O teólogo Leonardo Boff afirmou nesta terça-feira que a renúncia de Bento 16 é “o grande legado” de seu pontificado por seu caráter inédito e por ter “desmistificado a figura do papa”.
Em entrevista publicada pelo jornal mexicano “Reforma”, Boff disse que a renúncia foi “um gesto de desespero pessoal” de Bento 16 “em conjunto com suas limitações físicas e psicológicas” diante dos problemas enfrentados pela Igreja Católica.
Entre os problemas que perturbaram o papa alemão, mencionou os impedimentos para permitir que os sacerdotes pedófilos fossem entregues à justiça civil, o vazamento de informações e documentos do “Vatileaks” e os escândalos do Banco do Vaticano.
No final, disse, Bento 16 “recebeu um balanço altamente negativo da situação da cúria, pois tinha sido instalado, praticamente, um governo paralelo da Igreja” e “o seu mundo veio abaixo”.
“O papa se deu conta de que já não conseguia dirigir a Igreja. Outro deveria vir para regular a situação. Renunciou com elegância, sem denunciar ninguém e fazendo menção somente as suas limitações de saúde. Mas foi uma advertência fortíssima à cúria vaticana, que deve agora esperar profundas reformas”, apontou.
Para o teólogo, Bento 16 “é um intelectual refinado e um professor, não tem carisma e é extremamente tímido. Se sentiu o sucessor de Pedro, mas não soube dirigir o governo da Igreja”.
“Eu, que o conheci, sempre imaginei o quanto sofria quando tinha que enfrentar as multidões de fiéis. Sua grande preocupação era a secularização da Europa e o relativismo da modernidade”, comentou.
“Para nós (os latino-americanos), que estamos na periferia do mundo e no meio dos pobres, optar pela Europa significa, politicamente, optar pelos ricos”, destacou.
Boff considerou que Bento 16 entrará para a história como “uma pessoa que enquanto era presidente do ex-Santo Ofício condenou mais de 100 teólogos, dos melhores, especialmente da Teologia da Libertação”, uma corrente de pensamento que “nunca entendeu”.
Boff reprovou o fato de Bento 16 aceitar “a versão dos críticos” da Teologia da Libertação, “os militares e as elites opulentas (latino-americanas) que acusavam qualquer tentativa de mudança da realidade social, como livrar os miseráveis de sua pobreza, como coisa de comunistas”.
Nascido em Concordia (1938), Boff é um dos mais destacados representantes da Teologia da Libertação e terminou abandonando a Igreja por suas divergências com o Vaticano.
Hoje considera a Igreja Católica “demasiada ocidental, patriarcal, machista e antifeminista”, e afirmou que a instituição necessita “dialogar com o mundo” urgentemente.
O ex-frade franciscano chegou a ser castigado com o silêncio pela Congregação da Doutrina da Fé do Vaticano quando esta era comandada pelo então bispo Joseph Ratzinger, atual pontífice e que encerrará seu papado na próxima quinta-feira.
[b]ENTENDA O PROCESSO SUCESSÓRIO DO PAPA
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Quando o chefe da Igreja Católica renuncia a sua função ou morre, seu sucessor é eleito pelos cardeais reunidos em conclave na Capela Sistina, onde ficam isolados do mundo exterior.
Cinco cardeais brasileiros deverão participar do conclave que se reunirá para eleger o sucessor do papa Bento 16.
Segundo a última lista do Vaticano, há um total de 115 cardeais aptos a escolher o novo pontífice, já que um deles (Keith O’Brien, da Escócia) renunciou ao cargo e outro (Julius Riyadi Darmaatmadja, da Indonésia) por problemas de saúde não poderá comparecer a eleição.
Para poder votar na escolha do papa, o cardeal precisa ter menos de 80 anos. O Brasil tem um total de nove integrantes no Colégio Cardinalício do Vaticano, mas quatro deles já ultrapassaram a idade limite.
[b]Fonte: EFE[/b]