O reverendo Emerson Patriota, da Igreja Presbiteriana de Londrina, no PR, durante culto Foto: Reprodução/Youtube
O reverendo Emerson Patriota, da Igreja Presbiteriana de Londrina, no PR, durante culto Foto: Reprodução/Youtube

Fiéis da Igreja Presbiteriana Central de Londrina, no Paraná, foram “desafiados” no último domingo, 26, a assinarem uma ficha de apoio à criação do Aliança pelo Brasil, partido idealizado pelo presidente Jair Bolsonaro. 

O reverendo Emerson Patriota foi quem pediu, do púlpito, para os membros da congregação colocarem seus nomes na lista que será entregue à Justiça Eleitoral. Representantes de um cartório da cidade estavam no local para reconhecer as assinaturas.

O vídeo do culto foi publicado no canal oficial da igreja, e posteriormente apagado. Cópias circulam nas redes sociais.

“Vocês viram um grande ônibus estacionado ali no nosso estacionamento escrito ‘Aliança pelo Brasil?’”, pergunta o pastor. “Esse ônibus, nós estamos fazendo um apoio a essa…esse movimento que está tendo no Brasil pra formação desse partido político (…) encabeçado pelo nosso presidente Jair Messias Bolsonaro”.

Depois, o pastor Patriota acrescenta: “E nós montamos ali um local, espaço, para que você possa no final do culto passar por lá, conhecer mais os valores desse futuro partido, e você possa fazer seu apoiamento. Inclusive nós temos aqui o pessoal do cartório pra facilitar todo esse processo, porque tem que ser firma reconhecida, aquela coisa toda”.

“Nós estamos desafiando você, todos, a passarem lá, conhecerem o estatuto, os valores”, disse o reverendo. “Na verdade, eu estava conversando com algumas pessoas e disseram que é mais difícil entrar nesse partido do que em algumas igrejas por aí. Tem que ter mais vida idônea do que algumas igrejas exigem. Isso é muito bom porque tem valores familiares.”, disse Patriota.

O pastor Patriota afirmou no culto que a igreja assumiu o “compromisso” de orar pela “missão” do deputado federal Filipe Barros (PSL-PR).

Procurado por O Antagonista, Barros confirmou ser membro da igreja, uma instituição “que sempre participou da vida política da cidade, do estado e do país”.

“Nós cremos que é papel do cristão não apenas atuar dentro das quatro paredes da igreja, mas sim na sociedade como um todo. Então junto com o meu pastor, pastor Emerson Patriota, nós combinamos de fazer esse ato de apoiamento voluntário”, disse Barros.

O deputado afirmou que “centenas” de assinaturas foram coletadas no domingo. Naquele dia, estava em viagem à Índia, integrando a comitiva presidencial.

Segundo o deputado, “inúmeros apoiadores” pagaram pelo ônibus da Aliança, sem “um centavo” de dinheiro público.

Procurada desde esta manhã por O Antagonista, a Igreja Presbiteriana Central de Londrina não retornou o contato.

Para tirar o Aliança do papel, Bolsonaro precisa de aproximadamente 492 mil assinaturas.

O Aliança precisa ser homologado até 4 de abril para concorrer nas eleições municipais de 2020. Articuladores admitem que o partido pode não estar formalizado a tempo do pleito de outubro.

O culto foi transmitido pelas redes sociais. No YouTube, internautas começaram a fazer comentários criticando a igreja. Nesta terça-feira, 28, o vídeo já não estava mais disponível. Procurada, a instituição ainda não se manifestou. 

Veja o vídeo abaixo:

Investigação sobre apoio de cartórios e igrejas

Nesta terça-feira, 28, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União pediu a abertura de uma investigação para apurar o controle da regularidade na coleta de assinaturas para a formação da Aliança pelo Brasil, novo partido do presidente Jair Bolsonaro.

O subprocurador-geral Lucas Furtado defende ainda que seja verificada a atuação da Justiça Eleitoral, do Ministério Público Eleitoral e o Conselho Nacional de Justiça na análise desses procedimentos.

Na presentação, Furtado cita um acordo da Aliança com cartórios, que envolve uma orientação do Colégio Notarial do Brasil, que reúne cartórios de 24 unidades da federação, para que todos  forneçam aos eleitores fichas de filiação ao novo partido. 

Após assinados, os documentos têm suas firmas reconhecidas pelos cartórios, que guardam o material e repassam a um representante credenciado do partido do presidente. O CNJ negou liminar pedida por partidos da oposição para suspender o procedimento.

Furtado cita que o próprio estatuto do Colégio Notarial estabelece que “é vedado ao CNB participar, apoiar ou difundir, ativa ou passivamente, quaisquer manifestações de caráter político”.

O representante do MP junto ao TCU aponta ainda que a atuação das igrejas evangélicas na coleta de assinatura em prol do partido  pode ser caracterizada como doação eleitoral ilegal. Isso porque pode caracterizar o fornecimento de mão de obra (mensurável em termos econômicos) e estrutura física dos templos em prol de uma determinada agremiação política.

“Situação que reclama a pronta atuação da Justiça Eleitoral e do Ministério Público Eleitoral no  sentido de adotar os procedimentos necessários a verificar a regularidade dessa situação, cabendo igualmente ao TCU, nos mesmos moldes acima delineados em relação ao CNJ, verificar se esses órgãos eleitoras estão cumprindo adequadamente suas atribuições constitucionais e legais”, escreveu Furtado.

O ex-procurador regional eleitoral de São Paulo Luiz Carlos dos Santos Gonçalves avalia que coletar assinaturas em igrejas para um partido político não é ilegal. A restrição só ocorre em período de campanha eleitoral , quando candidatos não podem pedir votos em locais classificadas como “bens públicos”. 

“Se não houver constrangimento para que as pessoas assinem, não há ilegalidade. Se a pessoa é forçada a fazer aquilo, aí surge a ilegalidade. Neste caso, está dentro do espaço da confissão e não há problema”, afirmou Gonçalves. 

No caso de Londrina, o ex-procurador não vê ilegalidade no discurso do pastor ao “desafiar” os fiéis a apoiar o partido. “A igreja é sempre uma associação voluntária. Se as pessoas estão ali é porque elas aceitam aquela pauta. Se houver um caso em que a pessoa se sentir forçada a assinar, aí seria um caso de polícia.”

Outras igrejas

Além da Presbiteriana em Londrina, lideranças de outras igrejas evangélicas no País se mobilizam para ajudar Bolsonaro a oficializar o Aliança pelo Brasil.

No último sábado, 25, aliados do presidente recolheram assinaturas na Assembleia Legislativa do Amazonas. O presidente da Assembleia de Deus no Estado, Jônatas Câmara, pediu que apoiadores fossem ao local para integrar a lista.

O pastor, que recebeu Bolsonaro em novembro para um culto em Manaus, é irmão do deputado Silas Câmara (Republicanos-AM), líder da bancada evangélica na Câmara. É também irmão do pastor Samuel Câmara, presidente da Assembleia de Deus no Pará e um dos maiores líderes da denominação evangélica no País.

O deputado Silas Câmara disse que o apoio ao Aliança pelo Brasil não é institucional, mas é feito pela movimentação de pastores e outros líderes simpáticos à nova sigla. “Dentro de igreja, esquece. Eles (os pastores) estão atentos a esses movimentos de direita organizados e participam indo lá”, afirmou o deputado.

Fonte: Estadão e O Antagonista

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