No mais duro golpe aos esforços da comunidade internacional para convencer o regime comunista da Coréia do Norte a desfazer-se de suas ambições atômicas, o governo norte-coreano anunciou ontem que realizará um teste nuclear para reforçar seu sistema de defesa.
‘A ameaça extrema de uma guerra nuclear dos EUA, de sanções e de pressões obriga a Coréia do Norte a efetuar um teste nuclear, um processo essencial para reforçar nosso poder de dissuasão nuclear’, declarou a chancelaria numa nota. ‘O teste será realizado sob rígidas condições de segurança’, acrescentou, garantindo que o país ‘jamais será o primeiro a explodir uma bomba atômica’.
O anúncio, que não especificou uma data para o teste, causou reação imediata da vizinha Coréia do Sul e do Japão – diretamente ameaçados pelo arsenal norte-coreano – e foi qualificado de ‘ação provocativa’ e ‘ameaça inaceitável’ pelos EUA. Os três países, ao lado de Rússia e China, integram uma mesa de negociações estabelecida em 2003 com a Coréia do Norte para convencê-la a abandonar seu programa atômico.
No entanto, Pyongyang saiu das conversações em 2005 e se nega a retomá-las até que os EUA levantem o embargo econômico ao país. Washington – que mantém congeladas contas bancárias da Coréia do Norte em paraísos fiscais – rejeita a idéia de iniciar conversas bilaterais com os norte-coreanos enquanto estes não voltarem às negociações multilaterais.
O governo japonês prometeu reagir ‘de modo grave’ se o teste ocorrer. ‘Não podemos aceitá-lo’, frisou o primeiro-ministro Shinzo Abe. Assim como o Japão, a Coréia do Sul elevou seu nível de alerta e pediu que o país vizinho desista do teste, ressaltando que ‘não tolerará’ que Pyongyang tenha armas nucleares. ‘Se a Coréia do Norte seguir em frente, deve assumir toda a responsabilidade pelas conseqüências’, disse um porta-voz da chancelaria sul-coreana – citando como possível conseqüência uma ‘mudança’ na política de buscar o diálogo com o país comunista.
A secretária de Estado americana, Condoleezza Rice, alertou que a ‘provocação’ de Pyongyang só aumentará o isolamento norte-coreano. O embaixador dos EUA na ONU, John Bolton, levou o caso ao Conselho de Segurança, que se pronunciará hoje. O chanceler russo, Serguei Lavrov, pediu negociações diretas entre EUA e Coréia do Norte: ‘Essas questões devem ser solucionadas exclusivamente pelas vias diplomáticas.’
Analistas americanos estimam que a Coréia do Norte tenha recursos materiais e tecnológicos para construir pelo menos três bombas atômicas (ler abaixo). A Coréia do Norte afirma já ter armas nucleares, mas nunca fez um teste atômico.
Perigo
‘Nos últimos meses, as palavras e as políticas de Pyongyang estão cada vez mais duras. A situação é muito perigosa’, alertou Shi Yinhong, professor de relações internacionais da Universidade de Renmin, em Pequim. ‘Mas não creio que eles farão os testes neste mês nem no próximo. Preparações tecnológicas levam tempo.’
A Coréia do Norte é um dos países mais isolados – desde a instalação, em 1946, de um regime apoiado pelos soviéticos e liderado por Kim II-sung, seguido pela fundação da República Popular Democrática da Coréia, em 1948. Desde então, o país (um dos mais militarizados do mundo, com 1,6 milhão de soldados) é um Estado comunista sob ditadura. O atual líder, Kim Jong-il, chegou ao poder em 1994, com a morte do pai. As décadas de rígido controle estatal causaram severa estagnação econômica. Com 23 milhões de habitantes, sua renda per capita, de US$ 1.700, é uma das mais baixas do mundo, igual à do Haiti. Seu PIB é de US$ 40 bilhões, como o do Azerbaijão, de população três vezes menor. A fome é um grande problema. Nos anos 90, 2 milhões de pessoas morreram em conseqüência da falta de alimentos causada por desastres naturais e descontrole da economia.
Fonte: Estadão