Como Adão e Eva no Paraíso: Integrantes de igrejas evangélicas descobrem que o naturismo também é uma forma de comunhão com Deus e vão à praia nus.

O catarinense Estevão gosta de orar nu para se sentir mais próximo da natureza. Ele já foi expulso de uma igreja

Um paraíso ecológico, nenhuma roupa e… a Bíblia Sagrada. Pode parecer contraditório, mas naturismo também é coisa de crente. Isso mesmo: no Rio, até mesmo pastores evangélicos se bronzeiam como vieram ao mundo nas praias freqüentadas por nudistas. Membro de tradicional igreja evangélica há sete anos e naturista há 15, o comerciante Carlos Moreira, 44 anos, é um dos que defendem que não há barreiras entre a religião e o nu. “O pecado não está no corpo despido, mas, sim, na malícia das pessoas. Meu coração é puro”, argumenta.

A comunhão entre Deus e nudismo custou caro ao arquiteto curitibano Estevão Prestes, 31 anos. Evangélico há 14 anos e freqüentador da Praia do Pinho (Santa Catarina) há três, ele foi expulso da Igreja do Evangelho Quadrangular, da qual foi professor da escola dominical. “Quando meus hábitos foram descobertos, fui chamado pelos pastores a um conselho. Houve a leitura de acusação formal de comportamento imoral”, conta Estevão, que hoje é membro da Igreja Presbiteriana. “Não escondo que sou naturista, mas também não ando com crachá. Os que sabem, me aceitam”, garante.

Estevão gosta de orar sozinho na praia e de ler a Bíblia – nu, é claro: “A vivência naturista me aproxima da espiritualidade. Tenho momentos de comunhão com a natureza, com Deus e o com próximo”, justifica.

Pastora pentecostal também pratica nudismo

O nudismo evangélico é uma idéia é tão inovadora, que muitos preferem o anonimato, como a líder de instituição pentescostal há 15 anos, Márcia, 48 anos, que trocou o nome para não ser reconhecida por seus fiéis. A pastora se converteu ao naturismo há três anos, após visitar a Praia Olho de Boi, em Búzios. “Me encantei com o respeito e a pureza. Ser naturista é estar em contato pleno com o Senhor”, defende ela, que visita sítios de lazer e já frequentou a Praia do Abricó, no Recreio, interditada ao nudismo por força de liminar.

Márcia diz ter aprendido que o naturismo não tem conotação sensual. “Vemos a nudez com olhos do espírito, sem malícia”, ensina a pastora, que lamenta o preconceito que enfrenta. “A igreja evangélica está recheada de dogmas e tabus. Somos tolhidos de vermos o mundo como é. Não poderia abrir minhas opiniões aos fiéis. Causaria grande rebelião”, pondera a pastora naturista. Ela também compartilha a palavra de Deus com amigos em recantos de nudismo. “Certa vez, uma irmã estava com sérios problemas e prestei favores espirituais para ela ali mesmo, em um sítio de convívio naturista”, recorda.

Para a grande maioria dos pastores evangélicos, entretanto, a idéia é inaceitável. “Isso é um escândalo. É a falta do conhecimento da Palavra. Não tenho pessoas com esta conduta na minha igreja. Aqui, não há espaço”, avisa o pastor Manoel da Silva, da Igreja Batista em Renovação Espiritual Nova Jerusalém

Argumentos saídos do Livro Sagrado

Conta a Bíblia Sagrada que, ao comerem o fruto proibido, Adão e Eva tiveram consciência do bem e do mal e cobriram os corpos nus com vergonha do Criador. Em tempos modernos, a passagem do livro Gênesis é usada por evangélicos para condenar ou defender a prática do naturismo. Com interpretações diferentes da escritura, muitos crentes se cobrem dos pés à cabeça ou tiram a roupa nas praias e áreas de nudismo.

“A nudez não era rejeitada até o Pecado. O naturismo leva as pessoas ao estágio original de inocência, a reviver a Criação”, justifica a pastora naturista Márcia. Coordenador da Igreja Sara Nossa Terra no Rio, o bispo Francisco Almeida tem outra visão. “O nu só foi possível enquanto não havia maldade no coração do homem. A partir do pecado, os patriarcas foram ensinados por Deus a se cobrir e a passar este princípio para a s gerações”, considera.

Vice-presidente da 2ª Igreja Batista de Rocha Miranda, o pastor Odalírio Luis da Costa concorda. “Provar o fruto proibido agregou a Adão e Eva a malícia. Falta consciência bíblica aos nudistas”, afirma. Para a pastora Suzana Viana, da Igreja Metodista do Brasil, o nu não é pecado, mas agride a consciência do próximo. “Temos que respeitar a comunidade, como Deus ensina”, avalia.

Depoimentos:

‘Pureza não está ligada às roupas’
Há muitos evangélicos naturistas no Brasil. A pureza da alma não está ligada às roupas. Considero o naturismo uma visão da Criação. As pessoas ainda têm preconceito contra o nu porque falta esclarecimento. Sempre fui atuante na Igreja e não esperava ser excluído de minhas atividades de uma maneira tão desagradável. Mas a religião não deixou de estar no meu dia-a-dia. Converso com Deus seja onde for. Não escondo que sou naturista. Não tenho do que me envergonhar. Estevão Prestes, 31 anos, arquiteto

‘Não me considero um pecador’
Na minha vida, o naturismo antecedeu a religião. Fico nu há 15 anos, desde que fui à Praia de Trancoso, na Bahia. Já freqüentei Abricó e gosto da Praia Olho de Boi. Há sete anos, eu me tornei evangélico. Não me considero um pecador por ainda buscar praias de nudismo. Onde está na palavra de Deus que é proibido ficar nu? Temos o espírito livre e puro. O que dizer do Carnaval, então? E das revistas de mulheres ou homens pelados? Nós temos uma filosofia de vida: a do respeito ao próximo.Carlos Moreira, 44 anos, comerciante

Nudistas evangélicos buscam paraísos ecológicos pelo país

* Não é só no Rio que os evangélicos estão deixando de lado as indumentárias mais do que comportadas. Considerada um paraíso naturista, a Praia de tambaba, em João Pessoa, Paraíba, reúne entre seus freqüentadores um grupo de pelo menos 15 cristãos, segundo o ex-presidente da Sociedade Naturista de Tambaba Nelci ROnes Pereira de Sousa, 47 anos.

Nascido em família evangélica, Nelci é naturista há mais de 20 anos. “Detesto roupas, o que não quer dizer que eu não tenha Deus no coração. Imoral é o que se faz de sujo com o corpo”, defende ele, que está afastado da Igreja Batista há 10 anos. “Não sofri nenhuma crítica. É pura falta de tempo mesmo”, diz o programador de computadores.

Já o aposentado Carlos Antonio Pereira de Moraes, 52 anos, deixou os cultos por se sentir “incomodado com o conservadorismo e o fanatismo”: “Optei pelo naturismo e sou livre. Ser cristão é pregar o Evangelho onde for”.

Fonte: Última Hora News

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