“Toda a França sente sua morte no coração”, declarou o presidente francês Jacques Chirac ao tomar conhecimento da morte do padre Abbé Pierre, fundador das Comunidades de Emaús. O país perdeu “uma figura imensa, uma consciência, uma encarnação da bondade”, agregou o presidente.

Abbé Pierre faleceu na madrugada desta segunda-feira, aos 94 anos, vítima de infecção pulmonar. Ele estava internado desde domingo, 14, no hospital Val-de-Grâce, em Paris.

Henri Groués, seu nome civil, nasceu em 1912, em Lyon. Estudou com jesuítas, até os 19 anos de idade, mas foi ser capuchinho. Deixou a ordem por motivos de saúde e tornou-se padre da diocese de Grenoble.

Comovido com a situação de muitas famílias operárias de bairros parisienses, Pierre pediu, em 1949, a colaboração de pessoas de boa vontade e recursos para ajudá-las a construir suas modestas moradias, muitas vezes à margem da legalidade.

Em poucos anos, seguindo o exemplo do padre Pierre em Paris, foram criadas associações para assistir pessoas sem abrigo e desempregadas em várias cidades do país, dando origem às Comunidades de Emaús.

Em 1954, quando o rigoroso inverno matou mulher de frio nas ruas de Paris, Pierre lançou um enérgico chamamento através das ondas da Rádio Luxemburgo a favor das pessoas sem teto.

É necessária “uma insurreição da bondade”, disse o abade então, num chamamento que comoveu a opinião pública e fez o Parlamento votar com urgência programa para a construção de 12 mil moradias para pessoas sem abrigo.

Logo a popularidade de Pierre e de seus companheiros construtores ultrapassou as fronteiras da França. A partir de 1956, começou uma série de viagens pelo mundo, convidado por organizações cristãs e universidades.

Em 1963, quando visitava grupos de Emaús na América Latina, ocorreu um incidente notável. Na viagem noturna de Montevidéu a Buenos Aires, o navio Cidade de Assunção desviou-se da rota, colidiu com o casco de um barco e naufragou no Rio da Prata.

Pierre manteve a salvo em seus braços uma criança, até que outro grupo de náufragos pudesse acomodar a menina num banco flutuante, que os manteve agrupados. Depois foram resgatados pelo barco patrulha Murature, da Armada Argentina.

Em 1969, em Berna, Suíça, 70 grupos de 20 nações adotaram o Manifesto Universal do Movimento Emaús e decidiram criar uma secretaria internacional. Dois anos depois, a assembléia geral de Montreal, Canadá, aprovou os estatutos da fundação Emaús Internacional “para continuar a ação iniciada em 1949” e delimitou as regiões, geograficamente. A América do Sul foi a primeira a se organizar.

A Fundação Emaús, da qual fazem parte 450 organizações em 53 países, recruta milhares de trabalhadores e oferece trabalho a pessoas mais pobres. Ela financia as chamadas “casas de solidariedade”, encarregadas de acolher e apoiar pessoas necessitadas, oferecendo-lhes cuidados de higiene e alimentação. Também coordena esforços com associações afins e realiza seminários que permitem a pessoas com baixo nível escolar, delinqüentes e pessoas marginalizadas recuperarem sua auto-estima e buscarem uma qualificação.

Abbé Pierre, que recebeu o título de Grande Oficial da Legião de Honra, em 2001, participou da resistência contra a ocupação alemã da França, ajudando pessoas de origem judia, perseguidas pelos nazistas. Seu ativismo atraiu a atenção da Gestapo e, em 1943, teve que abandonar o território francês para refugiar-se em Alger, onde conheceu o general De Gaulle.

No livro que escreveu “Meu Deus… por quê?”, publicado em 2005, Pierre admitiu que, mesmo sendo sacerdote, manteve relações sexuais em diferentes momentos de sua vida, antes de optar definitivamente pelo celibato. Ele pronunciou-se a favor, então, da ordenação de homens casados e da ordenação de mulheres ao sacerdócio na Igreja Católica.

Fonte: ALC

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