O baixo crescimento econômico no Brasil fez com que o país reduzisse a pobreza num ritmo menos intenso nos últimos anos do que a Argentina e a Venezuela, seus dois maiores parceiros econômicos no Mercosul e nações que atravessaram turbulências econômicas ou políticas recentemente.
Dados do Panorama Social da América Latina 2006, elaborado pela Cepal (Comissão Econômica Para a América Latina e Caribe), mostram que, de 2001 a 2005, o percentual da população urbana vivendo abaixo da linha de pobreza no Brasil variou pouco: passou de 34,1% para 32,8%.
Na Argentina, num período quase similar (2002 a 2005), a redução foi de 45,4% para 26%, enquanto na Venezuela ela foi de 48,6% para 37,1%.
Devido a diferenças na metodologia, as taxas de pobreza da Cepal são diferentes das calculadas pelos institutos de estatísticas de cada país.
No caso argentino, a principal explicação para uma queda tão acentuada foi a recuperação econômica após a crise financeira. No pico das turbulências, em 2002, a taxa de 45,4% era quase o dobro da verificada em 1999 (23,7%), antes da crise.
No caso da Venezuela, a redução da pobreza se acentuou principalmente a partir de 2002, ano em que os enfrentamentos entre o presidente Hugo Chávez e a oposição chegaram ao auge com uma greve geral. A alta cotação do preço do petróleo, principal produto venezuelano, é apontado por especialistas como fator fundamental para o crescimento econômico do país e para o aumento do gasto social público.
Renato Baumann, diretor do escritório da Cepal no Brasil, diz que a tendência de queda na pobreza foi comum a quase todos os países latino-americanos, apesar de a intensidade ter variado. Em relação ao Brasil, Baumann diz que políticas como a de transferência de renda têm tido impacto positivo na renda da população mais pobre, mas, para que a pobreza caia em ritmo mais intenso, é preciso acelerar o crescimento.
“Crescimento faz diferença. O Brasil vem melhorando, mas precisa crescer mais para gerar mais empregos. O país está crescendo a uma taxa média de 2,6%, enquanto os vizinhos crescem o dobro ou o triplo. Venezuela e Argentina, por exemplo, têm registrado um crescimento expressivo e isso se reflete nas taxas de pobreza.”
Para a economista Lena Lavinas, da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), a maior redução da pobreza nos países vizinhos reflete também a opção de Argentina e Venezuela de dar prioridade ao desenvolvimento por meio de políticas como taxa de juros baixa, câmbio desvalorizado ou controlado e até mesmo ruptura de contratos econômicos considerados desfavoráveis.
O economista João Sicsú, também da UFRJ, diz que, no caso da Argentina, o país está adotando um modelo de desenvolvimento parecido com o dos países da Ásia que mais crescem. “O câmbio desvalorizado num patamar competitivo e estável, a taxa de juros inferior à inflação e o investimento em infra-estrutura fizeram com que o país superasse o fundo do poço. Hoje, a Argentina só não cresce mais do que a China.”
Potencial
As opções de Argentina e Venezuela, no entanto, são criticadas por outros economistas, para os quais os dois países não têm sabido aproveitar todo o potencial de redução da pobreza proporcionado pelas invejáveis taxas de crescimento.
O argumento é que os altos níveis de intervenção do governo na economia – tanto Hugo Chávez quanto Néstor Kirchner adotaram, por exemplo, políticas de controle de preços- criam incertezas que afastam investimentos privados. As conseqüências são sentidas na geração de emprego e, em seguida, na velocidade do processo de redução da pobreza.
Economista da BCP Securities, consultoria financeira especializada em América Latina e baseada nos EUA, o argentino Walter Molano responde rápido ao questionamento sobre a causa da diferença no desempenho do Brasil com relação aos vizinhos no combate à pobreza: “Isso tem tudo a ver com o crescimento do PIB, que é muito baixo no Brasil”.
Na opinião de Ricardo Portillo, economista da consultoria venezuelana Datanálisis, o menor ritmo de avanço no Brasil também se deve à enorme dimensão do país e ao fato de a pobreza ser um problema estrutural. Ele lembra que, apesar de mais lento, o processo brasileiro tem sido mais constante. “Algo mais significativo só aconteceria no Brasil com um ritmo de crescimento no nível da China.”
Fonte: Folha de São Paulo