Segundo dados da ONG Death Penalty Focus, cada execução realizada na Califórnia desde 1978 custou, em média, US$ 300 milhões aos cofres públicos.
O governador do Texas, Rick Perry, se gabou de que nos últimos dez anos o seu Estado executou 232 criminosos condenados. Mas o ativista dos direitos humanos Rick Halperin descobriu um caso que ele espera que venha a compelir até mesmo os texanos a fazerem uma pausa para refletir
As pastas de arquivos estão empilhadas como lápides no escritório dele. Rick Halperin, 61, diretor do Programa de Direitos Humanos da Universidade Metodista do Sul, em Dallas, luta pelo fim da pena de morte há quase 30 anos. Até hoje ele não teve um sucesso sequer. Todos aqueles por cujas vidas ele lutou acabaram sendo executados, e ao que parece o próximo morreria na quarta-feira (20) – um homem do Texas condenado por assassinato e que, ao que parece, é descendente de alemães.
Isso não é nenhuma surpresa, já que Dallas é uma cidade do Texas, um Estado no qual mais pessoas são executadas do que em qualquer outro Estado norte-americano. O governador Rick Perry, que sucedeu a George W. Bush no final de 2000, gaba-se de que houve 232 execuções durante os seus dez anos de governo. No período de seis anos em que Bush foi governador, 152 presos foram executados.
Sendo assim, por que Rick Halperin está de tão bom humor? Por que um cartaz com os dizeres “Out of Order” (“Com defeito”) está pendurado em um modelo em miniatura de uma cadeira elétrica que fica perto da mesa de trabalho dele, como se Halperin estivesse experimentando uma onda súbita de otimismo? Provavelmente porque o destino fez com que ele cruzasse o caminho de um homem que tem uma história que Halperin espera ser capaz de compelir até mesmos os texanos a fazerem uma pausa para refletir: Rais Bhuiyan, 37, um muçulmano devoto natural de Bangladesh.
Em 21 de setembro de 2001, Bhuiyan estava trabalhando em um posto de gasolina em Dallas quando um homem se aproximou dele portando uma espingarda de cartucho. O desconhecido perguntou qual era o país de origem de Bhuiyan e disparou contra ele.
O atirador, Mark Stroman, um defensor da supremacia da raça branca, usuário de drogas e criminoso com várias condenações, foi tomado pela ilusão de que a sua meia-irmã morrera dez dias antes nos ataques contra o World Trade Center, em Nova York. Ele decidiu matar árabes, mas acabou assassinando um paquistanês e um bengalês. Bhuiyan, a segunda das três vítimas de Stroman, ficou gravemente ferido mas sobreviveu ao tiro que recebeu.
Ele ainda carrega 35 fragmentos de esferas de chumbo na cabeça, e ficou cego do olho direito. Mas Bhuiyan explica que a sua fé lhe ensina a perdoar. Ele deseja que a sentença de morte para o homem que tentou assassiná-lo seja substituída pela pena de prisão perpétua.
[b]Campanha internacional
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A história de Bhuiyan é o mais forte argumento com que Halperin conta para exercer pressão sobre o sistema. Sob o ponto de vista jurídico, ele baseia as suas esperanças nos dispositivos existentes para assegurar os “direitos da vítima”, e que estão descritos no código penal. Bhuiyan entrou com uma petição para que pudesse se encontrar com Stroman para uma conversa que ele espera que proporcione uma chance de reconciliação entre criminoso e vítima.
Halperin e Bhuiyan estão também dependendo de apoio internacional para a sua causa. No início de julho eles viajaram a Berlim para se reunirem com Tom Koenigs, presidente do Comitê de Direitos Humanos do Bundestag, o parlamento alemão. Eles esperam que a intervenção de políticos alemães possa ajudar o perpetrador do crime, já que o pai de Stroman seria natural do Estado alemão da Baixa Saxônia. Stroman deveria ser executado em 20 de julho.
Até mesmo um adiamento da execução já seria um sucesso para os dois ativistas. Mas é improvável que isso venha a acontecer no Texas, apesar de um juiz ter permitido, em novembro do ano passado, pela primeira vez na história, a realização de um debate sobre a constitucionalidade da pena de morte.
Outros Estados estão mais avançados nesse percurso. Illinois acabou de se tornar o 16º dentre os 50 Estados norte-americanos a abolir a pena de morte. E a legalidade da pena de morte está sendo discutida na Flórida. Tendo em vista a morosidade com que as sentenças de morte são cumpridas, é improvável que os últimos condenados que se encontram na chamada “fila da morte” da Flórida sejam executados nos próximos 200 anos. E os eleitores da Califórnia poderão em breve ter a oportunidade de votar pela abolição permanente da pena de morte.
A pena capital está em declínio nos Estados Unidos, e até mesmo no Texas, onde só houve 17 execuções em 2010. “Já é hora de a pena capital passar a ser apenas um registro sobre o passado nos livros de história do Texas”, opinou em editorial o jornal “Houston Chronicle”.
[b]Drogas letais e tensões diplomáticas
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Os executores norte-americanos da pena de morte, que atualmente recorrem quase que exclusivamente à injeção letal, estão sendo bastante pressionados para encontrar um novo fornecedor das drogas utilizadas no processo. O único fornecedor de tiopentato de sódio nos Estados Unidos decidiu suspender a produção desta droga no segundo semestre do ano passado e, em 1º de julho, a companhia farmacêutica dinamarquesa Lundbeck anunciou que imporia restrições à distribuição da sua droga Nembutal, de forma que ela não possa mais ser usada para execuções nos Estados Unidos. Problemas de fornecimento existem há algum tempo, e muitas execuções já foram postergadas como resultado disso.
As execuções que acabaram ocorrendo provocaram prolongados debates e, em algumas ocasiões, criaram tensões diplomáticas, como no caso de um mexicano que foi condenado por ter estuprado brutalmente uma adolescente de 16 anos de idade e depois matá-la. Ele foi executado no Texas no dia 7 de julho, mas ninguém lhe informou que ele poderia ter solicitado assistência do governo mexicano. O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, pediu às autoridades estaduais do Texas que reexaminassem o caso, mas elas ignoraram os pedidos dele.
No passado, o homem teria sido enterrado e o caso teria sido arquivado, mas durante semanas a mídia vem noticiando detalhadamente as circunstâncias relativas à execução e às suas consequências. O prisioneiro teria gritado “Viva México!” pouco antes de a injeção letal fazer efeito. Analistas temem que o caso possa provocar uma crise grave nas relações entre Washington e o México.
“Os norte-americanos sempre tendem a responder à violência com violência”, diz Halperin, observando que esta é uma das características da forma como os estadunidenses abordam a questão da justiça. “Mas eles estão começando lentamente a descobrir quais são os custos disso: políticos, diplomáticos e, no fim das contas, financeiros”.
[b]Custos altos na Califórnia
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Jeanne Woodford, 57, é uma pessoa que presta muita atenção a essa questão. Woodford trabalhou durante vários anos como guarda carcerária da Penitenciária de San Quentin, na Califórnia, onde ela também supervisionou execuções. Atualmente ela trabalha para a Death Penalty Focus, no centro de São Francisco, uma organização dedicada a garantir que os guardas carcerários não sejam mais obrigados a realizar tal tarefa no futuro.
Mesmo durante o período em que foi guarda carcerária, Woodford começou a ter dúvidas quanto à justiça do sistema judicial norte-americano. E agora que Woodford trabalha como ativista e tem examinado arquivos, ela tem questionado também os custos da pena capital.
Segundo os números apresentados por Woodford, houve 13 execuções na Califórnia desde 1978. Durante esse período, o Estado gastou US$ 4 bilhões (2,86 bilhões de euros) para manter esse sistema de pena capital. Essa quantia astronômica é atribuída aos altos custos de pesquisas, às várias apelações nos casos de pena de morte, e às despesas relativas à alimentação e abrigo aos presos que se encontram na “fila da morte”. Cada execução custa US$ 300 milhões, uma cifra difícil de justificar em um Estado que está à beira da falência.
Woodford apoia uma iniciativa para a abolição da pena de morte na Califórnia. Se essa iniciativa tiver sucesso, mais de um quinto dos 3.200 indivíduos que se encontram na fila da morte nos Estados Unidos terão as suas sentenças de execução subitamente substituídas pela pena de prisão perpétua. Isso significaria que uma ex-guarda carcerária teria dado início ao processo para a abolição da pena de morte nos Estados Unidos.
Apesar da pouca simpatia que essa californiana tranquila sente pelo movimento político radical Tea Party, ela concorda com os seus seguidores em relação a uma coisa: os Estados Unidos, que têm uma dívida de mais de US$ 14 trilhões, precisam economizar dinheiro. Até mesmo nas questões de vida ou morte.
[b]Fonte: Der Spiegel[/b]