Padres e congregações poderão se unir a uma espécie de diocese nacional, preservando versos do Livro de Oração Comum.
O Vaticano anunciou na semana passada que a Igreja Católica Romana irá abrir suas portas e fundar o equivalente a uma diocese nacional nos Estados Unidos, que permitirá a participação de ex-padres e congregações episcopais como grupos intactos.
Os fiéis que se juntarem à nova entidade terão os mesmos direitos que os católicos, assim como deverão também ter lealdade ao papa e se opor a métodos contraceptivos e ao aborto. Mas eles terão permissão para preservar versos do Livro de Oração Comum. Além disso, naquilo que um líder católico chamou de “um ato de generosidade”, padres que são casados estarão isentos da obrigação do celibato católico, embora eles talvez nunca tenham a possibilidade de se tornar bispos.
O novo grupo de fiéis, chamado de Ordem Pessoal da Cadeira de São Pedro, terá a sua sede em Houston e será liderado por Jeffrey N. Steenson, ex-bispo episcopal e pai de três filhos que deixou a igreja em 2007 e se tornou padre católico em 2009.
Steenson será um membro honorário da Conferência Americana dos Bispos Católicos e responderá diretamente ao Vaticano, declararam oficiais da igreja.
Líderes católicos e alguns ex-líderes episcopais estão comemorando a medida como um passo pequeno, porém notável levando em consideração uma história muitas vezes difícil nas relações entre o Vaticano e as congregações da Igreja Anglicana, que inclui os Episcopais, depois da sua ruptura no século 16.
A Igreja Episcopal é o principal ramo da Comunhão Anglicana nos Estados Unidos, um grupo internacional cujo administrador é o arcebispo de Canterbury, chefe da Igreja da Inglaterra. Ela tem sido abalada pela discórdia dos conservadores, que se opõem à ordenação de sacerdotes do sexo feminino, a aceitação de bispos com parceiros homossexuais e a mudanças na liturgia.
Enquanto os envolvidos somam apenas uma fração da Igreja Episcopal nos Estados Unidos, que tem mais de 7 mil sacerdotes e 2 mil membros, dezenas de paróquias têm se afastado para se juntar a ramos alternativos da Igreja Anglicana. Muitas não querem se tornar católicas, mas uma parte dos seguidores episcopais descontentes está pensando em se converter, algo que dizem ter sonhado há muito tempo.
“Estou animado com a oportunidade para aqueles que, em sua maioria, já estão com a Igreja Católica em seus corações”, disse o cardeal Donald Wuerl, arcebispo de Washington, em uma entrevista. O cardeal tem supervisionado o planejamento do acordo.
Desde que o Vaticano concedeu uma isenção ao celibato, em 1980, dezenas de sacerdotes da Igreja Episcopal aderiram ao seu sacerdócio, permanecendo casados. O novo ordinariato permitirá que os sacerdotes e suas congregações existentes possam estabelecer novas paróquias com um certo toque anglicano. Padres anglicanos solteiros que se juntem ao ordinariato não terão permissão para casar-se posteriormente.
[img align=left width=300]http://i0.ig.com/bancodeimagens/av/z4/q2/avz4q20i0t1r79buzlcf75769.jpg[/img]Até agora, mais de 100 padres e membros de diferentes paróquias, totalizando mais de 1.320, incluindo seis congregações de 70 ou mais pessoas, pediram para se juntar ao ordinariato, disse o padre Scott Hurd, um padre católico de Washington, que ajudou a projetar o novo sistema.
Steenson disse que espera que mais pessoas se juntem ao grupo após verem como funciona. Ele disse que, pessoalmente, sempre desejou relações mais amistosas com os católicos, um sentimento que apenas se intensificou quando a Igreja Episcopal quebrou a tradição ao aceitar sacerdotes do sexo feminino e permitir membros homossexuais, dividindo ainda mais as igrejas. Mas ele também está muito feliz em poder preservar os elementos da liturgia anglicana, disse. A expectativa é de que esta estrutura paralela continue indefinidamente.
Quando o Vaticano autorizou a criação dessas entidades em 2009, alguns líderes anglicanos, especialmente na Inglaterra, expressaram certa preocupação de que estivessem tentando se aproveitar da situação. Na Inglaterra, onde um grupo semelhante foi formado no ano passado, cerca de 60 sacerdotes e mais de mil membros fazem parte da entidade até hoje.
Mas Wuerl e Hurd disseram que o sistema foi desenvolvido como uma resposta a uma demanda crescente. “Alguns grupos anglicanos veem solicitando isso há 30 anos”, disse Hurd. “Este não é apenas um simples furto de ovelhas.”
Charles K. Robertson, assistente do bispo presidente da Igreja Episcopal, em Nova York, disse que o número de pessoas que deixaram a igreja foi muitas vezes exagerado. Ele observou que as previsões são pequenas e que nas últimas décadas um fluxo constante de católicos, frustrados com as restrições a respeito das mulheres e do casamento, entrou para a Igreja Episcopal.
Os líderes católicos disseram que não acreditam que a presença de padres casados, a maioria dos quais irá trabalhar no sistema paralelo do ordinariato, poderá causar algum tipo de discórdia dentro da Igreja.
“Está muito claro para todos que esses padres casados são uma exceção e que o celibato continua a ser a norma”, disse Hurd. “Esse é um ato de generosidade para com essas comunidades, para que elas possam ingressar com seus pastores e manter o vínculo que foi estabelecido entre si.”
“O compromisso com o celibato na igreja latina é muito profundo e é uma tradição que vem de longa data”, disse Wuerl. Futuros candidatos que queiram participar do ordinariato deverão se comprometer com o celibato, por isso aos poucos os padres casados irão desaparecer, segundo ele.
Charles Hough 3º, 57, de Fort Worth, um padre Episcopal há 31 anos, ficou descontente com as facções com tendências liberais da Igreja Episcopal. Em 2008, ele entrou para uma igreja rival, mas sempre sonhou em liderar sua congregação na Igreja Católica Romana. “Isso é algo pelo qual temos orado”, disse ele.
Ele renunciou a seu posto na Igreja Anglicana em março e tornou-se católico ao lado de 30 seguidores. Como dezenas de outros ex-padres episcopais que já se inscreveram, ele irá começar uma aula online em teologia católica romana e fará alguns procedimentos no final de janeiro, esperando ser ordenado em junho.
Nesse meio tempo, Hough faz alguns serviços de oração para sua pequena congregação em uma igreja improvisada em Cleburne, Texas, ao sul de Fort Worth. Na conservadora Forth Worth, onde quase toda a diocese deixou a Igreja Episcopal pela Igreja Católica há alguns anos, pelo menos quatro diferentes congregações, incluindo a de Hough, estão agora tentando se juntar ao ordinariato e tornar-se novas paróquias católicas.
Muitas destas já estiveram divididas entre “anglicanos e católicos”. “É uma alegria ser capaz de abraçar a plenitude da igreja”, disse Hough. “Deus está reformando sua igreja.”
Hough, que foi casado por 38 anos, tem um filho, Charles Hough 4º, que também é um ex-padre episcopal que procura agora ser ordenado como padre católico. O seu filho, que tem 30 anos, é casado e tem dois filhos pequenos, já liderou uma igreja episcopal de 70 pessoas. Agora, está dando aulas de catecismo, como ajudante, em uma igreja católica de 10 mil fiéis em Forth Worth. Ele espera poder continuar trabalhando naquela igreja depois que ele for ordenado.
Trabalhando ao lado de padres celibatários, seu filho disse não ter detectado nenhum tipo de ressentimento. “Cada um de nós enxerga os sacrifícios e as ofertas feitas por cada lado”, disse ele. Um padre celibatário tem mais tempo para deveres religiosos e devoção, disse ele, enquanto um homem casado enfrenta “uma necessidade de equilíbrio com a família.”
“Existe um fator de gerenciamento de tempo”, explicou.
[b]Fonte: Último Segundo[/b]