Durante sessão do Tribunal Superior Eleitoral, o vice-procurador-geral Eleitoral, Humberto Jacques, alertou que é necessário combater todo tipo de abuso de poder capaz de desequilibrar a disputa eleitoral, seja econômico, político ou de natureza religiosa.
“O sistema brasileiro diz que há limite no acesso dos poderes ao jogo eleitoral. Estamos acostumados a tolher os excessos do poder político. Mas é sabido que o poder político não é o único em condições de turbar o processo e abalar as condições de escolha de um eleitorado”, ressaltou o vice-PGE.
Os ministros iniciaram o julgamento de recursos ajuizados por candidatos mineiros acusados de utilizar a estrutura de evento religioso para promover suas candidaturas nas eleições de 2014.
Na sessão, os ministros começaram a analisar recursos que contestam as sanções aplicadas ao deputado estadual eleito em 2014 por Minas Márcio José Machado de Oliveira, o então candidato a deputado federal Franklin Roberto Souza e o líder religioso Valdemiro Santiago, por suposto abuso de poder econômico.
Eles são acusados de utilizar o evento promovido pela Igreja Mundial do Poder de Deus, um dia antes das eleições de 2014, em benefício dos candidatos.
O evento, realizado em uma praça pública em Belo Horizonte reuniu cerca de 5 mil pessoas e custou quase R$ 1 milhão.
Segundo a Procuradoria, o valor foi totalmente financiado pela igreja e não consta na prestação de contas dos candidatos.
O Tribunal Regional Eleitoral de Minas condenou os dois políticos e o líder religioso a oito anos de inelegibilidade. Além disso, o deputado estadual eleito teve seu mandato cassado.
Ao defender a manutenção das sanções aplicadas, Humberto Jacques lembrou que o modelo eleitoral brasileiro é restritivo e impõe uma série de limites aos partidos e candidatos, relacionados a diversos temas, como gastos e tempo de campanha. “É uma maneira de evitar excessos que comprometam o equilíbrio de oportunidade entre os candidatos. “Nenhum ator pode invocar da Constituição uma liberdade absoluta que possa desequilibrar o jogo eleitoral”, destacou.
A Procuradoria sustenta que para afastar a influência indevida da religião no processo eleitoral, a Lei 9.504/97 veda a partido e candidato receber direta ou indiretamente de entidades beneficentes ou religiosas qualquer tipo de doação em espécie ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade.
A lei proíbe a veiculação de propaganda de qualquer natureza em templos religiosos, por considerá-los bens de uso comum. “É uma opção do legislador termos uma disputa eleitoral com restrições, que devem valer a todos os atores”, pontuou Humberto Jacques.
No caso do uso de estrutura física e financeira de cunho religioso, o caso é ainda mais grave, visto que tais entidades desfrutam de imunidade tributária. “Se estivéssemos apreciando o caso de um jogo de futebol, em que se pediu à torcida votos para determinado candidato, estaríamos todos muito assustados com o desequilíbrio na disputa, mas como se trata de evento de aparente raiz religiosa temos um pudor severo”, exemplificou. “É preciso avançar nos limites e restrições a esses abusos”, concluiu o vice-PGE.
Ao votar, a ministra Rosa Weber, relatora do caso, afirmou estar ‘perfeitamente delineado o abuso de poder econômico’ cometido pelos políticos mineiros, em razão da ‘utilização premeditada de sofisticada estrutura de evento religioso de grande proporção’.
Segundo a ministra, os recursos envolvidos na organização do evento foram revertidos em benefício dos candidatos, comprometendo o equilíbrio da disputa eleitoral. Rosa lembrou que durante o ato foram distribuídos materiais de campanha dos candidatos. Também houve pedido expresso para que os fiéis votassem nos políticos e para que conseguissem mais dez votos para as candidaturas.
No parecer enviado ao TSE, o Ministério Público Eleitoral destaca que, apesar das liberdades de expressão e crença, tem sido constatado comportamento abusivo por parte de alguns líderes religiosos para influenciar os fiéis a votarem em candidatos ligados a seus segmentos.
“Partidos políticos e candidatos, valendo-se da estrutura eclesiástica e do apoio de ministros religiosos com discursos carregados de conotação espiritual, são capazes de subverter a legitimidade do pleito e influenciar diretamente o resultado das eleições ao arrepio da legislação eleitoral”, aponta o documento.
As informações foram divulgadas pela Secretaria de Comunicação Social da Procuradoria.
Fonte: Estadão