Fachada de um templo da Igreja Universal em Angola
Fachada de um templo da Igreja Universal em Angola

O Intercept Brasil teve acesso a um processo trabalhista em que Carlos, um ex-pastor, afirma que Igreja Universal do Reino de Deus conduziu uma ‘investigação’ própria onde religiosos teriam ficado oito horas retidos, além de terem sido obrigados a entregar celulares e senhas bancárias.

Segundo a denúncia do ex-pastor, a Universal quebrou os sigilos de religiosos por suspeitar, depois de investigações internas, que vários deles estariam desviando dinheiro de boletos de doações de fiéis para colegas de outros templos que não conseguiam atingir metas de arrecadação.

O bispo Renato Cardoso, hoje o segundo homem na hierarquia da igreja e sucessor de Edir Macedo, chamou o caso de “investigação” na reunião do dia 24 de maio, segundo os relatos que constam no processo. O bispo Júlio Freitas, o outro genro de Macedo, também estava na reunião.

“Foi pedido para eu acompanhar o advogado e pastor Marcelo [Marcelo Serreti Bianco] para uma sala, onde ele dizia que eu precisava abrir todas as minhas contas e dar as senhas de tudo, celular, iCloud, e que para a igreja continuar acreditando e confiando na minha pessoa eu precisava abrir tudo. Fui mostrando todas as minhas contas e não tinha nada”, o ex-pastor relatou.

“Então, ali começaram gritos, ameaças, pressões psicológicas, e eu não sabia onde estava a minha esposa. Não conseguia falar com ela. Fui proibido de sair da sala”.

Na ação, a mulher de Carlos, Luciana, diz que o bispo Renato Cardoso teria xingado e ofendido os pastores.

“Trancaram a porta e colocaram um segurança. Não podíamos ver nada, mas podíamos ouvir tudo o que se passava lá fora. Eu ouvi muitos gritos de desespero dos pastores. Renato Cardoso gritava acusando os pastores de (formar) quadrilha, ladrão, safado. Ele via a conta dos pastores e gritava falando que era mentira”, contou Luciana.

Segundo a advogada Márcia Cajaíba, defensora de ex-pastores na Justiça, os religiosos que teriam comprado boletos de colegas não desviaram o dinheiro para suas contas. Mas a igreja os puniu “como exemplo aos demais”.

O ex-pastor disse que teve que mostrar a conta bancária na qual “não havia nenhum depósito suspeito”. Porém, considerou “um abuso e totalmente errado tal procedimento, o que culminou com sua saída (da igreja)”. Segundo o processo, a igreja lhe deu três horas para desocupar o imóvel em que residia, custeado pela instituição.

Metas de arrecadação

As metas de arrecadação da Universal variam em cada templo, de acordo com o tamanho e localização. Ao atingi-las, os religiosos que mais se destacam obtêm recompensas, como aumento salarial ou uso de apartamentos e carros mais modernos e luxuosos, segundo relatos de ex-pastores. Quem não consegue vai para igrejas menores e em locais afastados, de acordo com denúncias de ex-pastores da Universal. 

Carlos relata que cada dízimo e cada produto vendido dentro da Igreja é registrado em um sistema de gestão, o Sgiurd. Todas as informações internas são registradas ali, onde há o cadastro de cada obreiro e cada pastor.

“Eu saí da Universal justamente por não concordar com o sistema de cobranças de ofertas. É um sistema de meritocracia, quanto mais o pastor arrecada, mais ele cresce. Nunca concordei com isso e pedi meu desligamento”, afirmou ao Intercept o ex-pastor Davi Vieira, que atuou durante cinco anos na Universal. Ele é sobrinho de dois bispos da instituição e hoje mantém um canal com 129 mil seguidores no YouTube.    

O ex-pastor afirma que precisava convencer os fiéis de que o fortalecimento espiritual só seria alcançado quando começassem a prosperar financeiramente e, assim, contribuir mais com a igreja.

Danos morais e materiais

Um boletim de ocorrência aberto pela própria igreja também dá detalhes de como ocorre a suposta fraude. Acusações corroboram outras denúncias que já haviam sido feitas por ex-pastores sobre a pressão para os religiosos baterem metas de arrecadação de doações de fiéis.

Na ação judicial, Carlos pediu indenização por danos morais e materiais, e alega que foi obrigado pela igreja a realizar cirurgia de vasectomia aos 20 anos de idade. Mas perdeu em primeira instância – recorrerá agora ao Tribunal Regional do Trabalho.

Procurado pelo Intercept, Carlos preferiu não falar porque o processo ainda corre na justiça.  A Igreja Universal do Reino de Deus também não respondeu aos questionamentos do Intercept.

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Fonte: Intercept Brasil

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