Os atentados fizeram com que a religião voltasse à vida pública em muitos países ocidentais onde a fé havia sido relegada principalmente à esfera privada.

Quando Henry Kissinger publicou “Diplomacia”, seu estudo sobre relações internacionais, em 1994, ele não tinha nenhuma entrada no índice remissivo para os temas “Islã” ou “religião”.

Dez anos depois, Madeleine Albright, que assim como Kissinger comandou o Departamento de Estado dos EUA, escreveu o seu próprio estudo sobre os temas mundiais: “Os Poderosos e o Todo-Poderoso: Reflexões sobre a América, Deus e o Mundo.” Quase metade do livro tratava dos muçulmanos e do Islã.

A comparação entre os dois livros mostra como o mundo mudou desde que 19 militantes muçulmanos lançaram quatro aviões sequestrados contra o World Trade Center, o Pentágono e um descampado da Pensilvânia, em 11 de setembro de 2001.

Os atentados fizeram com que a religião voltasse à vida pública em muitos países ocidentais onde a fé havia sido relegada principalmente à esfera privada.

“O 11 de Setembro mostrou que a religião não pode mais ser ignorada”, disse Scott Appleby, historiador da Universidade de Notre Dama, em Indiana, em um seminário sobre “A religião depois do 11 de Setembro”, na Universidade de Cambridge.

“Isso é um elemento crítico em muitos sistemas nacionais e em movimentos radicais e extremistas, mas também em movimentos voltados para os direitos humanos, construção da paz e sociedade civil”, disse ele.

Nos últimos dez anos, governos e pesquisadores na América do Norte e Europa têm recorrido à sociologia, à psicologia, à antropologia e a outras disciplinas para tentar entender e prevenir a violência com motivação religiosa.

Os resultados são contraditórios. O papel exato da religião no radicalismo é incerto. A psicologia e as dinâmicas coletivas podem motivar os extremistas mais do que a fé. A “Primavera Árabe” pode se tornar um contraponto democrático à ideologia jihadista da Al Qaeda.

[b]”MIOPIA SECULAR”
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Durante décadas até o 11 de Setembro, políticos e analistas ocidentais exibiram aquilo que Appleby chamou de “miopia secular”, ignorando o papel da religião na política. Como a fé deveria ser algo privado, a maioria ignorava-a em suas análises.

Isso ocorreu a despeito do surgimento de movimentos religiosos ultraconservadores ligados a várias religiões durante esses anos, muitas vezes com reflexos na sua ação política.

O Irã, por exemplo, realizou uma revolução islâmica, e os afegãos travaram uma “guerra santa” contra a União Soviética. Judeus se estabeleceram em territórios palestinos, a direita cristã dos EUA emergiu, e os hindus da Índia e os budistas do Sri Lanka adotaram políticas nacionalistas.

Quando a Al Qaeda cometeu o 11 de Setembro, “a reação inicial foi de que essas pessoas devem ser realmente fanáticos religiosos que passaram por uma lavagem cerebral”, disse Scott Atran, antropólogo norte-americano que estuda conflitos religiosos no Centro Nacional de Pesquisas Científicas da França.

Embora o então presidente George W. Bush tenha declarado na época que o Islã é uma religião pacífica, as guerras subsequentes ao 11 de Setembro, no Afeganistão e no Iraque, e as medidas extraordinárias para a segurança interna fizeram com que, aos olhos de muitos muçulmanos, a “guerra ao terror” fosse encarada como uma “guerra ao Islã”.

No entanto, ao longo da última década, cientistas sociais passaram a mudar o foco do “islâmico” para o “radical”. A fé pode levar ao extremismo, concluíram eles, mas os jovens envolvidos precisavam antes de mais nada estarem dispostos a uma radicalização.

“O propósito é grandioso, é uma luta do bem contra o mal, sendo que você está ao lado do bem”, disse Russell Razzaque, psiquiatra britânico de origem bengalesa, que foi abordado sem sucesso por recrutadores islâmicos na sua faculdade de medicina em Londres, em 1989.

“Esses são jovens nesse estágio da vida que eles estão buscando ter um significado, amigos, glória e aventura”, disse Atran. “As ideologias radicais falam a essas necessidades.”

[b]Fonte: Reuters[/b]

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