O reverendo Jeremiah Wright, que está sendo fortemente criticado por ter embaraçado a campanha presidencial do senador Barack Obama, encontrou forte apoio nos púlpitos de igrejas de negros na Carolina do Norte. Porém, os fiéis que sentam-se nos bancos das igrejas têm uma visão bem mais negativa em relação ao fato.

Em entrevistas em igrejas de cidades como Charlotte, Greensboro, Lumberton e Goldsboro, os pastores afirmaram que Obama e Wright foram atacados por uma mídia superficial e tendenciosa. Muitos disseram que utilizam os sermões de Wright na aulas de estudos bíblicos. Eles estão fazendo palestras sobre as raízes do estilo de Wright e pregando contra aquilo que vêem como tentativas de tornar Wright uma figura divisiva.

“As pessoas ficam furiosas quando vêem certos indivíduos tentando transformar um candidato presidencial em um bode expiatório devido a um pastor”, afirma William J. Barber II, pastor da Igreja Cristã Greenleaf, em Goldsboro, e presidente do ramo estadual da Associação Nacional para o Avanço das Pessoas de Cor. “E elas ficam enfurecidas também por constatarem que quem está sendo atacado é um indivíduo muito profundo e profético”.

Mas vários fiéis estão longe de demonstrar tanta simpatia em relação a Wright, afirmando que ficaram desapontados com o pastor por este ter tornado público um desentendimento pessoal, sem se preocupar com o estrago que isso causaria na campanha de Obama (este sentimento é especialmente forte entre os eleitores mais jovens). Outros dizem que consideram Wright arrogante e não confiável, e há ainda aqueles que acreditam que ele está travando batalhas antigas.

“Ele precisa separar o político do espiritual”, opina Rita Harrison, 48, uma eleitora de Obama que é cabeleireira no Salão Allison’s, em Whiteville. “Por que arriscar a campanha desse homem devido a alguns comentários pessoais? É isso o que eles são. Comentários pessoais”.

Não obstante, muitos eleitores negros sustentam que a situação ocorreu devido ao fato de haver dois pesos e duas medidas, já que Obama é responsabilizado pelas idéias de Wright, enquanto as figuras políticas brancas nem sempre têm que arcar com as opiniões polêmicas dos seus apoiadores. Eles acrescentam que isso os motiva mais a apoiar Obama.

Embora o número de eleitores brancos que se inscrevem para votar na prévia da Carolina do Norte aumente constantemente, o índice de registro dos eleitores negros é mais acelerado. Estatísticas eleitorais do Estado revelam que dos quase 65 mil afro-americanos que se registraram neste ano, dois terços o fizeram após 15 de março, no período aproximado em que as declarações mais polêmicas de Wright passaram a ser divulgadas pela mídia.

É impossível afirmar quem esses eleitores recém-inscritos estão apoiando ou porque eles se registraram. Mas vários pastores dizem que a controvérsia tem estimulado a participação do eleitor, uma participação que as igrejas têm sido particularmente ativas em encorajar.

“Isto os mobiliza politicamente”, afirma Ricky A. Woods, pastor da Primeira Igreja Batista Ocidental, em Chalotte, uma instituição fundada 140 anos atrás. “Havia a sensação de que a igreja ainda era uma área de fé na qual algo como este padrão duplo de julgamento não se aplicava. Mas agora eles vêem o padrão duplo também na esfera religiosa, e é isto que está provocando tal mobilização”.

Embora as opiniões não representem necessariamente aquelas de pastores negros de outras regiões, muitos pastores daqui descrevem Wright, que pertence à liberal, e predominantemente branca, Igreja Unida de Cristo, como um amigo e um modelo exemplar. Ele é um convidado freqüente nos púlpitos da Carolina do Norte, e tem sido uma voz ativa no que se refere às questões sociais no Estado durante décadas. Pastores como Barber estão explicando a fiéis embaraçados qual é o lugar ocupado por Wright na tradição profética, um estilo de pregação que combina orientação espiritual com críticas muitas vezes contundentes, e que tem as suas raízes nos profetas do Velho Testamento.

Barber afirma que, enquanto a congregação aprende a respeito das raízes dos sermões de Wright, os fiéis têm expressado ira por acreditarem que as palavras de Wright foram destorcidas e utilizadas fora de contexto na campanha eleitoral.

“É como uma propaganda exibida no nosso Estado que mostra um fragmento do sermão de Wright”, diz Barber, referindo-se à propaganda do Partido Republicano estadual que vincula os candidatos ao governo do Estado pelo Partido Democrata a Obama e, como extensão, a Wright. “É uma forma de usar a questão racial para intimidar o eleitorado, e muitos eleitores já viram esse tipo de coisa antes”.

Mas nem todos estão prontos a correr em defesa de Wright. Alguns ainda estão ofendidos com a idéia, expressa por Wright, de que um ataque contra ele seria um ataque contra a própria igreja negra.

“Ele não fala por todos os negros, e muito menos por mim”, afirma Loreen Morman, 47, de Evergreen, uma eleitora da senadora Hillary Rodham Clinton, a rival democrata de Obama.

O mais comum, pelo menos a julgar pelos programas de rádio negros que colocam no ar os ouvintes que telefonam e pelas entrevistas em Lumberton e imediações, é a sensação de que Wright cometeu um sério erro de avaliação no início desta semana quando falou no Clube Nacional de Imprensa, em Washington, D.C., dias antes de Obama enfrentar disputadas eleições primárias contra Hillary Clinton na Carolina do Norte e em Indiana.

“Existe uma certa verdade nas coisas sobre as quais o reverendo Wright falou”, afirma Rodney Singletary, 40, pastor da congregação Caminhando pela Fé, na pequena cidade de Chadbourn. “E a Bíblia diz que a verdade nos libertará. Mas a Bíblia afirma também que há um momento para falar e um momento para calar”.

Muitos eleitores negros, incluindo alguns dos detratores de Wright, culpam a mídia por propagar essa história. Mas a percepção da cobertura como sensacionalismo ou como racismo pode depender da geração a que pertence a pessoa ouvida.

Frances M. Cummings, 67, uma ex-parlamentar estadual que foi a primeira professora negra da Escola de Segundo Grau Lumberton, afirma que os jovens não entendem as forças sociais que estão atuando contra eles. “Eles não sabem nada a respeito de coisas terríveis como deixar de ser servido em um restaurante ou não poder freqüentar a faculdade desejada”, observa Cummings.

Embora ache que o momento que Wright escolheu para se pronunciar foi ruim, Cummings frisa: “A mídia imprensou-o no canto oposto, e ele teve que sair deste canto se defendendo”.

Na Barbearia Clawson, um pequeno prédio azul na Rua Martin Luther King Jr., que tem cartazes de Obama colados nas janelas, os clientes mais velhos recordam-se da época em que tinham que aguardar por uma consulta do lado de fora da clínica médica e fazer provas de Constituição para votarem. Mas, de acordo com o proprietário, Sandell F. Clawson, 71, os comentários de Wright podem trazer à tona velhas questões polêmicas para uma campanha que estava tentando superar essas questões. Os fregueses fazem gestos de aprovação ao seu comentário.

“Os argumentos dele são bons”, afirma Clawson. “O único problema é que estão surgindo tardiamente”.

Fonte: The New York Times

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