No santuário do catolicismo do Brasil, repete-se o mesmo processo que agora o Vaticano quer reverter: o crescimento das igrejas evangélicas no maior país católico do planeta. Segundo dados do IBGE, Aparecida é apenas a 1451ª no ranking dos municípios com maior população católica, com 90,49% dos habitantes, segundo o censo de 2000.
“Ele é um homem comum, como nós. Então, não tenho que ficar adorando seu papamóvel”. A frase é do pastor Jorge Ferreira, cujo templo da Igreja Internacional Graça de Deus fica a poucos metros do percurso que o líder católico faz entre o seminário em que se hospeda e a basílica de Aparecida.
As deserções das hostes da padroeira são patentes comparando com o levantamento de 1991, quando 94,37% dos locais se identificaram como seguidores da Santa Sé.
“Prefiro não saber se algum de nossos crentes foi ver a passagem do papa. Mesmo que tenha tido por curiosidade, não devia ter ido”, sentencia o pastor Ferreira. Sua igreja, liderada pelo pastor midiático R.R. Soares, se manteve aberta 12h durante o fim-de-semana que Bento 16 esteve na cidade. “Não pensei em fechar, afinal, temos que atender mais de 160 pessoas que precisam de auxílio espiritual”, argumenta.
Aparecida é conhecida por atrair milhares de peregrinos que a visitam e tem sua economia dependente da fé -há até um “shopping do romeiro”-, mas perde ano a ano rebanho entre sua população estável.
“O padre até ficou de mal de mim. Ficou sem falar comigo um ano, mas depois comprendeu minha conversão”, afirma Amália Nascimento, obreira de um templo da Assembléia de Deus localizado em uma garagem da avenida Padroeira do Brasil.
Seu marido cuida da unidade no santuário católico. “Eu mesmo dei aulas de catecismos para muito figurão na cidade, até para o delegado daqui. Mas foi depois que virou evangélico que encontrei paz na vida”, relata César Nascimento, que há três anos cuida do templo.
Já a Igreja Prestiberiana Renovada está planejando sair da fábrica em que instalou seu templo e construir ainda este ano sua primeira igreja propriamente dita em Aparecida. “Há cinco anos, dávamos culto em uma sala de 15 metros quadrados. Hoje, precisamos um lugar para 1.000 pessoas”, afirma o pastor José Benedito de Almeida. Ele quer um sede para fazer frente a vizinha Adventista do Sétima Dia, com lugar maior para seus fiéis.
O pastor José Benedito diz acreditar que mesmo o movimento católico Renovação Carismática, liderada pelo televisivo padre Marcelo, não deterá o crescimento dos evangélicos. “O carismático é um católico insatisfeito e tenta nos imitar”, afirma.
Entre as lideranças católicas, não há consenso sobre a razão da diminuição da popularidade da fé romana. A ala conservadora, alinhada com o atual papa, aponta que a Teologia da Libertação (movimento que mistura cristianismo com marxismo e foi forte nos anos 70 e 80) atrapalhou o trabalho espiritual ao acentuar muito o trabalho social. Já os progressistas da igreja criticam o distanciamento do Vaticano da população mais pobre, principalmente nas periferias das grandes cidades.
Esse assunto deve ser um dos pontos centrais da 5ª Celam (Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano e Caribenho), afinal, o fenômeno é continental e muitos analistass apontam o interesse dos EUA no crescimento das religiões evangélicas na região.
Fonte: UOL