Bíblia aberta em púlpito de uma igreja vazia (foto: Reprodução - Comunhão)
Bíblia aberta em púlpito de uma igreja vazia (foto: Reprodução - Comunhão)

Se, por um lado, a estimativa aponta que o número de evangélicos passará o de católicos no país nos próximos 10 anos, por outro, fica a pergunta: que tipo de igreja teremos no futuro? Relativismo, cultos focados no entretenimento, falta de compromisso com a Bíblia, mornidão espiritual e normalização de práticas mundanas entre alguns crentes devem ligar o alerta sobre os riscos de se comprometer a nova geração de cristãos e transformar a casa de Deus em um lugar comum.

“Estamos perdendo os valores que norteiam a igreja e diluindo nossa responsabilidade frente aos desafios de sermos uma liderança comprometida. Essa diluição vem por meio de uma teologia descomprometida com os ensinos dos apóstolos. Estamos inventando uma religião que agrade ao povo, com um sermão que não ofenda o pecador, e exigindo um sacrifício sem qualquer custo pessoal”, alerta o pastor José Ernesto Conti, da Igreja Presbiteriana Água Viva, em Vitória (ES).

O pastor acredita que um dos grandes problemas que têm enfraquecido algumas igrejas atualmente é a baixa qualidade dos cultos. “Em lugar de pregar o que Deus quer, estamos cada dia mais pregando para agradar a uma plateia ávida por ouvir uma boa notícia e uma esperança agradável, mesmo que isso não signifique absolutamente nada!”, ressalta Conti.

Para ele, a responsabilidade para que a situação não piore deve partir da liderança da igreja. “A liderança precisa entender que viver para a glória de Deus é mais importante do que 10 mil membros. O problema é que hoje, para manter 10 mil membros ligados a uma igreja, só ‘barateando’ o evangelho, abrindo mão da Verdade por um sofisma, apresentando semanalmente uma ilusão de um Deus que está ‘louco’ para te abençoar”.

Para o pastor e professor acadêmico Geraldo Moyses Gazolli Junior, mestre em Ciências da Religião e doutorando em Teologia, existem vários fatores a serem considerados, quando o assunto é o enfraquecimento da igreja, entre eles, os motivos equivocados quando se passa a fazer parte de uma denominação religiosa.

“Quando escolho onde irei congregar apenas pensando em como me sinto, e não por causa da doutrina, posso entrar em um campo perigoso. O sentimentalismo exacerbado pode me levar a pensar que hoje estou em um bom lugar, mas mês que vem já não me serve. Se nós não submetermos os nossos sentimentos a Deus, estamos fadados a sermos carregados por todo vento de animosidade, inclusive o de não querer mais ir à Casa de Deus e me tornar um desses ‘cristãos de podcast’, que veem vídeos de 15 segundos e acham ser isso o equivalente à comunhão com o Corpo de Cristo”, ressalta Gazolli Jr.

Quando o mundo passa a fazer parte da igreja

Outro grave problema apontado pelo pastor e que deve ligar o alerta da liderança é a ‘mundanização’ da igreja. “John Piper pontuou certa vez que ‘uma igreja que usa métodos mundanos atrairá pessoas mundanas e não convertidas’. A igreja precisa ser o caminho da salvação e alternativa a um mundo decadente. Algumas igrejas se seduzem pelos números e fazem atualizações litúrgicas que desestimulam aqueles que querem escapar do mundo e percebem que, lá dentro, não há muita diferença do restante”, alerta.

Para acabar com a mornidão e o esfriamento espiritual, o pastor Geraldo acredita que a igreja precisa voltar ao ‘primeiro amor’, focado nas Escrituras e em Cristo Jesus. “Precisamos focar em nossas fileiras e buscar novamente o prolegômeno da nossa doutrina. Salvar do pecado, apresentar nosso Salvador crucificado, ressurreto e prestes a vir. Oferecer libertação. A fórmula não mudou, mas nós precisamos nos unir em nossas igrejas para que venha esse despertamento”, enfatiza.

Atual modelo de gestão mais atrapalha do que ajuda

Para o empresário cristão e teólogo Fábio Hertel, que é articulista de Comunhão, o problema não é apenas de cunho espiritual. Ele acredita que o fator social e a forma como as novas igrejas têm surgido no país acabam por criar doutrinas rasas e superficiais e, consequentemente, membros de igrejas rasos e superficiais.

“As igrejas ‘tradicionais’ perderem espaço para igrejas estilo ‘comunidade’, que não foram aperfeiçoadas com o objetivo de manter a mesma questão da administração, da condução dos irmãos, das relações entre líderes e liderados, ou seja, todas essas questões das instituições mais consolidadas, milenares, as de estilo ‘comunidade’, perderam”, justifica Hertel.

Segundo o teólogo, entre as características desse modelo atual de “igreja comunitária” está a forma como a liderança age. “Há alguns líderes que se autointitulam pastores, quase intocáveis, como um papa que assumiu a ‘infalibilidade papal’, e há membros de igrejas que concordam com essa situação. Então, há de se ter aí uma assembleia, um conselho que vai deliberar sobre esses assuntos, colocar isso tudo em pauta e apontar a solução, com maturidade e sabedoria”, enfatiza.

O articulista ressalta, ainda, a importância de a igreja se modernizar, desde que isso não crie fracos modelos mirabolantes de gestão eclesiástica. “Não precisamos voltar àquela coisa engessada e que, às vezes, era até escravizante. Os líderes do passado se submetiam às diretorias, aos presbitérios, à equipe diaconal, e a pessoa não podia fazer nada. Mas é voltar um pouco para trás, olhar para o cenário atual e criar estruturas alternativas de gestão, de forma mais compartilhada, onde não fique 100% em cima da liderança”, finaliza.

Fonte: Comunhão

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