O Ministério Público Federal entrou com uma ação para obrigar os órgãos públicos a retirarem símbolos religiosos (como crucifixos e imagens de santos) de suas dependências.

O objetivo é atender a exigência de separação entre religião e Estado, prevista no artigo 5 da Constituição.

A ação civil publica, que se aplica às repartições federais do Estado de São Paulo, foi impetrada pela Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão, em atendimento à reclamação de uma pessoa se sentiu ofendida pela exibição de simbolos religiosos nesses estabelecimentos.

Em caso de descumprimento, será aplicada uma multa simbólica diária no valor de R$ 1 à autoridade responsável.

Em entrevista a Terra Magazine, o procurador Jefferson Aparecido Dias, autor da ação, comenta a proibição. Ele teme que, por “força da tradição”, haja resistência à retirada dos símbolos religiosos. A Constituição de 1988 prevê, desde sua criação, a laicidade do Estado.

– Agora o país está preparado para esse tipo de discussão.

Leia a entrevista:

Por que o Ministério Público Federal tomou essa medida?

O procedimento foi instaurado a partir da reclamação de um cidadão. Nós investigamos as informações e, a partir daí, nós decidimos que seria necessário instaurar uma ação civil pública.

E por que foi instiuída a multa no valor de R$ 1?

Porque um valor elevado penaliza duas vezes o cidadão. No fim das contas, como se trata de órgãos públicos, é o cidadão que acaba pagando a multa. E por isso, como é necessária uma sanção, foi uma sanção simbólica só para não honerar ainda mais o cidadão.

Caso a medida não seja cumprida, esse valor pode subir?

A lei não impede, pelo contrário: se a gente faz uma liminar e ela é descumprida, a gente pode ajuizar outra ação civil pública, e aí podem haver obrigações mais duras em relação às autoridades que estão descumprindo a lei. A lei autoriza a fazer isso. A preocupação é não onerar economicamente o cidadão, adotando as medidas necessárias.

Como avalia a retirada desses símbolos, do ponto de vista da laicidade do Estado?

É importante. Nós precisamos voltar a discutir os símbolos religiosos, acho que estamos num momento oportuno, até. Recentemente, quando o Brasil venceu a Copa das Confederações (NR: no torneio, vários jogadores comemoraram com camisetas e referências religiosas), a Fifa até adotou uma postura mais rigída em relação a isso. Então eu acho que é o momento para aproveitar e discutir, já que o futebol tem tanta ligação com o Brasil e o futebol gera debates acalorados, então vamos discutir isso no âmbito interno e (do ponto de vista) da relação com o Estado.

A Constituição prevê isso há mais de 20 anos e só agora parece estar se discutindo esse ponto. No início do ano, um tribunal do RJ ordenou o mesmo…

Na verdade, muitos dos dispositivos que a Constituição têm demandaram um tempo de maturação, digamos assim. Uma certa maturidade para ser discutida. E eu acho que esse é um deles. Acho que agora o país está preparado para esse tipo de discussão.

Há uma certa resistência em retirar esse símbolos, talvez por “tradição”?

Eu temo que, por força da tradição, ocorra alguma resistência, porque existe um vínculo muito forte com as tradições. Mas eu acho que a ordem jurídica tem de estar de plantão.

Espera alguma reação de setores religiosos, especialmente da Igreja Católica?

No caso específico da Igreja Católica eu espero que não, porque a própria Igreja tem alguns matizes que tendem ao Estado laico. Não vejo, não. Espero não ter que enfrentar nenhum tipo de resistência.

Várias autoridades do país, do presidente a governadores, citam Deus em seus discursos e falas públicos. Isso contribui para consolidação do Estado laico no Brasil?

É… é duro também, mas não vamos entrar no âmbito de cada pessoa. Cada pessoa tem sua liberdade. A dificuldade é saber até onde a pessoa fala por si ou como autoridade. Eu acho que é essa a cautela que os cargos públicos precisam ter. Eu e meus colegas, que somos procuradores da República, também professamos nossa fé, mas o grande desafio é esse: professar sua fé na intimidade, mas não transferir isso para o Estado.

Fonte: Terra Magazine

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