A pesquisa Mudança de Religião no Brasil, realizada pela Ceris, ligado à CNBB revela que a experiência de mudança de religião atinge mais de 20% da população brasileira, sendo mais comum entre pessoas de idades medianas.

Luciana de Campos Machado, 23 anos, não faltava à missa aos domingos. Participava de grupos de orações direcionados a jovens, organizava quermesses, freqüentava terços e novenas com a mãe, e era auxiliar de catequese. A religião católica era a tônica dos compromissos de sua agenda. Até que um dia, o namorado de Luciana, que era evangélico, a convidou para ir à igreja que ele freqüentava. Era início de 1999.

Luciana gostou do que viu e ouviu e da forma como os fiéis eram instruídos a rezar. Resultado: trocou a Igreja Católica pela Batista Nacional, religião que segue até hoje, sete anos depois. “Percebi uma palavra a mais de conforto, passei a sentir mais a presença de Deus sem nenhum desvio”, afirma. “Antes disso, a obra de Deus em minha vida era diferente. Hoje leio a Bíblia e não fico só no que o padre fala na igreja.”

Depois de seis meses na nova religião, Luciana batizou-se na Igreja Batista Nacional. De família tradicionalmente católica, ela lembra que inicialmente enfrentou os argumentos contrários de seus pais.

“Hoje, percebo que minha mãe prefere que eu seja mesmo 100% evangélica porque vê meu testemunho, meu modo de vida, que é reflexo da minha religião e da obra de Deus na minha vida.”

A experiência de mudança de religião que ocorreu com Luciana atinge mais de 20% da população brasileira, sendo mais comum entre pessoas de idades medianas.

A conclusão é da pesquisa Mudança de Religião no Brasil, realizada pela Ceris (Centro de Estatística Religiosa e Investigações Sociais), ligado à CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil).

O estudo, que foi apresentado durante a assembléia anual que reúne os bispos brasileiros em Indaiatuba, busca desvendar sentidos e motivações da mobilidade entre religiões.

Segundo a pesquisa, os católicos cedem fiéis em grande parte para as religiões evangélicas pentecostais e recebem de forma significativa apenas de outras religiões. Mas o estudo leva em conta também que há uma circularidade e um movimento de ingresso de pentecostais no catolicismo.

Foi o que ocorreu com o universitário Felipe Alberto Lino Oliveira, 23, que há cinco anos deixou o catolicismo para ser evangélico. “A nova religião passou a responder melhor meus anseios”, diz.

“Eu não concordava mais com muitas explicações e à medida que fui lendo a Bíblia encontrei as respostas.” Oliveira é de uma família com tradição católica e resolveu procurar outra religião por influência da madrasta, que é evangélica. Seu pai, que é separado de sua mãe, também optou pela troca depois do segundo casamento.

Trocas

O estudo mostra que a maior mobilidade ocorre entre os que não têm religião ou são católicos e passam a freqüentar igrejas evangélicas pentecostais. A maior mobilidade religiosa também se dá com aqueles que têm maior nível de escolaridade: 37% mudaram de religião. A proporção varia pouco quando o corte é feito por idade ou sexo, que também são variáveis verificadas pela pesquisa.

A pesquisa do Ceris foi realizada entre maio e outubro de 2004, com 2.870 brasileiros que vivem em 61 municípios, incluídas todas as capitais. Os resultados têm representação nacional porque os dados foram projetados levando-se em conta o último censo do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

A pesquisa do Ceris também perguntou qual é a principal motivação para a mudança de fé. Em primeiro lugar ficou a justificativa discordância dos princípios ou da doutrina. Entre os motivos para a escolha da nova religião estão se sentir melhor, aproximar-se mais de Deus, receber ajuda nos momentos de dificuldades pessoais, encontrar a fonte de bênção e graça, ou até mesmo ter aceitado o convite de familiares e amigos.

A pesquisa também aponta as pessoas divorciadas ou separadas judicialmente são as que mais trocam de religião no País. Entre os divorciados, 52% mudaram de credo, segundo o estudo do Ceris; entre os separados judicialmente, 35% o fizeram. Cruzando os dados com o último censo do IBGE, é possível indicar que 2.155.736 pessoas separadas ou divorciadas trocaram de religião.

MOTIVOS

O vigário-geral de Araçatuba, padre Charles Borg, relaciona quatro fatores para explicar o abandono da religião católica por parte de uma parcela dos fiéis, que optam por outros credos.

O primeiro motivo, de acordo com ele, é a formação catequética deficiente, o que torna o católico vulnerável a outras opiniões. O segundo é o imediatismo das pessoas. Borg acredita que as elas procuram respostas rápidas inclusive para problemas de cunho pessoal.

“E muitas respostas, para serem verdadeiras, demandam tempo”, afirma.

O terceiro fator apontado pelo vigário é a facilidade para a formação das comunidades neopentecostais. Diferentemente da hierarquia rígida do catolicismo, ou mesmo da exigência de uma preparação específica inclusive para os leigos, as religiões neopentecostais formam-se com mais facilidade, o que possibilita na visão do vigário a disseminação de novos templos, mais próximos das comunidades periféricas.

O último fator apontado por ele é a linguagem pouco acessível do catolicismo, que dificulta a catequese e o comprometimento dos católicos.

CASAMENTO

Borg justifica que os divorciados e separados judicialmente são os que mais migram do catolicismo para outras religiões, como mostrou a pesquisa, porque para a Igreja Católica o matrimônio é indissolúvel.

“Há situações em que não há como manter a união, mas o catolicismo não concede a bênção para um segundo casamento”, explica. “Diante dessa negação, o fiel acaba procurando outra religião que conceda a bênção.”

Para o vigário, existe um ponto mais preocupante quando o assunto é religião que a simples mobilidade entre credos retratada no estudo da CNBB: é a falta de religião.

A pesquisa do Ceris indicou que apenas 7,8% dos entrevistados declararam-se ateus ou sem religião. “Sabemos que não basta dizer que segue uma religião, quando a pessoa não se pauta pelos princípios evangélicos de seu credo”, diz.

“E esse é um problema de qualquer religião. Independentemente da filiação eclesial, o número dos sem-religião é ainda muito maior porque tem gente que está na igreja ou no culto, mas não se pauta pelos valores evangélicos. Ou nem mesmo freqüenta sua igreja para conhecê-los a fundo e praticá-los”.

Fonte: Folha da Região

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