Cerca de um terço das mulheres no Egito é vítima de assédio sexual diariamente, indicam os resultados preliminares de uma pesquisa realizada pelo Centro Egípcio pelos Direitos da Mulher.
O estudo entrevistou 1.082 mulheres egípcias ou estrangeiras que vivem no país e concluiu que o tipo mais comum de assédio relatado é o contato físico impróprio (sofrido por 40% das entrevistadas), seguido de assédio verbal (38%).
“Ficamos surpresas quando descobrimos a freqüência com que o contato físico ocorre. Esperávamos que a forma mais comum de assédio fosse verbal, mas a incidência de exposição indecente e contato físico em formas mais extremas é ainda maior”, diz a responsável por relações internacionais do centro, Rebecca Chiao.
Outra descoberta que contrariou as expectativas dos responsáveis pela pesquisa foi o fato de qualquer mulher ser alvo de assédio dos homens egípcios e não apenas aquelas que não se cobrem com véu ou nikab (burca).
“Muitas pessoas imaginam que as maiores vítimas de assédio são mulheres que vestem roupas mais sugestivas e não aquelas com véu ou nikab, mas o fato é que algumas mulheres que usam nikab foram assediadas a tal ponto que queriam registrar queixa na polícia e participar de protestos organizados por nós contra assédio sexual”, conta Chiao.
Palavras indecentes
De acordo com o levantamento da entidade, nenhuma mulher está livre do assédio dos homens egípcios, “sem limitações de classe social ou idade”.
As características dos homens que praticam os atos ainda estão sendo levantadas, mas entrevistas preliminares indicam que eles também não estão limitados a certa classe social ou faixa etária.
“O que verificamos até agora é que acontece em qualquer lugar, seja no campus da universidade, na rua ou no transporte público, e é praticado (o assédio) por qualquer um, desde pedestres na rua até homens dirigindo carros importados”, explica Chiao.
A pesquisa mostra que 38,9% dos casos de assédio ocorrem na rua, 37,8% em locais públicos em geral e 12,8% no transporte público.
Uma das vítimas, Rania (que não quis ter seu sobrenome divulgado), estudante da Universidade Americana no Cairo, conta como foi sua pior experiência: “Quando estava andando para a casa, senti alguém perto de mim, tentando se esfregar em mim. Senti meu coração parar e comecei a andar muito rapidamente. O homem não parou e continuou me seguindo. Parei na rua e pedi para alguém me ajudar. Fiquei horrorizada quando o homem para o qual pedi ajuda mandou eu entrar em seu carro e disse palavras indecentes para mim.”
Segundo os pesquisadores, nem a polícia costuma ajudar as vítimas de assédio. “As poucas mulheres que resolvem registrar queixa na polícia contra seu agressor na maioria das vezes ou não são levadas a sério, ou o policial evita abrir uma ocorrência para não prejudicar o agressor junto à família dele”, diz o relatório.
O documento conclui que o assédio sexual passou a ocorrer com mais freqüência com o desenvolvimento e o processo de democratização do país, que permitiram que as mulheres participassem mais ativamente da vida pública e, com isso, saíssem mais de casa.
“Verificamos que as razões que levam a sociedade a aceitar, ou pelo menos a perdoar o assédio sexual vão desde punição pela violação da mulher de seu papel tradicional em casa até a resistência da mulher em continuar em trabalhos com altos índices de desemprego, além da simples falta de compreensão por parte dos homens do impacto dramático e traumático de suas ações nas mulheres”, afirma o relatório.
Outra conclusão é de que o assédio é conseqüência das frustrações e pressões sofridas pela sociedade egípcia, segundo Chiao.
“Por exemplo, dizem que porque a economia anda mal os homens não podem mais se casar tão cedo e tradicionalmente o sexo ocorre apenas após o casamento.”
A forma como o Islã é adotado no Egito e em outros países árabes também tem uma grande parcela de culpa, segundo ela, pois leva a “muita repressão sexual e discussões sobre o assunto não são comuns”.
Fonte: BBC Brasil