Sala de aula com cruz (Foto: Reprodução)
Sala de aula com cruz (Foto: Reprodução)

O governo do Quebec aprovou um projeto de lei que impede que professores, juízes, policiais e funcionários públicos utilizem símbolos religiosos em ambientes de trabalho. A medida provocou uma onda de protestos sobre a liberdade civil na província.

De acordo com o primeiro-ministro de Quebec, o político de direita François Legault, o projeto é uma providência necessária para garantir que exista uma separação entre a religião e o Estado. A medida estabelece que o uso de lenços na cabeça, quipá, turbantes, entre outros símbolos religiosos, sejam vetados durante o trabalho. O projeto foi aprovado por 73 a 35 votos.

Em contrapartida, membros da oposição classificaram o último domingo, 16, como um dia sombrio para a província. Segundo manifestantes, a nova legislação fará com que muçulmanos, judeus e outros religiosos percam parte de sua autoridade. Ademais, segundo os opositores, a aplicação dessa lei passaria por cima a liberdade religiosa do multiculturalismo do Canadá.

Além disso, os opositores argumentaram que a nova medida fortaleceria a islamofobia e o antissemitismo, podendo atingir a outras minorias. Em resposta, os funcionários públicos prometeram ignorar a lei como forma de manifestação.

Com a lei em vigor, o governo afirmou que serão enviados inspetores para verificarem se a nova legislação está realmente sendo obedecida. A medida foi questionada pela oposição, que apontou uma criação da “força policial do secularismo”. Funcionários públicos que desrespeitarem a lei poderão enfrentar medidas disciplinares.

Em abril deste ano, milhares de pessoas foram às ruas em Montreal, cidade localizada em Quebec, para realizar um protesto contra a lei dos símbolos religiosos. Nas placas, os manifestantes ressaltavam que “o que está ou não na minha cabeça não importa”.

A advogada Catherine McKenzie, de um dos grupos que tenta derrubar a nova legislação, afirmou que o “governo está introduzindo uma lei que retira o direito de milhares de pessoas”.

“Esse projeto de lei se baseia nas mesmas forças do populismo que vemos nos Estados Unidos e na Europa, que é ter medo do outro”, afirmou a advogada.

De acordo com a advogada, o Conselho Nacional dos Muçulmanos Canadenses e a Associação Canadense de Liberdades Civis seriam totalmente afetados pela proibição dos artefatos religiosos. Isso porque, as mulheres que trabalham nestes lugares e utilizam os lenços seriam prejudicadas pela nova lei.

Segundo a Constituição canadense, o governo de Quebec não tem o direito legal de criar uma lei entre a relação religiosa e o Estado. Porém, contestar esse fato dentro dos tribunais pode ser bastante complicado. Isso porque, o governo conta com uma “brecha” constitucional, que é raramente usada, conhecida como “cláusula não obstante”. A medida autoriza que a lei se sobreponha a certos direitos constitucionais, como a liberdade de expressão ou religião.

Defensores do projeto de lei afirmam que o texto irá proteger Quebec, garantindo o respeito às mulheres e a defesa dos diretos dos homossexuais, impedindo que símbolos religiosos possam diminuí-los.

Segundo Amani Bem Ammar, descendente muçulmana de 34 anos que migrou para Montreal há seis anos, o projeto é uma forma de representar o Estado em posições de autoridades que precisam continuar neutras.

“Como pode um juiz usar um lenço na cabeça e ser considerado neutro em um caso envolvendo um homossexual? A diversidade é importante na sociedade, mas o Estado precisa evitar conflitos entre deveres profissionais e religião”, afirmou Amani, que ressaltou que deixou seu país devido à pressão do islamismo e que não espera enfrentar isso também em Quebec.

Após inúmeras críticas da oposição, o governo alterou a medida, esclarecendo que o símbolo constituía “qualquer vestimenta, símbolo, joia, enfeite, acessório ou quipá usado como símbolo religioso, convicção ou crença”.

A legislação não se aplicará aos profissionais que já trabalham em setores públicos, desde que permaneçam na mesma posição. Em contrapartida, uma professora que, por exemplo, utiliza um véu não poderá ser promovida a uma alta posição caso se recuse a retirar o lenço.

Ademais, advogados que usam estes símbolos religiosos também não poderão mais trabalhar como consultores externos para o governo, ou representá-los perante os tribunais.

Nos anos 60, Quebec enfrentou uma revolta social conhecida como “Revolução Silenciosa“, a qual moradores se rebelaram contra a influência da Igreja Católica Romana na província. Na época a Igreja, inclusive, pressionava mulheres a terem filhos.

Fonte: Opinião & Notícia

Comentários