A Igreja propôs, nesta quarta-feira, ao governo chileno incluir em um indulto por razões humanitárias militares sentenciados por crimes contra os Direitos Humanos, mas que tenham um grau de responsabilidade menor e demonstrado sinais de arrependimento.
A Conferência Episcopal chilena fez a proposta ao presidente Sebastián Piñera de um indulto aos réus por ocasião do bicentenário da independência do Chile, que se comemora em setembro, e nela pede que não se excluam os militares envolvidos e sentenciados por violar os direitos humanos durante o regime de Augusto Pinochet.
“Não esqueçamos que nem todos eles tiveram a mesma responsabilidade nos crimes cometidos. Em nosso parecer, não cabe nem um indulto generalizado, nem um repúdio geral do indulto para todo ex-militar condenado” por crimes na ditadura, descreve a proposta.
“A reflexão deve distinguir, por exemplo, o grau de responsabilidade que coube a cada um, o grau de liberdade com que agiu, os gestos de humanidade que teve e o arrependimento que manifestou por seus crimes”, acrescenta o documento eclesiástico.
Ao fim do encontro com o presidente, no Palácio Presidencial La Moneda, o presidente da Conferência Episcopal do Chile, monsenhor Alejandro Goic, assegurou que a proposta do clero “não busca reabrir as graves feridas do passado, nem tampouco pretende que elas se fechem por decreto”.
“Achamos que podem ser dados passos de clemência, agindo no âmbito do estado de direito”, acrescenta.
“O presidente vai refletir com respeito a este documento e vai tomar uma decisão com base nos compromissos com a verdade e a justiça, a unidade nacional, a segurança cidadã e as considerações humanitárias”, disse a ministra secretária-geral do governo, Ena Von Baer.
Baer, que também é porta-voz oficial, pediu para não antecipar opiniões sobre o tema e anunciou que nos próximos dias será recebida a proposta de indulto elaborada pela Igreja Evangélica.
A proposta eclesiástica foi bem recebida pela direita, que governa o Chile, e repudiada pela oposição.
“É uma visão realista, não vai para extremos, é integradora”, disse Patricio Mero, senador da conservadora União Democrática Independente.
Enquanto se celebrava a reunião no Palácio de La Moneda, parentes de vítimas da ditadura chegaram aos arredores da sede do governo para protestar.
“Temos escutado do monsenhor Goic que eles não vão excluir ninguém desta proposta. Ao não excluírem, então incluem os violadores de Direitos Humanos, e isto é inaceitável”, disse à imprensa Lorena Pizarro, presidente da Associação de Parentes de Presos Desaparecidos.
Pizarro disse que a Igreja “está dando as costas para as vítimas (da ditadura). Quando se fala em misericórdia, deve-se ver as duas faces da moeda; há muitas senhoras de idade que ainda esperam saber de seus seres queridos”.
A ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990) deixou 3.000 vítimas, entre mortos e desaparecidos. Mais de 500 militares da época são processados por envolvimento nestes casos.
[b]Proposta gera polêmica[/b]
A proposta da Igreja Católica no Chile de perdoar militares da ditadura militar de Augusto Pinochet (1973-1990), apresentada nesta quarta-feira ao presidente Sebastián Piñera, desencadeou o repúdio imediato de vítimas da repressão diante da possibilidade de que violadores dos direitos humanos sejam beneficiados.
Fora do Palácio de La Moneda, sede do governo chileno, familiares de vítimas fizeram uma manifestação gritando “não à impunidade, o sangue dos nossos não pode ser negociado”.
O pedido de perdão da Igreja, criticado pela oposição, está causando uma dor de cabeça ao conservador Piñera. O irmão dele foi ministro durante a ditadura de Pinochet.
Já o senador da Concertación (aliança de esquerda que governou o país por 20 anos, desde a redemocratização) e ex-presidente Eduardo Frei (1994-2000) reiterou que não devem receber indulto os militares envolvidos com crimes contra a humanidade durante ou depois do regime militar.
“Se este é um projeto de lei que vai ao Congresso, não vamos aceitar nenhum caso de violações aos direitos humanos”, antecipou Frei.
De acordo com o senador, “deve haver clemência como pede a Igreja, mas em casos de violação dos direitos humanos não há espaço para nenhum benefício”.
Entre outros pontos, a proposta da Igreja Católica pede para incluir em indulto, alegando motivos humanitários, militares que cumpram sentença por crimes contra os direitos humanos, desde que tenham menor grau de responsabilidade nos casos e mostrem sinais de arrependimento.
A porta-voz do governo chileno, Ena Von Baer, disse que Piñera “vai refletir a respeito do documento e vai tomar uma decisão com base nos compromissos com a verdade e a justiça, a unidade nacional, a segurança cidadã e as considerações humanitárias”.
[b]Críticas [/b]
Mireya García, do Grupo de Familiares de Presos Desaparecidos (AFDD, na sigla em espanhol) disse que a proposta da Igreja “é contraditória, porque reconhece que neste país houve crimes contra a humanidade”.
“Dom Goic e o governo sabem muito bem que os crimes não são suscetíveis de indulto”, disse, referindo-se ao presidente da Conferência Episcopal do Chile (CEC), bispo Alejandro Goic, um dos religiosos que entregou a proposta.
A presidente da AFDD, Lorena Pizarro, advertiu que, se a solicitação vingar, irá pedir intervenção da Comissão Interamericana de Direitos Humanos [CIDH, órgão ligado à Organização dos Estados Americanos (OEA)] por “negação de justiça”.
Por sua parte, Patrícia Melero, lider da bancada do partido União Democrata Independente (UDI, que integra a coalizão governista) na Câmara de Deputados, qualificou a proposta da Igreja Católica como “integradora e não excludente, que convoca o país a um grande gesto de unidade nacional e de olhar para o futuro”.
[b]Fonte: AFP e Folha Online[/b]