Ainda neste semestre entram na pauta do Supremo Tribunal Federal (STF): a validade das cotas raciais nas universidades, a interrupção da gravidez de anencéfalos e o reconhecimento das uniões homossexuais.

Passada a polêmica votação sobre a Lei Ficha Limpa, o Supremo Tribunal Federal (STF) tem agora outros temas controversos pela frente. Ainda neste semestre entram na pauta de discussões dos 11 ministros: a validade das cotas raciais nas universidades, a interrupção da gravidez de anencéfalos (fetos sem cérebros), a demarcação de terras quilombolas e o reconhecimento das uniões homossexuais. Cerca de 800 processos já estão prontos para ir a julgamento, mas, segundo o presidente do órgão, ministro Cezar Peluso, a relevância social desses temas fez com que eles entrassem primeiro na pauta e devem ser votados até junho.

Alguns dos temas se arrastam há vários anos à espera de uma decsão a permissão para que mulheres grávidas de fetos sem o cérebro pudessem interromper a gravidez. Em julho de 2004, o ministro Marco Aurélio Mello autorizou, por meio de liminar, que uma mulher interrompesse a gravidez, porém no mesmo ano a liminar foi derrubada em um julgamento de plenário. Com a mudança na composição da Corte – cinco ministros deixaram o STF de 2004 até hoje –, a interpretação também pode ser alterada.

A Confederação Nacional dos Trabalhadores da Saúde (CNTS) alega que a obrigação da mãe de carregar no ventre um feto que não sobreviverá depois do parto pode representar um perigo para a saúde da gestante e ofende sua dignidade. Os contrários ao direito de interromper a gravidez apontam a ilegalidade do aborto, considerado um crime contra a vida, e a Igreja Católica defende a impossibilidade de definir o momento do início da vida.

A definição sobre as cotas raciais para as universidades tramita no tribunal desde 2009, quando o partido Democratas (DEM) entrou com ação questionando a constitucionalidade da instituição de cotas na Universidade de Brasília (Unb). Com a justificativa de superar as desigualdades socioeconômicas, o sistema foi adotado pela primeira vez na Universidade do Estado do Rio de Janeiro, em 2003. Depois que foi aprovada uma lei em 2001 que previa 50% das vagas para alunos de escola pública, a Assembleia do Rio criou uma nova reserva de 40% para negros e pardos ingressarem na instituição. Hoje, 18 universidades já adotam o polêmico sistema, que divide especialistas.

“Sempre me posicionei contrário às políticas de cotas raciais. No Brasil políticas de afirmação como esta serão sempre complicadas de serem adotadas, já que os critérios podem ser questionados. Quem é negro no país? E aquelas pessoas brancas de baixa renda?”, argumenta o professor de sociologia da Faculdade de Educação da UFMG Antônio Machado Carvalho. Ele aponta também que a adoção das cotas vai contra a Constituição, que prevê a igualdade em todas as situações. “Como existe esse preceito que todos são iguais, não devem existir exceções. As mudanças que deveriam acontecer se relacionam com os investimentos na base, na educação primária, para que todos fiquem em condições iguais no aprendizado”, afirma.

Favorável às políticas de cota, o coordenador do Núcleo Afro-Brasileiro, o professor da Unb Nelson Inocêncio apresenta outros argumentos para defender o sistema. “Não concordo com questão de não identificar os negros no Brasil como um entrave para que as cotas sejam adotadas. Nas ruas, no supermercado e nos bancos, em situações de preconceito e discriminação, todos identificam muito bem os negros”, diz. Para Nelson a importância de abrir novas portas e dar oportunidades para as minorias deve sempre ser valorizada e pode ser um passo decisivo na redução das desigualdades sociais. “O ponto de partida para discutirmos esse tema deve começar lá atrás, no início da nossa história. Só assim vamos entender por que hoje, em cada três jovens mortos em função da violência, dois são negros. Só assim vamos perceber que ainda existe uma parte da sociedade vulnerável e que deve ser integrada”, explica.

[b]Quilombolas[/b]

O tema parece referir ao passado escravista brasileiro, porém o espaço usado por sociedades remanescentes dos quilombos ainda é motivo de muita discussão e está à espera de uma decisão do Supremo. O ministro Cezar Peluso entrou com um relatório questionando um decreto de 2003 que regulamentava o processo de titulação e aquisição das terras. A proposta pode colocar em risco o direito à propriedade de mais de 2 mil comunidades quilombolas.

Representantes da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Quilombolas (Conaq) estão desde o ano passado se organizando para entrar em acordo com o relator do processo no tribunal e prometem grande mobilização quando o tema entrar em pauta. “Estamos apenas lutando pelos nossos direitos estabelecidos na Constituição e precisamos de apoio de parlamentares e ministros para que as mudanças não prejudiquem tanta gente que já vive em condições difíceis. Queremos permanecer onde estamos e viver com dignidade. A queda do decreto, se infelizmente acontecer, vai representar um grande retrocesso. Não estamos pedindo favor, queremos manter o que é nosso de direito”, afirma Sandra Maria da Silva, representante da Conaq.

[b]União homossexual e o caso Batistti
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Crenças religiosas e a necessidade de novas regras para a sociedade contemporânea são os dois principais argumentos para a união de pessoas do mesmo sexo ser considerada entidade familiar. Em março de 2008 , o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, entrou com pedido para que a Justiça aplique o regime jurídico para uniões estáveis, defendendo o direito de previdência e assistência para os casais. Um ano depois, a então procuradora-geral da República, Deborah Duprat, ajuizou uma ação levando a questão para o STF, com apoio do Grupo de Trabalho de Direitos Sexuais e Reprodutivos da Procuradoria e de professores titulares de direito civil da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).

Na ação, a procuradora sustenta que o casamento de homossexuais “é, hoje, uma realidade fática inegável, no mundo e no Brasil, e vários países já reconhecem essas relações”. O processo tem como relator o ministro Ayres Britto, que já concluiu o relatório no mês passado e o enviou à presidência do tribunal. A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e outras 16 entidades se manifestaram contrárias ao pedido de reconhecimento das uniões homossexuais, argumentando em petição enviada ao STF que “a Constituição Federal define como família a união conjugal entre mulher e homem”.

[b]Pendência[/b]

No entanto o Supremo não definirá ainda no primeiro semestre o futuro do ex-ativista Cesare Battisti. Os ministros se posicionaram, em novembro de 2009, favoráveis a extradição do réu para a Itália, durante o julgamento que durou três dias e teve o placar de cinco votos a quatro em favor da extradição. Porém, a última palavra sobre a entrega ou não de Battisti foi repassada ao presidente da República. No final do ano passado Lula se opôs à primeira decisão do STF e votou contrário à extradição.

Agora o tema volta para o maior órgão do Judiciário brasileiro, que aguarda a liberação do relator do processo, ministro Gilmar Mendes, e não tem previsão para entrar na pauta. O italiano permanece preso em Brasília até que os juízes tomem uma decisão sobre o caso.

[b]Fonte: Diário de Pernambuco[/b]

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