O padre Júlio Lancelotti pode ter o sigilo bancário quebrado pela polícia para apurar supostas transferências de recursos para o ex-interno da Febem Anderson Marcos Batista, 25, ou pessoas ligadas a ele.

O delegado da SIG (Setor de Investigações Gerais), André Luis Pimentel, afirmou neste sábado que vai apurar o valor da extorsão.

O advogado de defesa de Batista, Nelson Bernardo da Costa, afirmou ter recebido R$ 6 mil em honorários do padre. O pagamento seria referente à defesa que assumiu em um caso de homicídio e teria sido quitado em 2001.

Batista foi preso na sexta-feira (26), juntamente com sua mulher Conceição Eletério, 44, e Evandro Guimarães, 28, em um apartamento alugado em um prédio na rua Riachuelo (região central). Todos são acusados de extorquir o padre e permanecerão pelo menos até a semana que vem encarcerados em delegacias da zona leste.

O advogado negou que seu cliente tenha praticado extorsão e afirma que o dinheiro e os presentes foram dados pelo padre a título de “gratificação”.

De acordo com Costa, os pagamentos dos honorários foram realizados por depósito bancário, em seis parcelas de mil reais. Na época, Batista era acusado por homicídio doloso após matar a tiros um homem em uma briga de bar. Ele foi condenado a 12 anos e recorreu da sentença.

O delegado Pimentel afirmou que, para a polícia, até o momento, as investigações indicam que o padre foi “vítima de extorsão”. “Seria leviano afirmar o contrário com o que se tem até o momento”, disse. Cinco carros de luxo teriam sido comprados com o valor obtido do padre.

Relacionamento amoroso

Ex-interno da Febem, Batista teria conhecido e iniciado um relacionamento amoroso com o padre na instituição, onde foi internado aos 16 anos por roubo. “Eles chegaram a ter relações sexuais dentro da igreja”, disse o advogado de Batista. Em 2000, após fugir da instituição, teria começado a solicitar ajuda financeira ao sacerdote e, mais tarde, passado a exigir uma soma cada vez maior em dinheiro. Segundo o advogado de defesa, Lancelotti tinha conhecimento da condição de foragido de Batista.

O advogado afirma que o valor dos bens recebidos por seu cliente foi de quase R$ 700 mil e que o relacionamento entre o padre e ex-detento acabou após Batista ter se casado, em outubro de 2006.

O delegado-assistente da SIG Marco Antonio Bernardino informou que a Cúria Metropolitana de São Paulo (setor administrativo da Igreja Católica) pediu à Justiça, no início da semana passada, que o caso fosse conduzido sob sigilo.

Denúncia

O grupo preso nesta sexta-feira é acusado pela Polícia Civil de São Paulo de extorquir o padre Júlio Lancelotti, conhecido por ser um dos principais defensores dos direitos de jovens infratores e de moradores de rua de São Paulo. Foi o próprio padre quem procurou a polícia para denunciar o crime.

Os primeiros pedidos de dinheiro variavam entre R$ 800 e R$ 1,5 mil e eram feitos por meio de bilhetes. Os recados eram entregues pelos outros dois suspeitos, os irmãos Everson dos Santos Guimarães e Evandro dos Santos Guimarães. O padre deveria devolver o bilhete, para que não houvesse prova das ameaças, e entregar o dinheiro.

Pelo telefone, no entanto, as ameaças continuaram. Em uma das conversas gravadas pela polícia, Eletério e Batista ameaçam envolver o filho dela, que acusaria o padre de abuso sexual. Segundo o advogado do acusado, nesta gravação o padre afirma que estava sendo investigado e que as coisas ‘não acabariam bem’. Júlio Lancelotti nega qualquer tipo de abuso.

Arquidiocese manifesta solidariedade a padre Júlio Lancelotti

Dom Odilo Scherer, arcebispo de São Paulo, divulgou nota neste sábado prestando solidariedade ao padre Júlio Lancelotti, que teria sido vítima de extorsão de Anderson Marcos Batista, 25, um ex-interno da Febem. Dom Odilo afirma que a arquidiocese ficou satisfeita com a prisão de Batista que isso era necessário para que a verdade possa aparecer.

Batista foi preso na sexta-feira (26), juntamente com sua mulher Conceição Eletério, 44, e Evandro Guimarães, 28, em um apartamento alugado em um prédio na rua Riachuelo (região central). Todos são acusados de extorquir o padre e permanecerão pelo menos até a semana que vem encarcerados em delegacias da zona leste.

O arcebispo afirmou ainda que ficou perplexo com as “acusações levianas” feitas contra o padre, que sempre teve o seu trabalho social “devidamente monitorado por quem de direito”.

O advogado de defesa de Batista, Nelson Bernardo da Costa, afirmou ter recebido R$ 6 mil em honorários do padre. O pagamento seria referente à defesa que assumiu em um caso de homicídio e teria sido quitado em 2001.

Ainda segundo Costa, o ex-detento teria conhecido e iniciado um relacionamento amoroso com o padre na instituição, onde foi internado aos 16 anos por roubo.

Dom Odilo afirma que “lamentavelmente, de vítima, agora ele [padre Júlio] está sendo transformado em réu” e que a Igreja confia no “trabalho da justiça e estará acompanhando as investigações”.

Leia a nota divulgada pela arquidiocese:

A Arquidiocese de São Paulo manifesta sua satisfação pelo trabalho de investigação da Polícia, que resultou na prisão de várias pessoas acusadas de atos de chantagem e extorsão contra o Padre Júlio Lancelotti. Esse era um passo muito esperado e necessário para o prosseguimento das investigações e para que a verdade sobre as suspeitas levantadas contra o Padre possa aparecer.

Por outro lado, causam grande perplexidade as acusações levianas feitas contra o Padre Júlio, que é bem conhecido, há muito tempo, e sempre esteve em evidência na cidade de São Paulo; seu trabalho social foi sempre devidamente monitorado por quem de direito. Com seu valioso trabalho social em benefício de numerosas pessoas que vivem em condições de total exclusão social e, muitas vezes, em situações de marginalidade, e com seu trabalho religioso, ele sempre buscou ajudar essas pessoas a recuperarem sua dignidade, para uma adequada re-inserção social. Para isso, ele teve e tem o incentivo e o apoio da Igreja e também de grande parte da sociedade.

É bom recordar que foi o próprio Padre Júlio quem apresentou a denúncia à polícia de ele que estava sendo vítima de extorsão e, para isso, era chantageado, mediante a ameaça da acusação de pedofilia. Sobre isso foi recolhido farto material comprobatório. Lamentavelmente, de vítima, agora ele está sendo transformado em réu.

Toda pessoa deve ser considerada inocente, até provas em contrário. Aos acusadores cabe a responsabilidade de apresentar provas convincentes para suas acusações. E ninguém pode ser condenado, mesmo na opinião pública, antes do processo formal e sem ter tido a possibilidade ampla de defesa.

Padre Júlio tem a solidariedade da Arquidiocese de São Paulo, que confia no trabalho da justiça e estará acompanhando as investigações.

São Paulo, 27 de outubro de 2007
D. Odilo Pedro Scherer
Arcebispo de São Paulo

Fonte: Folha Online

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