O Supremo Tribunal Federal (STF) declarou inconstitucional a norma, em vigor há 20 anos, que veda o proselitismo religioso nas rádios comunitárias.
A maioria dos ministros entendeu, na sessão desta quarta-feira (16/5), que a proibição não é compatível com os dispositivos da Constituição que asseguram a liberdade de expressão, a liberdade religiosa e o livre exercício de cultos religiosos.
Por 7 votos a 2, o Supremo julgou procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade 2566, proposta pelo Partido Liberal, e excluiu do ordenamento jurídico a §1º do artigo 4º da Lei 9.612, que estabelecia: “É vedado o proselitismo de qualquer natureza na programação das emissoras de radiodifusão comunitária”.
No julgamento da liminar nesta ADI em 2002, prevaleceu no plenário do STF sentido oposto. Celso de Mello e Marco Aurélio, remanescentes da composição do tribunal daquela época, votaram da mesma forma nesta quarta-feira, e, desta vez, foram acompanhados pela maioria.
O relator, ministro Alexandre de Moraes, ficou vencido e foi acompanhado apenas pelo ministro Luiz Fux. Moraes sustentou que a lei não limita a divulgação de ideias, mas o proselitismo, que poderia distorcer o objetivo da rádio comunitária que, em vez de informar, passaria a forçar o convencimento em um determinado sentido.
“A ideia da vedação aqui é proibir utilização do monopólio das rádios com a única finalidade de converter os ouvintes para uma religião específica”, argumentou. O Estado não pode oferecer, disse, um instrumento para que se realize proselitismo, seja religioso ou não: “Quando envolve religião é ainda mais grave, porque Estado é laico”.
Prevaleceu, no entanto, a divergência inaugurada pelo ministro Edson Fachin, que foi seguido pelos ministros Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio, Celso de Mello e Cármen Lúcia — não votaram os ministros Dias Toffoli, em viagem oficial, e Gilmar Mendes, que estava impedido.
Fachin disse que há “ostensiva inconstitucionalidade na lei”, uma vez que afronta garantias constitucionais de livre manifestação de pensamento e de livre exercício dos cultos religiosos. “Cumpre reconhecer que o discurso proselitista é da essência do integral exercício religioso, de tal modo a finalidade de alcançar o outro mediante a persuasão”, disse.
Barroso acompanhou o raciocínio e afirmou que “eventuais abusos devem ser reparados a posteriori“, sem censura prévia. Weber também seguiu nessa linha e ressaltou que o termo “proselitismo” tem um conceito amplo e serve para qualquer ação no sentido de convencer outro a aderir uma ideia, seja na área religiosa, social, cultural, artístico, entre outras. “Parece que a norma foi mais longe do que precisava ir. O que se discute é saber se o caráter proselitista pode ser justificativa constitucionalmente válida a se rejeitar determinados discursos em razão de sua natureza”, alertou.
Próximo a votar após a Weber, Fux divergiu e afirmou que o proselitismo não combina com a liberdade de expressão prevista na Constituição. “O proselitismo é uma ameaça à democracia, ao pluralismo político e à soberania popular. Não podemos permitir que uma rádio filtre ou manipule informações na medida dos interesses de seus sócios e associados”, frisou.
Lewandowski, por sua vez, elogiou o voto de Moraes, mas divergiu da conclusão. “O dispositivo legal pode colidir com os dispositivos da nossa Carta Magna que defendem não apenas a liberdade de expressão, mas também a liberdade ampla de comunicação por parte da mídia em geral”, ressaltou.
A presidente chamou atenção para outro aspecto e comparou as regras das rádios comunitários aos veículos de comunicação privados: “Além da agressão à liberdade de expressão, há uma desigualdade com outras rádios que não têm esse tipo de vedação”.
Fonte: JOTA