foram discutidas as denúncias sobre pedofilia que envolvem a Igreja no país europeu.
Os casos de abusos cometidos por padres e freiras em instituições católicas irlandesas vieram à tona em novembro de 2009 com a divulgação de um relatório elaborado pela juíza Yvonne Murphy. O documento prova a existência de um esquema por meio do qual sacerdotes e autoridades policiais encobriram casos de pedofilia por 60 anos.
Durante as celebrações do primeiro domingo da Quaresma, os religiosos se disseram impressionados com a “seriedade” e a “gravidade” com que o Vaticano trata o escândalo — o que se reflete na duração da reunião com o Pontífice, na presença dele durante as conversas e na participação de nove cardeais e arcebispos da Cúria Romana.
“O Relatório Murphy sublinha os graves erros cometidos e o terrível sofrimento de muitas crianças”, declarou o bispo Michael Smith, de Meath, segundo informações da agência católica Sir.
De acordo com ele, o Papa escutou atentamente os comentários e sugestões dos presentes à cúpula. Smith disse que, “contrariamente ao que afirmaram alguns relatos”, considerou o encontro “o mais aberto, honesto e comprometido ao qual jamais tomou parte”.
O bispo Noël Treanor, da diocese de Down e Connor, explicou que a reunião indica “a medida da importância dada por Bento XVI ao crime, ao pecado e ao horror dos abusos sexuais cometidos contra crianças, menores e adultos vulneráveis”, lembrando ainda que “o Papa expressou sua tristeza pelo que aconteceu aqui na Irlanda”.
Segundo Treanor, esta é uma “ferida” que foi causada “na vida das vítimas, da Igreja e, por extensão, na sociedade”. “Como tal, este encontro não pode curar” a dor, explicou o religioso.
Durante seus pronunciamentos, os bispos recordaram algumas vezes que tudo “ocorreu no interior da Igreja”, “reconheceram a má gestão” com a qual se conseguiu “encobrir” os casos de abuso, trazendo “sofrimento, raiva e dor” às vítimas.
Para o bispo de Ferns, Dennis Brennan, a reunião com o Pontífice assinala “uma ulterior etapa na busca de vital importância pela cura”. “Em nosso retorno a casa, assistimos, ainda uma vez, à dor das vítimas que experimentam grande desilusão porque o resultado do nosso encontro é inferior às suas expectativas”, continuou.
Brennan comunicou que “a visita ao Papa da parte dos bispos é só uma parte de um processo em curso”, “um passo importante na estrada, da qual não se pode andar atrás”, em “um percurso de reconciliação com os sobreviventes fundado sobre a justiça e o respeito”, que “permanece uma prioridade”.
Ainda durante o primeiro domingo da Quaresma, o bispo de Kildare e Leighlin, James Moriarty, um dos envolvidos no escândalo, disse que o processo de demissão encaminhado por ele ao Vaticano está “indo adiante”. “Não está em questão o ‘se’ ou o ‘quando’. Não será imediatamente, mas não irá além da Páscoa”, informou.
Moriarty é um dos religiosos acusados expressamente pelo Relatório Murphy de terem encoberto atos de pedofilia na arquidiocese de Dublin. Até agora, porém, Bento XVI só aceitou a demissão de Donald Murray, bispo de Limerick.
Está previsto que o Papa divulgue na metade de março uma carta pastoral aos católicos irlandeses, na qual falará sobre o escândalo.
Fonte: Ansa