A visita do papa Bento 16 ao Brasil, na semana passada, provocou reações mistas em outras religiões representadas no país, de acordo com opiniões de representantes de igrejas ouvidos pela BBC Brasil.
“Ele trouxe um despertar para que as pessoas se voltem mais para as doutrinas, para os dogmas. O católico brasileiro não é muito dogmático”, afirmou o pastor Lelis Washington Marinhos, da Assembléia de Deus.
Para Marinhos, o pontífice veio ao Brasil para tentar reverter “o quadro descendente da Igreja Católica” que em geral beneficia justamente igrejas evangélicas como a Assembléia de Deus.
“Acho difícil (que ele alcance isso). O quadro é irreversível porque a mudança parte em direção a verdades bíblicas.”
Procurada pela BBC Brasil, a Igreja Universal limitou-se a dizer, em nota, que “respeita todas as pessoas, mas prefere não se pronunciar acerca desse assunto”.
‘Diálogo’
Já anglicanos e judeus – grupos que participaram do encontro em que o papa reuniu dez líderes religiosos – elogiaram os seus esforços para se reunir com representantes de outras religiões.
“Eu acho que (a visita) foi muito positiva em termos de relacionamentos entre católicos e judeus, ele reforçou muito a posição de diálogo católico-judaico”, disse o presidente da Confederação Israelita do Brasil, Jack Terpins.
O bispo Hiroshi Ito, da Arquidiocese Anglicana de São Paulo, também destacou a atitude de Bento 16 de sempre ter deixado “a porta aberta” aos anglicanos e lembrou que o papa é “o bispo símbolo da unidade da Igreja Cristã”, apesar das divergências entre as duas igrejas.
“Já sabemos a posição do atual papa. Há uma parte com a qual nos concordamos.”
As principais discordâncias são, segundo Ito, a condenação do uso de preservativos e do segundo casamento.
Embora diga ser contra o aborto, o religioso também acredita que a questão da legalização da prática é mais complexa do que o papa deu a entender.
“Temos de levar em conta quantas moças perderam suas vidas (ao fazerem abortos clandestinos), como o próprio presidente Lula fala”, afirmou Hiroshi.
Por outro lado, Ito teme que a admissão do aborto possa comprometer a autoridade moral da Igreja para criticar outras formas de violência.
“Achamos que se admitirmos a eliminação de uma vida, nós perdermos base para criticar outras formas de violência”, disse Ito.
Já a Assembléia de Deus concorda com o papa na sua condenação absoluta do aborto e do sexo antes do casamento.
Quanto ao uso de preservativos, o pastor Marinhos diz que só admite no contexto do casamento para planejamento familiar, mas não “para a promiscuidade”, como seria usado hoje.
Ele também apoiou o papa na sua declaração de que a evangelização da América Latina não foi um processo imposto aos povos que viviam na região, um dos pontos que causaram mais polêmica durante a sua visita.
“A gente sabe que algumas questões que são defendidas como culturais são, na verdade, questões espirituais. Não houve imposição. Quando se prega o evangelho, se prega mudança transformação. Aqueles costumes em desacordo com a palavra nós também combatemos”.
Apesar desse pontos de acordo, o evangélico diz que a aproximação com a Igreja Católica não é possível sem que haja “mudanças fundamentais”.
“Nós não buscamos esse diálogo com a Igreja Católica. São princípios bíblicos completamente diferentes.”
“Por exemplo, ele veio canonizar uma pessoa, que é um princípio completamente contrário ao nosso. Nada a ver.”
Fonte: BBC Brasil