Desde que a maioria das restrições aos cultos foi suspensa foram as igrejas evangélicas que experimentaram um aumento explosivo, enquanto que a Igreja Católica ficava cada vez mais para trás.
Em uma igreja evangélica ruidosa devido ao retumbar de tambores, aos címbalos estridentes e ao canto de um baixo, membros de uma grande multidão dançam nos corredores, acompanham com cânticos a música de um trompete e agitam os braços em orações. Uma mulher é tomada por uma tremedeira violenta, com as mãos erguidas.
Seria essa uma vigorosa recepção de boas vindas ao papa? De jeito nenhum.
“Isso não tem nada a ver com a visita do papa”, explica o reverendo Jorge Ortega, pastor da Igreja Metodista Carismática do bairro de Marianao, em Havana. “Isso ocorre todos os domingos, e embora as igrejas católicas provavelmente estejam recebendo um pouco mais de gente devido ao papa, o número de fiéis delas não se compara ao nosso.”
Ele aponta para o grupo de pessoas que não conseguiu entrar por falta de espaço e teve que ficar em frente à porta da igreja, uma cena que é raramente vista nas igrejas católicas daqui, que têm lutado para preencher os seus bancos com fiéis, apesar de atuarem na vanguarda do movimento que faz pressões para que haja mais liberdade religiosa em Cuba.
Desde que a maioria das restrições aos cultos foi suspensa, no início da década de 90, foram as igrejas pentecostais e evangélicas como a de Ortega, que estariam entre as maiores de Cuba, que experimentaram um aumento explosivo da sua filiação, enquanto que a Igreja Católica ficava cada vez mais para trás.
Isso pode explicar em parte a notável falta de entusiasmo presenciada em relação à chegada do papa Bento 16, o segundo papa a visitar Cuba, após a histórica e bastante recordada visita do papa João Paulo 2º, há 14 anos. Se não fosse por um punhado de outdoors, umas poucas ruas recém-pavimentadas e algumas faixas coloridas dependuradas em postes de iluminação pública, um visitante provavelmente não ficaria sabendo que o papa vinha a Cuba.
E Cuba sabe como fazer recepções desse tipo. O comparecimento da população é motivado por incentivos como folgas no trabalho ou, segundo dizem alguns cubanos reservadamente, pela intimidação, ou ainda pela curiosidade e à devoção à causa.
Mas os fieis das igrejas católicas não parecem estar entusiasmados com a visita, e vários deles disseram que não pretendem participar da missa que será celebrada aqui na quarta-feira (28) e que há muito tempo desistiram da Igreja Católica. Um pouco mais da metade da população cubana é católica, segundo o Fórum Pew sobre Religião e Vida Pública, mas são poucos os que frequentam regularmente a igreja.
“O papa circula com um Cristo que está crucificado”, argumenta Isabel Reina, 52, uma integrante da igreja de Ortega que, segundo o pastor, teve um crescimento de 40% nos últimos cinco anos, tendo atualmente 2.700 membros. “Já o meu Cristo está vivo”.
Esse é um sentimento que pode ser presenciado em toda a América Latina, onde as igrejas evangélicas e pentecostais estão prosperando. “Eles se constituem definitivamente na maioria dos cristãos praticantes de Cuba”, afirma R. Andrew Chesnut, professor de religião da Universidade Virginia Commonwealth e especialista em fé religiosa na América Latina.
“Sim, o crescimento deveu-se à redução das restrições à igreja na década de noventa, mas também ao crescimento explosivo do pentecostalismo na América Latina durante a década.” Muitas igrejas não católicas beneficiaram-se dos laços estreitos com as congregações norte-americanas, que enviam material religioso e voluntários para ajudar a sustentar essas instituições.
Com a sua mensagem de boas vindas a todos e a música mesclada de ritmos africanos, eles conseguiram atrair os negros cubanos, em especial, que há muito sentiam-se discriminados pela Igreja Católica de Cuba e que tinham optado pela santeria, um sistema religioso que mistura vários aspectos de religiões africanas, caribenhas e católicas.
O reverendo Raul Suarez, pastor emérito da Igreja Batista Ebenezer daqui e membro do parlamento, diz que Cuba “possui um rico espírito africano” e que as igrejas precisam reconhecer que “isso faz parte do [img align=right width=300]http://n.i.uol.com.br/noticia/2012/03/26/frequentadores-de-igreja-metodista-em-havana-cuba-igreja-catolica-esta-perdendo-espaco-no-pais-1332807810839_615x300.jpg[/img]tecido cultural do país”. A igreja dele recebeu líderes religiosos dos Estados Unidos como o reverendo Jesse Jackson e Loius Farrakhan, o líder da organização muçulmana Nation of Islam.
“É natural que em Cuba as pessoas busquem uma religião, uma corrente espiritual para carregá-los, e isso está ocorrendo de uma maneira abrangente”, disse ele na tarde do último sábado, quando sua igreja comemorava seu 65º aniversário com uma cerimônia animada, com direito a bolo e desfile de fantasias.
Segundo os líderes religiosos, essa é uma manifestação transparente que permite que os cubanos se expressem de maneiras que seriam normalmente proibidas neste país. O bispo Ricard Pereira Diaz, da Igreja Metodista local, diz ter notado a presença de uma quantidade crescente de autoridades militares e governamentais entre os fiéis, algo que em outros contextos poderia provocar receios. Mas, segundo ele, “isso é um sinal de que pouco a pouco a nossa influência está crescendo também entre eles”.
No entanto, ele diz que a igreja não tem permissão para adquirir a propriedade da qual necessita para a construção de um templo maior, e que ela tampouco pode transmitir os seus próprios programas de rádio e televisão para os fiéis, o que faz com que seja mais difícil atrair novos membros. O que a igreja tem feito é procurar novos meios de propagar a sua mensagem, incluindo os batismos em massa. Segundo o pastor, durante um desses eventos, em um final de semana, 350 novos convertidos foram batizados em uma praia distante. “Nós fizemos isso de forma pública e aberta, de forma que todos pudessem ver”, afirma Diaz.
[b]Fonte: The New York Times
Tradução: UOL[/b]