Entrevista com Rick Warren, sobre ministério, projetos, política e ação social. Para Warren, reorganizar o trabalho internacional da Saddleback e intermediar um fórum entre os candidatos à presidência dos Estados Unidos servem a um propósito comum.

Entrevista com Rick Warren, por Timothy C. Morgan

O Fórum Civil da Igreja de Saddleback, que reuniu 2 mil pessoas ao vivo e parou o país na frente da TV na noite do dia 16 de agosto. O evento, o primeiro ato da atual campanha presidencial a reunir os dois candidatos, demonstrou o prestígio de seu promotor, o pastor Rick Warren, apontado como um dos homens mais influentes da América. Sua igreja, com 25 mil membros, é referência obrigatória no atual cenário

evangélico americano e seus livros, como Uma igreja com propósitos e Uma vida com propósitos, viraram best-sellers mundiais.

Rick Warren está envolvido em um grandioso projeto. Desde 2005, o líder da Igreja Saddleback tem empreendido uma estratégia global para missões – o chamado Plano da Paz, recentemente rebatizado de Paz 2.0. Ele propõe uma ampla coalizão global, unindo governos, empresas e igrejas numa parceria com foco na reconciliação e no progresso humano. Utopia? Pode ser. Mas Warren diz que a Igreja tem todas as ferramentas necessárias para a boa obra. Nesta entrevista, ele fala sobre Paz 2.0 e também sobre os resultados do debate com os presidenciáveis:

A imprensa em geral usa os padrões Billy Graham para medir seu ministério. Isso não se torna irritante após algum tempo?

Estou cansado disso. Já disse muitas vezes que não existe sucessor para Billy Graham. Quem foi o sucessor de Lutero? E de Wesley? Deus usa pessoas individualmente, de maneira única. Se alguém tem que ser sucessor de Billy Graham, tem que ser seu filho Franklin que continuou o evangelismo. A imprensa age de duas maneiras: ou constrói sua trajetória ou a derruba. Está sempre a procura do próximo “prodígio” para construí-lo.

O Fórum Civil de Saddleback supriu suas expectativas?

Sim, foi além das expectativas. Os elogios da elite da imprensa foram impressionantes. O maior objetivo foi pensar e amar além do que tem feito os não-cristãos. Eu também queria falar sobre questões que têm efeito de longo prazo. Daqui a 100 anos, o custo do combustível não será uma questão relevante. Mas a forma de liderar de um presidente continuará sendo uma questão.

Antes do debate, dois grupos me criticaram muito. De um lado, os seculares de Esquerda que temiam que eu estabelecesse uma avaliação religiosa para o presidente, algo que sou absolutamente contra. Por outro lado, os membros da Direita religiosa que temiam que eu cedesse aos temas como aborto, casamento homossexual e pesquisas com células-tronco.

O Fórum Civil se encaixa no “Plano de Paz”?

Encaixa-se à medida que se constrói pontes com o governo. Tenho três objetivos na vida. Um deles é restaurar a responsabilidade dos indivíduos. Tudo é um presente de Deus, assim como o que fazemos com isso. Somos responsáveis por aquilo que Deus nos deu –, chama-se administração. O segundo objetivo é restaurar a credibilidade da Igreja. Uma coisa que quis dizer no fórum foi: a Igreja está em foco, a Igreja é inteligente e acredita no bem comum, não apenas nas Boas-Novas. Isso me leva ao terceiro objetivo, que é restaurar a civilidade para a civilização. Fui influenciado por William Wilberforce na restauração das maneiras. Você pode aprender mais com os candidatos por meio de uma discussão civil do que por meio de um debate antagônico. Tenho uma carta a ser enviada para pastores de nossa rede dizendo: “Vejam, fiz este fórum em nível nacional, mas vocês poderiam fazê-lo em nível comunitário.”

De onde surgiu a ênfase do “Plano de Paz” para a parceria com governo, empresas e Igreja?

Quando estive pela primeira vez no Fórum Econômico Mundial, em Davos, ouvi pessoas falando a respeito da parceria público-privada. O que queriam dizer era que o governo e as empresas precisavam se unir para lutar contra a pobreza, as doenças e o analfabetismo. Eu dizia: “Tudo bem, mas espere um minuto. Vocês estão próximos, mas falta algo. Vocês estão esquecendo a terceira parte da base: a Igreja. Vocês esqueceram o componente que tem maior distribuição, o maior número de voluntários, quem já tem os pés no chão e que já possui a motivação de fazer isso de graça.

Em “Paz 2.0”, a frase “plantar igrejas” foi substituída por “promover a reconciliação”. Qual a razão dessa mudança?

Há dois anos, fizemos uma viagem de 74 mil quilômetros em 45 dias. Literalmente viajamos ao redor do mundo. O que vi em cada país fooram conflito e relacionamentos quebrados. Nas Filipinas, vi conflitos entre as duas maiores redes evangélicas. Em Seul, entre carismáticos e presbiterianos. No Oriente Médio, entre árabes e judeus. Em Ruanda, entre hútus e tútsis. Em todos os lugares que visitei, encontrei relacionamentos quebrados. Todos os lugares que visitei sofriam com relações quebradas. Em todos os lugares encontrei mediadores de conflito, moderadores, pessoas encarregadas de promover a paz. A paz com Deus e uns com os outros.

Então pensei no “Plano de Paz”, e “plantação de igrejas” era o único ponto que continha um método prescrito. Ainda fazemos plantação de igrejas, mas colocamos esta questão no item “parcerias com igrejas locais”.

Não esperamos que o governo e as empresas, as outras partes desta tríade, façam plantação de igrejas. Mas existem princípios bíblicos sobre reconciliação que se aplicam a todos. Se você ouvir antes de falar, seus relacionamentos serão melhores, acredite ou não.

Qual o novo papel dos profissionais em “Paz 2.0”?

O papel dos profissionais é treinar os amadores. Quando um dentista diz: “Eu quero ir para a América Latina extrair dentes”, isso é ótimo. é um complemento. Eu gostaria que ele fosse à América Latina e treinasse pessoas em “como extrair dentes”. Não apenas o complemento, e sim a multiplicação. Na Grande Comissão Jesus diz: “ensinando-os a obedecer a tudo o que eu lhes ordenei” (Mateus 28.20). Ele não diz: “Faça por eles.” Ele diz: “Ensinando-os.” Existem três palavras-chave em “Paz 2.0”: escalável, sustentável e reproduzível. Nunca podemos sacrificar estas três coisas por velocidade e rapidez. A maneira mais rápida de fazer tudo isso é fazer você mesmo.

A carreira de “missionário” está obsoleta?

Precisamos de muito mais missionários do que temos agora. E precisamos de muito mais. Precisamos de um movimento amador baseado no amor. Precisamos lembrar que nos primeiros 300 anos da igreja, a maioria era formada de amadores. Paulo e Barnabé foram enviados por uma igreja. Havia uma igreja local enviando pessoas ao redor do mundo. Minha oração é que possamos trabalhar unindo nossas mãos. A experiência dos missionários pode ser utilizada e multiplicada.

Existe mais de um bilhão de católicos e ortodoxos. Onde eles se encaixam?

Precisamos mobilizar um bilhão de cristãos católicos e ortodoxos. Não estou interessado em diálogos ecumênicos. Estou interessado em projetos entre as igrejas. Vamos fazer algo juntos. Você provavelmente não irá mudar as suas doutrinas e eu provavelmente não mudarei as minhas doutrinas. Temos crenças diferentes. Mas o fato é que servimos ao mesmo Deus. Vamos trabalhar então baseados nas coisas com as quais concordamos.

Em maio, na Conferência de PAZ, em Saddleback, você falou sobre o que você chama de modelo “novos odres” para líderes cristãos. O que quis dizer com isso?

A essência do conceito de “novos odres” é que a hierarquia será substituída por uma rede. A organização do futuro para o cristianismo é a formação de redes. PAZ é uma estrutura e uma rede para missões globais. Não é minha estrutura. O que estou dizendo é: vamos fazer do jeito que Jesus fez. A lição de Jesus foi: eu faço e você assiste. Segunda fase: você faz e eu assisto. Terceira fase: eu não estou aqui e você está fazendo sozinho. Todas as vezes em que a Palavra de Deus foi inserida em uma nova tecnologia, existe o renascimento, a reformulação, a renovação. Agora temos a internet. Posso falar com alguém no Sri Lanka tão facilmente quanto falo com você. PAZ é também uma rede na qual as igrejas podem trabalhar juntas em vez de ficarem ilhadas em suas denominações. Permite colaboração em missões globais de uma forma que não era possível antes.

Teólogos, professores e críticos do “Plano da Paz” dizem que o plano tem as mesmas limitações de projetos missionários de curto prazo, ou seja, não trazem melhorias significativas para a vida das pessoas com necessidades ou não geram as transformações necessárias na vida dos voluntários envolvidos no ministério.

Esperamos críticas. Sempre que começamos uma nova maneira de caminhar, a organização existente se opõe. Falamos a respeito de seis renovações: pessoal, relacional, cultural, estrutural, missionária e institucional. Instituições nunca são fonte de inovação. O propósito da instituição é preservar a inovação da geração anterior. Não há nada de errado com isso. O propósito da instituição é preservar a continuidade e não criar novas propostas. Veja uma árvore: todo o crescimento acontece nos novos galhos. Os seminários e instituições seriam os troncos. Mas os novos frutos só aparecerão nos novos galhos.

Você está falando sobre mais sinergia e tensão criativa entre os inovadores e as instituições?

Exatamente! é sobre isso que estou falando. O papel das instituições é promover a estabilidade, continuidade e memória histórica. O cristianismo tem raízes. O “Plano da Paz” não é algo realmente novo. é voltar ao primeiro século. Em vez de passar tempo atacando o PAZ ou dizer, “Isso não vai funcionar”, que tal contribuir com seus conhecimentos? Ou dizer: “Aqui está uma lição histórica que você deve recordar, inclusive alguns erros cometidos em iniciativas anteriores.”

O papel das Organizações Não-Governamentais (ONGs) tem sido vital. é uma gota no oceano, comparado ao que poderíamos estar fazendo se mobilizássemos toda a Igreja. As missões para-eclesiásticas precisam apoiar a Igreja. Infelizmente, por anos e anos, o contrário tem sido verdadeiro. A Igreja apóia as ONGs, levanta os recursos, envia os membros, providencia potencial criativo. E a ONG recebe o crédito.
Moral da história: quem recebe o crédito? Quem sai fortalecido? Quem é o herói? Não é a Igreja Saddleback, não é o “Plano da Paz”. Queremos que as igrejas locais nas pequenas vilas se tornem as heroínas. Quanto mais honro a Igreja, mais Deus me abençoa.

Tradução de Karen Bomilcar

Fonte: Cristianismo Hoje

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